Por Pe. Eugênio
Pacelli SJ
(*)
O pontificado de Francisco tem sido uma
convocação profunda à essência do Evangelho. Seu legado se desenha como um
retorno às raízes da fé cristã, despojado de formalismos e erguido sobre a
ternura, a justiça, a simplicidade e a escuta sincera. Ele não reformou apenas
estruturas — reformou a linguagem, os gestos, os símbolos e a própria maneira
de a Igreja estar no mundo.
A opção preferencial pelos pobres deixou
de ser apenas discurso e tornou-se prática concreta e cotidiana. Francisco
desceu do trono simbólico do papado e caminhou entre os que sofrem, acolhendo
migrantes, visitando periferias, tocando feridas humanas com misericórdia e
compaixão. Sob sua liderança, a Igreja passou a respirar o ar puro da ternura
evangélica, reencontrando o centro vivo da fé: Deus é amor que se inclina, que
cuida, que serve, que levanta.
Sua teologia pastoral é marcada pelo
discernimento, pela escuta dos sinais dos tempos e pelo diálogo honesto com o mundo
contemporâneo — elementos profundamente enraizados na espiritualidade inaciana.
Francisco abriu as portas do Sínodo, fortaleceu a cultura da escuta, do
encontro, da sinodalidade e da corresponsabilidade, desafiando a Igreja a
abandonar toda autorreferência estéril. Como bom pastor, guia sem impor, inclui
sem excluir, ama sem medida e sem reservas.
É também o Papa da ecologia integral,
da fraternidade universal, do cuidado com a casa comum e com a vida em
todas as suas expressões. Encíclicas como Laudate Si e Fratelli Tutti não
apenas orientam a caminhada da fé, mas exigem uma profunda conversão do
coração, da consciência e das estruturas sociais, aproximando a doutrina da
carne concreta da existência humana.
Na história do papado, Francisco ocupa
um lugar absolutamente singular: o primeiro jesuíta, o primeiro
latino-americano, o primeiro a tomar o nome de Francisco — e talvez o primeiro,
em séculos, a fazer do papado um espelho nítido da vida de Jesus. Seu legado é
a memória viva de um Cristo que se fez próximo. E isso, na história da Igreja,
é verdadeiramente revolucionário.
(*) Sacerdote
jesuíta e mestre em Teologia. Escritor. Diretor do Mosteiro dos Jesuítas de
Baturité e do Polo Santo Inácio. Fundador do Movimento Amare.
Fonte: O Povo, de 26/04/2025. Opinião. p.18.
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