quarta-feira, 13 de junho de 2018

O BANHEIRO DO PAPA



Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
O Banheiro do Papa (El Baño del Papa, 2009) foi um filme uruguaio que assisti, alugado de uma locadora. Lançado no Brasil em 2007, produzido pelos estúdios Laroux Cine/Chaya Films, e dirigido por César Charlone e Enrique Fernández, a película se passa no ano 1998, no povoado de Melo, fronteira entre Brasil e Uruguai.
Aquele burgo está agitado, correm os boatos de que, em breve, o Papa fará uma visita ao vilarejo. Neste sentido, espera-se que milhares de pessoas cheguem à cidade, e a população local se anima, percebendo o futuro evento como uma oportunidade para comercializar comidas, bebidas, bandeirinhas de papel, souvenirs, medalhas comemorativas, entre outros produtos. O protagonista Beto (César Trancoso) é um contrabandista que decide construir um sanitário condigno para a visita do Papa, no qual as pessoas poderão usar durante o evento. Para tanto, empenha todas as suas economias, e se endivida na construção de um banheiro mais requintado, contendo porta, bacia sanitária, descarga e um pedaço de papel higiênico para cada futuro usuário. No entanto, chega a noite, o Papa não vem, e o povoado fica ainda mais miserável e sem esperanças.
Lembrei-me desse filme, ao ler as queixas do Senhor Secretário de Turismo, do Rio de Janeiro, Antonio Pedro Figueiredo de Melo. Ele declarou que, até o fim da semana pós-carnavalesca (2009), foram danificados, por gangues de vândalos, 166 banheiros químicos, de um total de 821 instalados pela Prefeitura. Equipamentos sanitários completamente derrubados, arrasados, destruídos, a maioria sem portas. Creio que a edilidade não respeitou o aspecto psicossocial dos foliões. Carnaval é carnaval, é liberação! Afinal, para que servem as portas? Pergunto: e tudo é permitido no carnaval, mormente neste, em princípio do século XXI?
O povo resolveu a questão, como de hábito, em plantas, postes, fachadas, bueiros e outros locais já consagrados. O problema imediato foi resolvido "a céu aberto". Melhor assim: deu transparência ao povaréu, que nada tem a esconder. Qualquer cantinho serviu para aliviar uma pessoa "apertada". Principalmente agora, em tempos de sambas-enredo e nudez escancarada, o que há de tão grave no fato de o cidadão fazer suas necessidades em plena rua? Quem vai ter vergonha de urinar em banheiros sem portas ou de portas abertas? Viva a liberdade!
No tempo em que eu era estudante de Medicina, um estadista norte-americano comentou: "O problema da América do Sul é a falta de latrinas!" Daí por diante, a estudantada passou a denominar o nosso continente de América 'Latrina'.
Na verdade, a grande maioria do povo brasileiro não tem acesso a um banheiro limpo, em decorrência da falta de saneamento básico. Porém, fazer uso de um banheiro limpo é um direito, mais ou menos, universal. O Secretário de Turismo, Figueiredo de Melo, chegou a uma conclusão distinta daquela proferida pela autoridade norte-americana. Ele declarou, em uma revista de circulação nacional: "Não adianta ter banheiro se não houver educação!" E ponto final!
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE) e da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES). Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Foi um dos primeiros neonatologistas brasileiros.

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