Por Heitor
Férrer (*)
Na década de 1970, os servidores públicos
do Ceará contavam com o antigo Ipec para atendimento médico-odontológico. Não
se tratava de luxo, mas de um reconhecimento à dedicação daqueles que
sustentavam e sustentam a máquina estatal. Lembro-me de um episódio marcante
quando, certa vez, minha mãe adoeceu e, na mesma manhã, compareceu em nossa
residência, o dr. Heládio Feitosa, conduzido por um carro oficial, para
examiná-la. Veja o padrão de dignidade concedido ao nosso servidor público.
Com a Constituição de 1988, tal modelo não
pode continuar. O privilégio sem contrapartida foi substituído pelo princípio
contributivo, impondo ao servidor a responsabilidade de participar do custeio
também. Justo. Para manter o benefício teria que contribuir.
Foi então que o governador Camilo Santana,
com lucidez, reformulou o Issec, criado em 2007, estabelecendo o desconto em
folha, para garantir equilíbrio financeiro e assegurando aos servidores um
plano de assistência médica sólido, digno e previsível. O Estado assumiu o
compromisso de aportar recursos proporcionais, dividindo o peso e preservando o
patrimônio de quem dedica a vida ao serviço público.
Chega o governo Elmano de Freitas e, com
ele, a incerteza e a instabilidade. A engrenagem começa a ranger. Em 2024, os
servidores contribuíram com R$ 214 milhões e o governo com apenas R$ 110
milhões, menos da metade. Os efeitos dessa quebra de compromisso não demoraram.
As clínicas passaram a pedir descredenciamento e os médicos especialistas vêm
deixando de prestar serviços ao Issec. Precariza-se o atendimento ao servidor
público, que todo mês tem o desconto feito no seu contracheque, mas, ao buscar
atendimento médico, se depara com desassistência. A clínica lhe bate as portas;
seu médico já não está mais credenciado.
Diante do caos, solicitamos uma audiência
pública para tratar do assunto na Assembleia Legislativa. Seria o momento do
Governo explicar, justificar ou ao menos ouvir, mas a ordem é muito clara: o
governo não quer o debate e a audiência pública até hoje não foi aprovada na
comissão de saúde.
O Issec, que nasceu como conquista, hoje
cambaleia como fracasso. O desmonte não é obra do acaso, mas fruto da omissão
deliberada de um governo que prefere posar de popular às custas do sacrifício
silencioso dos servidores.
Faço aqui um apelo ao governador para que
haja respeito àqueles que sustentam o Estado e sua popularidade. Não destrua o
que foi construído com responsabilidade e zelo pelo seu antecessor. Os
servidores não pedem favor, pedem dignidade e respeito. A verdadeira dimensão
desse sofrimento só é sentida por quem, em meio à necessidade de atendimento
médico, vê seu pedido negado, mesmo tendo arcado, religiosamente, com sua
contribuição mensal em folha.
(*) Médico
e deputado estadual (Solidariedade).
Fonte: Publicado In: O Povo, de 22/08/2025. Opinião. p.19.
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