quarta-feira, 4 de maio de 2016

BASTA DESSE COMPLEXO DE VIRA-LATA


Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
As pessoas são distintas entre si, não adianta estereotipar. Por isso não gosto quando alguém afixa um letreiro, quanto mais se tratando de um país.
É o caso das palavras Corrupção e Crise. Advirto aos senhores da Mídia: muita cautela com essa estereotipia do Homem Brasileiro. Não existe momento político, econômico ou militar que possa baixar a nossa autoestima ou o orgulho positivo do Povo Brasileiro, porém jamais devemos faltar com a verdade Histórica, mesmo que ela seja dura de engolir. Melhor uma verdade amarga do que uma mentira doce. Fica parecendo que a corrupção só acontece no Brasil. O que não quer dizer que não aconteça.
Sem querer bancar o erudito, cito Shakespeare (1564-1616):
“Ah, se a propriedade, títulos e cargos/Não fossem fruto da corrupção! /E se as altas honrarias/Se adquirissem só pelo mérito de quem as detém/ Quantos não estariam hoje melhor do que estão? /Quanto os que comandam não estariam entre os comandados?”
O inglês já afirmava isto há muito tempo. E na Roma clássica, muito antes do nascimento de Cristo já se dizia: “em Roma tudo está à venda”.
Não estou aqui para dar lições a nenhum dos meus patrícios e muito menos aos senhores da imprensa, com o poder de fogo que possuem e que – espero - continuem a ter, nem para dizer que as primeiras vítimas dos preconceitos e das mentiras são, infelizmente, os que por causa delas sofrem, enquanto elas não são desmistificadas.
Não sendo nenhum ingênuo, sei da gravidade da conjuntura nacional, com o engessamento do Estado por um partido único que quer se perpetuar no poder, etc. etc. Estamos em um processo de amadurecimento democrático e o ‘aqui e agora’ é o que vale.
Como antigo Professor de Pediatria, sei que a sociedade tem de sofrer, à semelhança dos seres humanos, as suas próprias dores de crescimento para vir a se tornar adulta. É o preço que temos de pagar pelo aprimoramento Democrático ou a maturidade de uma grande Nação.
Para que o desenvolvimento de uma Democracia seja sustentável, esse desenvolvimento tem de ter sido alcançado por acúmulo e jamais por rupturas abruptas. Apesar disso, tais momentos, mais ou menos dolorosos, que tivemos/teremos de enfrentar fazem parte do processo histórico. O que não podemos fazer é tirar a esperança do povo, diminuindo a sua autoestima, omitindo ou manipulando a verdade histórica. É chegado o momento de não mais sermos engambelados por mitologias pueris ou manipulações de qualquer natureza.
A ideia de “brasileiros de manual” deveria se restringir aos compêndios dos sociólogos como Gilberto Freyre (com a sua ideia de que tivemos uma escravidão branda) ou Sérgio Buarque de Holanda (quando cria a ideia do homem cordial). O brasileiro deveria ser cordial por agir baseado em seu coração, mas nunca no “deixa a vida me levar” ou na lei de Gerson. Pior do que acreditar que somos a pátria de chuteiras e outras baboseiras é acreditar que exista escravidão branda.
Lutamos e continuamos a lutar por um país melhor. Construímos uma nação à custa de muito sangue, sacrifício e guerras civis. Esquecemos com frequência os episódios sangrentos da História pátria com a carnificina de Canudos (1896-1897) ou a Guerra do Contestado (1912-1916), conflito que envolveu cerca de 20 mil camponeses que enfrentaram forças militares dos poderes federal e estadual; essa disputa ganhou o nome de Guerra do Contestado porque os conflitos ocorreram numa área de disputa territorial entre os estados do Paraná e de Santa Catarina.
Tivemos a Cabanada, que se deu em Pernambuco e Alagoas (1832 e 1835); não confundir com a Cabanagem (1832-1835) revolta que aconteceu no Grão-Pará,  que compreendia então os atuais estados de Amazonas, Pará, Amapá, Roraima e Rondônia, e terminou com cerca de 30 mil mortos, mais de 30% da população do Grão-Pará, quando a capital, Belém, foi incendiada. E tome mais. A Balaiada ‘revolta dos balaios' - ocorrida no Maranhão e parte do Piauí, durante o período de 1830 a 1841. A Farroupilha ou Guerra dos Farrapos (1835-1845), do Rio Grande do Sul e para não cansar mais o leitor, a Revolução Constitucionalista de 1932, ou Guerra Paulista, considerada por alguns como o último grande conflito armado ocorrido no Brasil.
Agora não me venham dizer que somos diversos de outros povos. A nossa formação pode ter sido diferente daquela dos outros povos, mais a nossa Nação foi constituída com muita luta e sofrimento.  Chegou a hora de sermos respeitados por nós mesmos.
Chega de o Brasil ser o país do futuro. Tivemos guerras, revoluções, escravatura e estamos maduros para assumirmos o nosso lugar no consenso das nações do globo. Brasileiro não é diferente de nenhum povo. Agir com cordialidade é ser levado pelo coração. É sinal de humanismo.
Petrolão, mensalão e outros desmandos devem ser punidos, sem jamais pensarmos que somos o único país onde ocorre a corrupção. Calma minha gente, temos muitas razões para nos orgulharmos. As crises fazem parte da vida das pessoas e das nações. No mar, em qualquer oceano, há toda qualidade de peixe.
Chega desse complexo de vira-lata.
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE) e da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES).

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