quinta-feira, 24 de setembro de 2020

A COVID-19 E OS EFEITOS NA SAÚDE DOS RINS

Por Moisés Santana (*)

No início da pandemia pelo novo coronavírus, os dados chineses mostravam uma baixíssima incidência de lesão aguda nos rins. Porém, com a progressão da pandemia foi possível perceber que a realidade era diferente, como mostraram alguns trabalhos científicos depois que o vírus se alastrou pela Itália. Lá, 30% dos pacientes internados em UTIs com Covid precisavam de hemodiálise por conta da instabilidade do quadro e por não suportar o acúmulo de líquido no organismo. Aqui no Brasil a pandemia também aumentou a demanda por hemodiálise. Os centros com UTI para Covid-19 chegaram a dobrar o número de diálise e quadruplicar o número de terapias renais contínuas. Ao que tudo indica, nem mesmo a estabilização da pandemia irá permitir que consigamos dimensionar os novos desafios que nos aguardam.

A grande dúvida é: quantos desses pacientes que se recuperaram da infecção permanecerão com disfunção renal, necessitando ou não de hemodiálise? É esperado que a lesão aguda cesse após a melhora clínica do paciente, mas hoje sabemos que isso não está acontecendo em todos os casos. Muitos que ficam curados da Covid precisam de acompanhamento nefrológico ambulatorial ou mesmo de terapia renal substitutiva.

O fato é que hoje a ciência ainda não conhece com precisão a relação ou mesmo o número de casos em que a insuficiência renal está ligada à Covid, ainda mais se levarmos em conta que mais de 130 mil pessoas já faziam diálise no País antes da pandemia começar.

Nesse contexto, também temos que ter em mente que muitos pacientes renais adiaram consultas e exames por conta das medidas de distanciamento social. Ainda não conseguimos medir o impacto do adiamento dessas consultas e exames, mas temos conhecimento que doenças graves capazes de comprometer os rins estão menos recorrentes nos hospitais, sendo pouco provável que elas tenham diminuído com a pandemia.

Por mais que essas evidências existam, estamos às escuras. É preciso que os gestores públicos tenham uma atenção especial pela saúde, pois quando o impacto for visível ele vai afetar o sistema de saúde visto que os efeitos diretos e indiretos na saúde dos rins são expressivos.

(*) Médico nefrologista. Presidente da Associação das Clínicas de Diálise do Estado do Ceará.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 27/8/2020. Opinião. p.20.

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