Por João Paulo Correia Mendes (*)
No mês da conscientização do Outubro Rosa,
é urgente acender o sinal de alerta sobre um dado que vem assustando médicos e
pacientes: o aumento crescente de casos de câncer de mama entre mulheres
jovens. Estamos vivenciando uma mudança no perfil epidemiológico da doença - e
é hora de falar com clareza.
Por décadas, o câncer de mama foi visto
como um problema predominantemente feminino em idades mais maduras. Mas os
números recentes demonstram que isso já não é mais uma verdade absoluta: temos
observado casos diagnosticados em mulheres na casa dos 20, 30 e 40 anos -
muitas vezes em estágios mais avançados, por falta de suspeita precoce.
Esse aumento não é coincidência. É reflexo
de fatores complexos e interligados: alterações hormonais precoces, exposição
prolongada a hormônios sintéticos, estilos de vida modernos - como
sedentarismo, dieta rica em ultraprocessados, uso de contraceptivos hormonais
sem acompanhamento adequado e obesidade - além da resistência cultural em
tratar sintomas iniciais como sinal de alerta.
Os dados atuais impressionam e nos convocam
a refletir. Estimativas nacionais mostram que cerca de 40% dos casos de câncer
de mama no Brasil ocorrem em mulheres com menos de 50 anos - e, nesses casos, o
prognóstico tende a ser mais reservado. Em algumas regiões do país, como Norte
e Nordeste, o diagnóstico tardio em jovens está associado a maior mortalidade,
por demora em detectar alterações atípicas que são ignoradas como "normal
da idade".
Estudos recentes indicam que tumores em
mulheres jovens frequentemente apresentam características biológicas mais
agressivas – maior incidência de receptores hormonais negativos e
proliferatividade celular mais elevada - o que exige vigilância diferenciada.
Quando uma jovem relata dor persistente,
secreção, coceira ou alteração na pele da mama, muitos profissionais e
pacientes descartam a hipótese de câncer por considerá-la improvável nessa
faixa etária. Esse erro de complacência custa caro. O atraso no diagnóstico é
um dos fatores que pioram o prognóstico e reduzem as opções terapêuticas.
Além disso, há um "efeito
cascata" negativo: quando a detecção é tardia, a necessidade de tratamentos
mais agressivos - como cirurgias extensas, quimioterapia e radioterapia -
aumenta, com consequências físicas, emocionais e econômicas muito mais severas.
Diante desse cenário, é essencial agir em
várias frentes. Precisamos inserir nas campanhas de saúde a mensagem de que o
câncer de mama não escolhe idade. Jovens devem ser informadas sobre sinais
menos óbvios, como coceira persistente, secreção, retração de mamilo e
alterações na pele - não apenas sobre o "nódulo detectável".
Profissionais de saúde, inclusive
generalistas, precisam ser capacitados e atualizados para suspeitar e
encaminhar adequadamente mesmo pacientes jovens. Em casos de sintomas ou risco
elevado, exames de imagem como ultrassonografia ou ressonância devem ser
considerados.
Também é necessário fomentar pesquisas
específicas sobre câncer de mama precoce, para compreender melhor as
particularidades biológicas e sociais que afetam essa população. E, acima de
tudo, é urgente fortalecer a cultura do autocuidado e do empoderamento feminino
- para que mulheres jovens conheçam seus corpos e não ignorem sinais, mesmo os
mais sutis.
Se o câncer de mama está mudando sua face,
precisamos mudar nossa forma de combatê-lo. Que o Outubro Rosa deste ano traga
não só laços cor-de-rosa, mas conscientização real, vigilância ativa e apoio às
jovens que muitas vezes são invisíveis dentro da doença.
O alerta deve reverberar em toda a classe
médica, nas políticas públicas e em cada mulher que sonha com uma vida longa e
íntegra. Porque, acima de tudo, saúde não tem idade - e ninguém pode ser
excluída desse cuidado.
(*) Médico
mastologista e cirurgião de mama.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 8/10/2025. Opinião. p.19.

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