Por
Saraiva Junior (*)
Fui à loja de rações para comprar o milho das galinhas do meu
quintal. Entabulava conversa com o proprietário do estabelecimento sobre o
calor, as queimadas, em geral criminosas, que ocorriam na região e o processo
de desertificação que avança na caatinga. Tudo isso é bobagem, meteu-se a dizer
um representante do agronegócio local que por acaso ali se encontrava, a poucos
metros, e até então por mim passara despercebido.
Não me fiz de rogado e disse-lhe que, junto aos enormes incêndios
florestais vinham as secas, as colheitas perdidas, as várias espécies de
animais ameaçadas em suas existências, além dos rios desaparecidos pelos quatro
cantos do planeta. O homem logo retrucou que bastava uma chuvinha dessas que
caiu no Rio Grande do Sul para reflorestar a terra. Argumentação no estilo
trumpista. E nada de atentar para as inundações como um dos efeitos reversos do
desmatamento.
Tentei despertar a memória em torno do fim da produção algodoeira
no Nordeste, que deu-se muito por conta dos incêndios na nossa caatinga, cujos
solos foram perdendo os principais nutrientes. Ele respondeu que o fim do ciclo
do algodão foi devido ao “bicudo”, introduzido pelos americanos com medo da
concorrência no comércio com os países europeus. A política do Bolsa Família
fez com que o povo trabalhador ficasse preguiçoso, acrescentou.
Quando lhe expliquei que estávamos prestes a viver grandes
catástrofes em razão do aquecimento global, com o derretimento das calotas
polares e a elevação do nível do mar, que bastava subir um ou dois metros para
inundar boa parte das principais cidades costeiras, com arrogância ele me
perguntou se eu estava conferindo diariamente a subida do nível do mar em
Fortaleza.
As pesquisas científicas apontam para os riscos da exploração
desenfreada dos recursos naturais, que são finitos. No entanto, o sistema
capitalista segue funcionando para o fim da jornada de vida no planeta, pois o
lucro é egoísta. A sede de lucro parece não dar brecha para a compreensão, por
isso o negacionismo impera. Se ainda há tempo de encontrar uma saída, essa será
pelas vias da educação voltada para o meio ambiente, junto às gerações mais
novas.
(*) Escritor e
ex-conselheiro do Conselho de Leitores de O Povo.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 18/12/24. Opinião. p.20.
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