Por Patrícia Soares de Sá Cavalcante (*)
Fui assistir, no Teatro José de Alencar, à
peça Eu de Você, com Denise Fraga. A obra é inspirada em histórias reais.
Denise vai migrando de uma narrativa a outra e, em certo momento, é difícil
perceber a quem ela está dando voz. Mas isso não importa. As histórias parecem
se entrelaçar como se fossem uma só. Havia uma grande atriz no palco,
interpretando as angústias de todos nós.
A mãe de Denise está indo nadar. Põe a
touca e segue, transversalmente, rumo ao horizonte. Denise, ainda menina,
sozinha na areia, desesperada, grita: "Volta, mããeeee!!!" Meu peito
apertou. Me vi perdida na praia, por volta dos cinco anos, sem conseguir
gritar. Ela - Denise - gritou por mim. As nossas mães voltaram. Ganhei um
sorvete da mamãe. A mãe de Denise lhe ensinou a boiar. Boiar. Agora estou com
minha avó, numa piscina oval, em Messejana, aprendendo a boiar. Ela vestia um
maiô preto. Ela, que teve uma vida difícil, descobriu o prazer de flutuar. Às
vezes, ficar suspensa, olhando o céu - ou de olhos fechados - é muito bom.
Iolanda está distante, seus olhos não
brilham, estão opacos. Seu filho, tentando "encontrá-la", clama por
Chico. "Minha solidão se sente acompanhada. Por isso, às vezes, sei que
necessito teu colo... eternamente, Iolanda." Os olhos de Iolanda ganham
vida. Eles cantam juntos. Ela, mesmo que por frações de segundo, lembra.
Volto à minha avó. Papai pergunta:
"Mamãe, sabe quem é ela?"
"Sou seu filho, e ela é minha
filha."
"Então ela é o quê sua?"
Silêncio. "Vovô... Ô jardineira, por
que estás tão triste?" Cantava tão alegre quanto uma criança... "Não
fiques triste (vovó), que esse mundo é todo teu..." Ela não sabia dizer
que eu era sua neta, mas sorria com intimidade para mim.
O público estava comovido, cada pessoa
tocada de uma forma íntima e particular. Permeando as histórias, uma citação de
Simone de Beauvoir traduz lindamente aquela emoção coletiva:
"Toda dor dilacera. Mas o que a torna
intolerável é que quem a sente tem sempre a impressão de estar separada do
resto do mundo. Partilhada, a dor, ao menos, deixa de ser um exílio. Essa é uma
das funções essenciais da arte: superar a solidão, que é comum a todos
nós."
A arte salva.
(*) Médica
psiquiatra.
Fonte:
Publicado In: O Povo, de 22/04/2025.
Opinião. p.14.
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