Por Sérgio
Pardellas (sergiopardellas@istoe.com.br)
Na década de 90, ela faliu duas lojinhas de bugigangas baratas. Vinte anos depois, a presidente mergulha o Brasil numa interminável crise político-econômica e marca sua gestão pela irresponsabilidade fiscal e falta de confiabilidade externa.
Pão & Circo. Com esse nome sugestivo, alusivo à estratégia
romana destinada a entreter e ludibriar a massa insatisfeita com os excessos do
Império, a presidente Dilma Rousseff abriu em fevereiro de 1995 uma lojinha de
bugigangas, nos moldes das populares casas de R$ 1,99. O negócio em gestação
cumpriu a liturgia comercial habitual. Ao registro do CNPJ na Junta Comercial
seguiu-se o aluguel de um imóvel em Porto Alegre, onde funcionava a matriz.
Quatro meses depois, uma filial foi erguida no centro comercial Olaria, também
na capital gaúcha. O problema, para Dilma e seus três sócios, é que a
presidente cuidou da contabilidade da empresa como lida hoje com as finanças do
País – recém-rebaixado pela agência de risco Standard & Poors por falta de
confiabilidade. Em apenas 17 meses, a loja quebrou. Em julho de 1996, já não
existia mais.
Tocar uma lojinha de
quinquilharias baratas deveria ser algo trivial, principalmente para alguém que
15 anos depois se apresentaria aos eleitores como a “gerentona” capaz de manter
o Brasil no rumo do desenvolvimento. Mas, ao administrar a Pão & Circo,
Dilma cometeu erros banais e em sequência. Qualquer semelhança com a barafunda
administrativa do País atual e os equívocos cometidos na área econômica de 2010
para cá, levando ao desequilíbrio completo das contas públicas e à irresponsabilidade
fiscal, é mera coincidência. Ou não.
Para começar, a loja foi
aberta sem que os donos soubessem bem ao certo o que seria comercializado ali.
Às favas o planejamento, primeiro passo para criação de qualquer negócio que se
pretenda lucrativo. A empresa foi registrada para vender de tudo um pouco a
preços módicos, entre bijuterias, confecções, eletrônicos, tapeçaria, livros,
bebidas, tabaco e até flores naturais e artificiais. Mas a loja acabou
apostando no comércio de brinquedos para crianças, em especial os do
“Cavaleiros do Zodíaco”, série japonesa sucesso entre a meninada dos anos 90.
Os artigos revendidos pela Pão & Circo eram importados de um bazar
localizado no Panamá, para onde Dilma e uma das sócias, a ex-cunhada Sirlei
Araújo, viajaram três vezes para comprar os produtos. As mercadorias eram
despachadas de navio até Imbituba (SC) e seguiam de caminhão até a capital
gaúcha.
Apesar de os produtos ali
vendidos custarem bem pouco, o negócio de Dilma era impopular – como a
presidente hoje, que ostenta míseros 7% de aprovação. Os potenciais clientes e
até mesmo os comerciantes vizinhos reparavam na apresentação mal-acabada da
loja, com divisórias de tábua de madeira. “Não entrava ninguém ali”, afirmou ao
jornal Folha de S. Paulo Ênio da Costa Teixeira, dono de uma pizzaria próxima.
Ao abrir a vendinha de importados, a presidente também não levou em conta um
ensinamento básico do bom comerciante: “o olho do dono é que engorda o gado”.
Segundo relato dos próprios sócios, Dilma aparecia na loja “eventualmente”.
Preferia dar ordens e terceirizar as tarefas do dia a dia, situação bem
semelhante ao contexto atual, em que delegou a economia ao ministro da Fazenda,
Joaquim Levy e a política ao vice Michel Temer, até este desistir da função
dizendo-se boicotado pelo ministro Aloizio Mercadante, da Casa Civil.
Na sociedade da
Pão&Circo, o equivalente ao Mercadante era Carlos Araújo, o ex-marido. Era
Araújo quem aconselhava Dilma sobre como ela poderia turbinar as vendas. Mas o
ex-cônjuge se revelou tão inepto quanto o titular da Casa Civil. “Acho que ela
não era do ramo”, afirmou o comerciante, André Onofre, dono de um café ao lado.
Depois de tantas trapalhadas comerciais, não restou outro destino à lojinha de
R$ 1,99 de Dilma senão a bancarrota.
Questionada sobre a mal
sucedida experiência no mundo dos negócios, a Dilma comerciante lembrou mais
uma vez a Dilma presidente. Há duas semanas, numa espécie de negação da
realidade, a presidente rechaçou a “catástrofe” econômica vivida atualmente
pelo Brasil. Ao se referir à lojinha, cinco anos atrás, a Dilma comerciante
saiu-se com a seguinte pérola: “Quando o dólar está 1 por 1 e passa para 2 ou 3
por 1, o microempresário quebra. É isso que acontece com o microempresário, ele
fecha. A minha experiência é essa e de muitos microempresários desse País”. Ou
seja, como boa petista, a presidente jogou a culpa em FHC pela malfadada
experiência administrativa – que hoje, sabe-se, seria apenas a primeira. Com a
agravante que a crise atual, também de sua inteira responsabilidade, atinge
milhões de brasileiros. A outra teve alcance bem restrito, afetando somente o
seu bolso e as economias de seus sócios. Bem, de todo modo, se Dilma atribui a
falência à relação dólar/Real no período em que o negócio esteve em
funcionamento, com todo respeito, ela comete um grave erro matemático. Dilma
administrou seu comércio de quinquilharias importadas no melhor momento da
história do Brasil para se gerir esse tipo de negócio — quando o Real estava
valorizado em relação ao dólar. No ano e mês em que a Pão&Circo foi criada
– fevereiro de 1995 – o dólar valia R$ 0,8. Quando quebrou, a moeda americana
ainda não passava de R$ 1.
O negócio tocado pela então
política filiada ao PDT fechou as portas em julho de 1996. Três anos depois ao
encerramento da casa de bugigangas em Porto Alegre, Dilma assumiria o cargo de
secretária de Minas e Energia na gestão Olívio Dutra (1999-2002).
O resto da
história, todos sabem.
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