Por Robério Dias Leite (*)
Em fevereiro de 2018, teve início,
a atual epidemia de sarampo no Brasil, algo sem precedentes nos últimos 20
anos, com mais de 12 mil casos e 15 mortes. Como isso está acontecendo num país
que montou um dos programas de imunizações mais bem-sucedidos em todo o mundo?
A resposta não está fora dos nossos muros. A verdade é que não estamos fazendo
o "dever de casa", e a cobertura vacinal se encontra muito aquém do
necessário para impedir o risco do ressurgimento de doenças outrora
controladas.
Paradoxalmente, estamos andando
para trás num contexto em que os desafios se multiplicaram para o controle do
sarampo, uma metáfora do que está ocorrendo com nosso processo civilizatório. A
globalização e os avanços tecnológicos possibilitaram o deslocamento de
pessoas, facilitando a transmissão das doenças contagiosas. É preciso estar
permanentemente preparado. Não é aceitável que a vacina não esteja disponível
no posto de saúde; que o sistema de saúde continue funcionando em horários
inadequados; que não tenhamos incorporado tecnologias digitais que facilitem o
conhecimento real das coberturas vacinais; e que sejamos bombardeados de
maneira crescente por fake news criminosas sobre vacinas, as quais
podem deixar nossas crianças desprotegidas, levando-as ao sofrimento por
doenças e até a morte, quando os pais decidem não vacinar os filhos por medo
infundado. Entre 2013-2015 enfrentamos um grande surto de sarampo no Ceará e, à
custa de muito esforço, recuperamos as coberturas vacinais e conseguimos
controlar a situação. Foi um alerta para o restante do País que, infelizmente,
não foi escutado. Que o exemplo de Rodolfo Teófilo, nosso herói solitário no
combate à varíola, seja inspiração para todos os cearenses e que uma boa
cobertura vacinal não permita que a inevitável importação de casos de sarampo
não se transforme num novo surto. Que nem mais uma criança cearense perca a
visão por causa do sarampo, como ocorreu com nosso inesquecível Patativa do
Assaré na sua infância.
(*) Médico. Infectologista pediátrico do Hospital São José de
Doenças Infecciosas e professor da Faculdade de Medicina da UFC.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 11/09/2019. Opinião. p.20.
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