terça-feira, 10 de abril de 2018

MEDICINA & SAÚDE: Médicos Judeus Portugueses Fugidos da Inquisição


Meraldo Zisman (*)

Médico-Psicoterapeuta
A Medicina portuguesa era praticada, em sua maior parte, por profissionais de origem judaica ou moura. Decretada a Inquisição em Portugal, sobreveio a decadência da Medicina lusa, com a emigração de seus melhores profissionais, o que veio abalar, sobremaneira, o renome da Medicina ibérica.
O judeu-português Garcia de Orta, um destacado professor da Escola Médica de Goa, foi o médico mais afamado do século XVI. Vale registrar que, depois de morto e enterrado na Índia, os Inquisidores desenterraram seus restos mortais para queimá-los, em um abominável auto-de-fé lisboeta.
Eram médicos judeus portugueses os seguintes expoentes:
João Rodrigues Castelo Branco (Amatus Lusitanus) - homiziado na Antuérpia, foi catedrático de Medicina na Universidade de Ferrara. Entre seus pacientes encontrava-se o Papa Julius III;
Daniel Fonseca - foi para a França, onde se tornou o médico particular do Príncipe de Budapeste;
Judah Abravanel - refugiou-se em Nápoles, Gênova e Veneza, tornando-se médico, físico e cientista de grande reputação;
Filoteu Montalto - asilou-se em Florença, tornando-se o médico particular do Duque Frederico, e sendo chamado, inclusive, para tratar a Rainha Catarina de Medicis;
Jacob Mantinho - refugiou-se na Itália, onde foi Professor de Medicina e médico do Papa Paulo III;
Rodrigues da Fonseca - foi professor de Medicina em Pisa e em Pádua (as mais famosas Escolas Médicas da Europa, que devem seu prestígio e fama aos refugiados judeus portugueses);
Fabrísio de Água Pendente - foi professor de Anatomia em Bolonha (ele descobriu as válvulas nas veias profundas das nossas pernas e coxas);
Rodrigo de Castro - asilou-se em Hamburgo e teve, entre seus pacientes, a Rainha Cristina, da Suécia;
Fernando Mendes - homiziou-se em Londres, tornando-se o médico particular da Rainha Catarina de Bragança, esposa do Rei Carlos II.
Com os primeiros Governadores Gerais, alguns médicos marranos chegaram ao Brasil-Colônia, uma vez que lhes era vetada a prática profissional em Portugal. Na época, ser médico era uma tarefa tão árdua que se dizia: é um "negócio de judeu", ou uma "tarefa exercida, exclusivamente, por fugidos da Inquisição".
Muito embora, no Brasil, o Tribunal da Santa Inquisição não houvesse se instalado, havia sempre os temíveis Visitadores do Santo Oficio e todo um aparato de opressão que prendiam e deportavam, para Lisboa, os médicos aqui homiziados, e denunciados por práticas judaizantes junto com suas famílias.
Os primeiros "médicos" que aqui chegaram eram, em sua maioria, cristãos-novos ou judeus desterrados pela Inquisição em Portugal. A prática da Medicina no Brasil-Colônia estava limitada a uma Medicina indígena, baseada em ervas e benzeduras, ou a uma Medicina "científica" baseada em sangrias, poções e religiosidades. De acordo com Lycurgo de Castro Santos Filho, historiador da Medicina, foram judeus ou cristãos-novos quase todos os médicos que atuaram no Brasil, do século XVI até meados do século XVIII.
Em 25 de outubro de 1448, por decreto do Rei D. Afonso V, Portugal regulamentou o exercício da Medicina e, ao mesmo tempo, criou a autoridade fiscalizadora. A lei intitulada "Regimento do Cirurgião-Mor dos Exércitos", continuava em vigor, na época do Descobrimento do Brasil, e no início da nossa colonização. O Mestre João (Johanes) Farras, físico-mor e astrônomo da armada comandada por Pedro Álvares Cabral, foi o primeiro cultor da Medicina a pisar em terras brasileiras. Era um judeu converso.
O marrano Jorge Valadares foi o primeiro médico diplomado que chegou à Bahia de Todos os Santos. Ele veio como físico-mor, na comitiva do primeiro Governador Geral (1549-1553). Foi sucedido por Jorge Fernandes, que também era judeu, e ocupou o mesmo cargo por três anos. (citado por Bella Herson In: Cristãos-novos e seus descendentes na medicina brasileira (1500-1800).
A função social da Medicina e de sua formação é explicada pela estreita relação entre Saúde e sociedade.
Não por ser médico e, muito menos, judeu, dediquei anos de estudo ao marranismo e aos médicos cristãos-novos. É como já dizia o Padre Antônio Viera: cristãos-novos/judeus-velhos. A maioria dos médicos que vinha da Península Ibérica exercia o rabinato, tendo como ganha-pão os honorários auferidos por parte dos doentes, desde que, do ponto de vista religioso, era-lhe vetada qualquer retribuição pecuniária advinda do saber religioso.
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE) e da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES). Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Foi um dos primeiros neonatologistas brasileiros.

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