terça-feira, 14 de março de 2023

ACQUÁRIO CEARÁ: um bom motivo pra sonhar e não para chorar

Por Paulo Linhares (*)

“Ter um sonho todo azul. Azul da cor do Mar” (Tim Maia)

Essa semana o debate sobre o Aquário da Praia de Iracema voltou a ser pauta com a declaração do Governador Elmano de que vai ser construída uma parceria público/privada para execução da obra.

O aquário foi idealizado em 2008 pelo então governador Cid Gomes (PDT) para incrementar o turismo e atrair um milhão de visitantes.

A obra foi iniciada em 2012 para durar dois anos, os trabalhos se interromperam definitivamente em 2015, no início da gestão de Camilo Santana (PT). A obra já custou aos cofres estaduais R$130 milhões, com 75% da estrutura de concreto concluída, mas apenas 25% do previsto em equipamentos e acabamento.

É hora de discutir o chamado Acquário Ceará com o mínimo de racionalidade.

Antes de mais nada, é preciso dizer que quando pensamos no Centro Cultural Dragão do Mar, Ciro Gomes (governador) eu como secretário de Cultura e idealizador do projeto e o arquiteto Fausto Nilo, que ganhou a concorrência da criação arquitetônica e urbanística, previmos um aquário exatamente no mesmo lugar.

Mas antes de fazer qualquer coisa, começamos um estudo do que havia de melhor no mundo e quais os resultados e custos.

Depois de um benchmarking minucioso, resolvemos visitar in loco algumas experiências no exterior, já que no Brasil nenhum projeto mais ambicioso existia (o AquaRio, o maior do Brasil, é um projeto recente).

Visitamos o Oceanário de Lisboa, inaugurado em 1999, que já estava em obras, o Aquário de La Rochelle, na França, e eu conhecia e havia estudado o Musée Océanographique, de Mônaco.

Os três projetos me pareciam com tipologias específicas de três caminhos possíveis a seguir:

1.Um aquário pequeno com as características específicas do mar tropical que temos aqui, com seus peixes e sua fauna e flora marinha. Caso do aquário de La Rochelle.

2.Um aquário de grande porte com toda a variedade de mares e animais marinhos apresentando toda a variedade existente no oceano. Caso do Oceanário de Lisboa e do Aquário de Valença.

3.Um museu oceanográfico com a memória do que temos aqui na nossa relação com o mar e um pequeno aquário com capacidade de mostrar o nosso litoral. Caso do Museu do Mar de Monaco.

Lembro que estávamos eu, Fausto e Arialdo Pinho voltando dessa viagem de estudos quando o piloto anunciou antes de desembarcar: é bom que os cearenses saibam que o governador Ciro Gomes aceitou agora o convite do presidente Itamar Franco para assumir o Ministério da Fazenda, tendo anunciado sua renúncia do cargo que ocupava.

Ou seja: the dream is over.

A obra do Centro seria suspensa e só recomeçaria três anos depois, sob o comando do governador eleito Tasso Jereissati, depois de detalhados estudos, com um ponto claro: o aquário seria apenas um projeto futuro.

É bom que se diga: Tasso tinha razão. Embora o Centro Dragão do Mar tenha custado em valores atuais cerca de 20 milhões de reais (moeda que ainda não existia, diga-se de passagem), uma merreca em comparação ao que se gastou depois no Centro de Convenções, Castelão e CF, seria prudente ir com calma.

Em 2008, Cid recebeu uma proposta de fazer um aquário em Fortaleza do então Diretor Geral do Dnocs Eudoro Santana. Eudoro sugeriu a realização do projeto naquela área, pois pertencia ao Dnocs e ele poderia ceder ao Estado.

Ao receber a visita do arquiteto cearense do escritório brasileiro Imagic!, que vinha de algumas passagens pela Walt Disney Imagineering, núcleo de design de entretenimento e tematização dos hotéis e parques da Walt Disney Company, Cid empolgado resolveu fazer o projeto proposto.

Cid, que provavelmente nem sabia dos nossos estudos e andanças, iniciou as obras quatro anos depois.

A ideia é boa.

Lisboa fez um grande Aquário e hoje é considerado o melhor investimento da Expo 90. O Oceanário de Lisboa tem uma média anual de um milhão de visitantes e deixa um lucro líquido de um milhão de Euros. O Oceanário de Lisboa é a principal âncora turística da cidade e Portugal e é considerado, unanimemente, o grande case turístico de todo o mundo neste momento.

O problema é que o projeto do Ceará é ruim.

O projeto do Oceanário de Lisboa é do americano Peter Chermaueff. O projeto do L'Oceanografic de Valência, o maior aquário da Europa e o mais visitado do mundo, é do arquiteto espanhol Félix Candela. São arquitetos de indiscutível qualidade e currículo e que certamente ganhariam qualquer concurso ou seleção mais rigorosa.

Não vou falar detalhadamente do projeto do Ceará, até porque o arquiteto morreu recentemente.

Basta que pensemos seriamente no tamanho do investimento e da necessidade de um projeto arquitetônico e não de design.

E antes de concluir, quero deixar claro que a opção por construir um grande Aquário não é a melhor para Fortaleza neste momento específico de dificuldades financeiras do estado e Governo Federal.

Com um décimo do investimento previsto, poderíamos fazer um museu oceanográfico nos moldes do de Mônaco (com características bem nossas, jangadeiros, peixes, histórias) e o trajeto onde o visitante entrasse no litoral nascente (Icapuí) e saísse no litoral poente visitando objetos, imagens, pequenos aquários, características da população original. Um projeto que daria ao visitante muito mais inovação e vontade de conhecer o mar do Ceará e teria uma relação investimento/retorno mais tranquila sem sustos e atropelos dessas grandes obras.

Em síntese: com inteligência e talento o mar pode ser céu, o céu ser mar, como dizia Neruda.

(*) Jornalista. Promotor Cultural.

Fonte: Publicado In: Vida & Arte, de 12/02/23. Opinião, p.8.

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