quinta-feira, 10 de setembro de 2020

O Envelhecimento da População Vai Implodir a Previdência?

Meraldo Zisman (*)

Médico-Psicoterapeuta

(O desrespeito ao idoso deve ser considerado uma patologia cultural, social e política)

A Mídia propaga e os Economistas argumentam ad nauseam (em português, "argumentação até provocar náusea") que a reforma da Previdência Social será a salvação da pátria.

A questão é que os jornais não são feitos para divulgar, mas para encobrir as notícias. E ainda provocam mais um apavoramento com o aumento das mensalidades dos Planos de Saúde, ‘justificado’ pelo envelhecimento da população brasileira e - acredito - aproveitando o vácuo provocado pela corrupção & mazelas. Os aumentos estratosféricos exigidos por essas instituições - que são controladas (teoricamente) pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), agência reguladora vinculada ao Ministério da Saúde e responsável pelo setor de planos de saúde no Brasil.

A ANS nada comenta sobre os aumentos absurdos que já corriam soltos muito antes da ocorrência da crise econômico-política brasileira (parece até que os acata). Associado a esse assalto oficializado ocorre um novo complicador que é a violenta escalada do valor da mensalidade sobre o valor miserável dos proventos dos inativos.

Agora estão a falar sobre o fim do denominado bônus demográfico. Para lembrar, esse conceito é baseado na taxa de crescimento da população em idade ativa entre 20 e 64 anos, que deve ser superior à taxa de crescimento da população total. Isto é, quando a taxa de crescimento da população de crianças, jovens e idosos é menor do que o crescimento da população em idade ativa ocorre um desequilíbrio nas contas da previdência. 2019 será o primeiro ano, desde meados dos anos 1970, em que a taxa de crescimento da população econômica ativa será inferior à taxa de crescimento da população total do país.

Acredito que esses aumentos estratosféricos das mensalidades dos planos de ‘saúde’, que vêm ocorrendo há anos, visam expulsar os “da melhor idade” pelo seu maior risco em adoecer, em comparação com os jovens. Omitem o valor do acúmulo de capital ocorrido durante o período da juventude dos idosos, que foram jovens e pagaram por anos as mensalidades, sem nada usufruir.

O Fundo de População das Nações Unidas (ou Fundo das Nações Unidas para Atividades Populacionais, tradução do nome em inglês, United Nations Population Fund), organismo responsável por questões populacionais, assegura: o aumento da expectativa de vida no planeta é "motivo de celebração".

Por outro lado, a mesma organização pertencente às Nações Unidas, adverte que 47% dos homens idosos e 24% das mulheres idosas participam do mercado de trabalho e não podem ser considerados ociosos. No Brasil, a previsão é que o número de idosos triplique de hoje até 2050 - passando de 21 milhões para 64 milhões. Por essas antevisões, a proporção de pessoas mais velhas no total da população brasileira passaria de pouco mais 10%, em 2018, para 29%, em 2050. Isso é um fenômeno universal, apesar de não se saber se essa tendência será concretizada. Olvidam-se de que um dos objetivos da Nação é a manutenção na comunidade do maior número possível de idosos.

Contribuir para o grau de autonomia dos idosos pelo maior período possível não é sair dizendo por aí que os velhos vão detonar a Previdência Social ou que os Planos de Saúde estão tendo prejuízo. Isso, além de ser falácia, não passa de iniquidade para com os mais velhos, agora que a expectativa de vida aumentou, assim como a qualidade de vida.

Nós, os idosos, oramos para que se preste alguma atenção ao aspecto humano das coisas, pois o Mercado não pode nem deve considerar a saúde como uma ‘commodity’.

Parafraseando o escritor e jornalista Ruy Castro: “Idoso tem direito a andar de graça em ônibus, pagar meia-entrada no teatro e o dobro do preço no plano de saúde”.

*****

A esperança voa muito depressa e a vida é curta.

Ela, a esperança, pode ser um bom desjejum, mas como jantar é péssima.

O gênero humano pode perder tudo, menos a dignidade.
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE), da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES) e da Academia Recifense de Letras. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).

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