quinta-feira, 7 de abril de 2016

A PROPÓSITO DE FELICIDADE


Por João Soares Neto (*)

 Compreender é complicar. É enriquecer-se profundamente”. Lucien Lebvre (1878 -1956), historiador francês.

Há alguns anos resolvi criar uma biblioteca. Dei a ela o nome de “Espaço da Leitura”. Ela é aberta ao público todos os dias, inclusive aos domingos. Funciona das 10 da manhã às 10 da noite. O espaço é climatizado, há jornais do dia, revistas e livros para todos os gostos. O endereço: Av. Carapinima, 2200, 1º Piso. É só perguntar e chega fácil. Pode levar o seu computador e copiar, se desejar. Mas é preciso fazer isso em silêncio para não atrapalhar os outros usuários.

Visito-a, por vontade e zelo. Foi lá que me deparei com Epicuro, filósofo ateniense, nascido em 341 antes de Cristo, se o calendário não estiver errado. Pois bem, vejo a “Carta sobre a Felicidade”, escrita a Meneceu, um de seus destinatários favoritos, embora tivessem. outros, inclusive Heródoto.

Nessa epístola, que cabe em bolso, da Editora da Universidade Estadual de SP - UNESP, há uma elegia à felicidade. É bom deixar claro que Epicuro, foi expulso de Atenas após a morte de Alexandre Magno. Anos depois, volta para viver em casa com amplo terreno e jardim. Na casa ateniense ficavam os mestres, no “Jardim de Epicuro” abrigavam-se os seus jovens seguidores.

É bom lembrar que a tese de doutorado de Karl Marx versou sobre “A relação entre a filosofia de Epicuro e a de Demócrito”. Nela, Marx, entre outras considerações, tratava da visão de Demócrito sobre causa e efeito e asseverava que ela se aplicava tanto aos homens quanto à natureza. Ao falar de Epicuro, Marx associa-se ao seu pensar, pois, tal como ele, não aceitava o determinismo histórico e a fatalidade.

A carta é uma exortação ao exercício filosófico. Essencial para a obtenção da felicidade, “acreditando nos deuses”. Jesus só nasceria três séculos e meio depois de Epicuro. Logo no princípio, ele afasta o natural temor da morte: “Torna-se absolutamente necessário vencer esse medo da morte; ninguém deve temê-la, uma vez que não há nenhuma vantagem em viver eternamente: o que importa não é a duração, mas a qualidade da vida”.

A tradução da carta é de Álvaro Lorencini, daí a linguagem atualizada. Para Epicuro, sábio seria aquele que nunca acredita no destino e na sorte, mas o que acredita na sua vontade e na sua liberdade. Daí que a repetida frase de Geraldo Vandré: “quem sabe faz a hora, não espera acontecer” não tem nada de novo.

Quem afirma que a hora de dedicar-se à filosofia ainda não chegou, ou que ela já passou, é como se dissesse que ainda não chegou ou que já passou a hora de ser feliz”. É um apelo ao estudo da filosofia e, por meio dela, se chegar à felicidade, pela prudência. Não existiria existência feliz sem cautela, sem encanto e sem justiça. Deve-se viver sem medo da morte. E explana: “A morte, portanto não é nada, nem para os vivos, nem para os mortos, já que para aqueles ela não existe, ao passo que estes não estão mais aqui”.

Arremato e concluo crendo que ele fala dos desejos humanos, os naturais e os necessários, básicos para a felicidade: “o prazer é o início e o fim de uma vida feliz”. Em contraponto, afirma: “Toda dor é um mal, mas nem todas devem ser sempre evitadas. Convém, portanto, avaliar todos os prazeres e sofrimentos de acordo com o critério dos benefícios e dos danos… Tudo que é natural é fácil de conseguir; difícil é tudo o que é inútil”.

 (*) João Soares Neto é escritor e membro da Academia Cearense de Letras.

Fonte: Publicado no jornal O Estado-CE, em 31/01/2016.

Nota: Baseado na “Carta sobre a Felicidade”, de Epicuro, dedicada a Meneceu.

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