domingo, 28 de fevereiro de 2021

O BANCO DA TINTA FRESCA

         Fala-se que, nos idos dos anos sessenta, na sede do Quartel-General de uma Região Militar, diariamente, fazia-se a troca da guarda posicionada diante de um banco de uma pracinha interna.

Um novo comandante, que assumira o comando militar local, achou estranho que, durante as 24 horas, havia sempre um soldado armado, com revezamento em certas horas do dia, de modo a deixar sempre um recruta ali, de prontidão, defronte ao dito banco.

Como era um recinto intramuros e sem qualquer sentido estratégico ou de segurança do edifício, o comandante indagou de um oficial de gabinete qual seria a razão daquela guarda permanente postada em frente ao banco, sendo informado por seu subordinado de que, desde quando chegara para servir nessa cidade, aquele procedimento já estava em curso.

Em vista disso, o general-comandante determinou ao seu chefe de gabinete que fizesse uma investigação com o fito de descobrir a ordem original que resultara na aplicação daquele proceder diário.

Como não encontrara nas pastas de arquivos recentes, qualquer indicativo da ordem em questão, e nem mesmo os veteranos sabiam quando aquilo começara, o diligente chefe de gabinete debruçou-se a pesquisar o arquivo-morto da instituição, e, depois de muito procurar, conseguiu achar o dito documento seminal.

A ordem de serviço, baixada em Boletim Interno (BI) há muitos anos, rodada em mimeógrafo, dispunha que o banco tinha sido pintado, mas, para evitar colocar uma tabuleta, com os dizeres: “TINTA FRESCA”, o oficial do dia determinou a instalação de sentinela, que deveria vigiar o banco, impedindo que as pessoas nele viessem a se sentar.

Só que esse oficial se esqueceu de firmar a duração da medida, e como ele teria sido logo transferido para outra unidade militar, a troca de guarda para vigiar um mero banco prosseguiu por anos a fio.

Nota: Essa estória é antiga e muito conhecida, tendo uma variante, provavelmente a verdadeira, situando o fato em um quartel comum, que diz que o novo comandante fora o próprio oficial do dia que cumprira a ordem editada no BI, quando era tenente, e depois de muitos anos, passando por outras cidades, galgando, ao longo do tempo, as promoções na carreira militar, e voltara para comandar, agora com a patente de coronel, a mesma unidade militar, quando verificou que sua ordem seguia vigendo.

Marcelo Gurgel Carlos da Silva

Ex-Presidente da Sobrames-Ceará

* Publicado In: SILVA, M. G. C. da (Org.). Ordinário, marche! Médicos contam causos da caserna. Fortaleza: Expressão, 2015. 112p. p.79-80.

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