quarta-feira, 11 de abril de 2018

DA MORTE À VIDA

Márcia Alcântara Holanda (*)
A dor romba, da qual já falei aqui, aquela que nos atinge no cuore, forma um oco na alma, dando-nos a impressão de que fomos trespassados por um golpe, bem certeiro, de enorme covardia, quando nossa essência se desfigura, nossos sonhos se esvaem e fica esse enorme buraco no ser (“As dores rombas de setembro” – O POVO – 27/09/2016). Essa dor veio de novo. Dessa feita provavelmente atingiu as mais de cinquenta milhões de brasileiras negras e pardas desse Pais, e também boa parcela do nosso povo desvalido do necessário ao bem viver. Foi assim que a morte de Marielle nos atingiu, minando a todos e, principalmente, a sua exemplar representação de injustiçados e oprimidos brasileiros.
No primeiro momento vem a questão: por que? Nem se sabe exatamente o motivo, mas uma coisa é certa: foi exibicionismo do poderio do crime, seja de qual milícia. O que eles disseram, eliminando Marielle e Anderson, foi que detêm o poder, até porque usaram armas adquiridas com o nosso dinheiro, pois pertenciam ao Estado.
Mesmo sendo combativa e de passado de luta, Marielle nunca havia sido ameaçada ou sofrido qualquer atentado, segundo testemunho de seus companheiros e familiares.
Para aprofundar os danos, o deputado Alberto Fraga, defensor do uso de armas (Folha, 19/03/2018 -Alessandra Orofino), tentou denegrir o caráter de Marielle e, a partir de sua argumentação, reconhecida depois, por ele mesmo, como infundada, fez com que as redes sociais se abarrotassem de postagens, que nada revelavam, depreciando a vítima e aumentando a dor de todos.
Marielle era recebida em todas as instâncias da periferia de sua cidade, sempre lutando pelos direitos humanos (Folha, Caderno Um - 18/03/2018).
A dor está aí, mas a morte da moça vereadora se faz combustível, e bem ativo, para as militâncias que têm como meta a observação, na integra, dos direitos humanos.
A mobilização popular tem sido bem maior do que a covardia dos seus assassinos e dos detratores de seu caráter. A morte de Marielle hoje é viço alimentado por sua carreira política, pelo seu compromisso com as causas femininas e das populações negra e trabalhadora.
Marielle e Anderson Gomes tiveram suas vidas interrompidas, mas acenderam todas as outras que compartilhavam seus ideais e suas lutas. A morte de Marielle é vida.
(*) Médica pneumologista; coordenadora do Pulmocenter; membro da Academia Cearense de Medicina.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 24/03/2018. Opinião. p.19.

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