"A seriedade é uma doença,
e o animal mais sério é o burro"
Não
direi que o Poeta dos Cachorros tenha a catilogência de um Saramago, mas
bate-lhe o centro. Se acha que frescamos, confira a lista completa dos romances
que ele lançou pela Couro de Letras (entre 1968 e 2022) e me diga: esse rapaz é
ou não é a reencarnação de Diógenes, o Cínico, filósofo da Grécia Antiga?
Perfeita a simetria entre ambos no quesito viver bem: "Quissuco, a água
que adoça a fome", "A riqueza do liso", "Tão limpo que dá
nojo", "Tanto come como istrói", "Tudo certo, nada
confirmado".
Quanto
aos poemas, repare na 'imbiricica' de obras que lançou no mesmo lapso de tempo:
"Toda criatura tem?", "Se não for eu cegue!",
"Aproveite esse calor e a papeira", "Troque seu marido por um
jipe azul", "Arre égua, meu bem, beísso?", "Defecar e
limpar-se com canjica", "Um caso de amor com a dengue", "À
frente do pessoal detrás", "Um monótico a gurgulejar", "O
Boca de bode", "É, senão for", "Talvez, tal Vaz",
"Uma esfinge no caminho dos pebas" e o impagável "No tempo que
era doido, eu andava lá".
Os
títulos estão disponíveis na casa de um dos filhos dele, acho que é o Antônio,
o do meio. Muito particularmente em relação à poemêutica "No tempo que era
doido eu andava lá", o dos Cachorros Poeta explica o porquê de tê-lo
escrito:
-
Eu tava internado como mental do juízo no Hospital Mira y Lopez nessa era...
Dedé de seu Ném explica
"Jornalista
TMatos, sempre uma alegria bater um plá com vossa senhoria, desta feita para
falar dalgo que você vai pensar: é potoca dele! É verdade, porém. Indo direto à
arrumação, pois tenho já que ir à missa (esse padre é nojento que só!). Conheci
uma norueguesa doutora em 'desenlinhar' punho de rede e mestra numa 'dibuia' de
feijão. Onde? Aqui na Oiticica. Pensei que, saído da Reriutaba, não visse isso
em canto nenhum mais, por hábeis sejam as mãos de nossos e nossas artesãs-sãos.
Lilly Emma era a graça dela.
Lição
que tirei: se Emma é o cão por dentro das moitas no punho duma rede, cá nas
brenhas do sertão cearense, por que um caba nosso não faria sucesso na Noruega,
pegando bacalhau de landuá? Hein? Arre ema!"
"Página de um livro
bom"
Zé
Jumento, assim conhecido pelo coice nos adversários em partidas de futebol
quando rapazote. Zé Jumento pra lá, Zé Jumento pra cá, Zé Jumento prali, Zé
Jumento pracolá... O sujeito assimilou tão fortemente em si o mamífero
perissodáctilo da família Equidae que, em entrevista ao repórter Edilson Cocão
acerca dos seus tempos de tertúlia, ao som de "My mistake", dos
Pholhas, discorreu naturalmente:
-
Pois é, querido Cocaço, essa modinha aí marcou demais a minha 'jumentude'...
Ruim é apelido!
Nairon,
quando canta, é um motor de partida. Consegue o que mais ninguém alcança:
entoar caricaturas de cantigas muito péssimas demais. Fora do esquadro tonal,
parece solfejar na escala musical dum caçote. De tão ruim chega a ser bom. Após
anos sem aceitar o defeito de nascença que trazia nas cordas vocais, resolveu
brincar com a própria voz opaca (de papelão): premiar quem adivinhasse que
música estava a cantar. Cantou trechinho da coisa e um concorrente...
-
"Parabéns pra você"?
-
Não, claro que não! Cantou mais uma coisinha e outro concorrente se atreveu:
-
"Detalhes", do Roberto?
-
Também não!
300
tentativas vãs e os concorrentes pedem penico. Alguém, enfim, pergunta
"que diabo de cão de música mais sem pé nem cabeça é essa"? E Nairon,
sinceramente...
-
Eu sei lá que geringonça é essa! Que é que eu tô cantando? Me deem uma palinha!
Fonte: O POVO, de 20/09/2024. Coluna
“Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.
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