quinta-feira, 16 de agosto de 2018

NOVA CLASSE TRABALHADORA


Por André Haguette (*)
Os governos de Lula e o primeiro mandato de Dilma lograram elevar os rendimentos de miseráveis e de pobres. Não há acordo, no entanto, sobre o número de pessoas beneficiadas e as consequências desse movimento em termos de igualdade social. Se o Bolsa Família aliviou famílias em situação de “extrema pobreza”, as sucessivas majorações em termos reais do salário mínimo e outras políticas conduziram milhões de trabalhadores a atravessar a “linha de pobreza”. Mas o que são “extrema pobreza” e “linha de pobreza” e quantos foram os miseráveis e os pobres favorecidos? 
Em 2009, o governo de Lula fixou a “linha de pobreza” em 1,25 dólar per capita por dia e a “extrema pobreza” em metade disso; logo, quem estivesse abaixo de uma ou outra marca seria considerado pobre ou extremamente pobre. Pessoalmente, sempre considerei vis essas marcas: 4,62 e 2,31 reais a preço de hoje! Há desacordo sobre a quantidade de pessoas nessas situações. Em 2012, o governo apontava uns 17 milhões de pobres no Brasil, ao passo que Waldir Quadros indicava 64 milhões de sorte que André Singer ponderou: “O lulismo por vezes considera que foi muito mais longe na redução do que realmente o fez. O que não significa que a redução da pobreza tenha sido pequena”. A passagem da extrema pobreza para a pobreza e da pobreza para além da linha de pobreza pode ter atingido 25 milhões de indivíduos, o que não é desprezível e provocou mudança na organização da sociedade e no padrão de consumo. 
Mas quem são esses mutantes? Não são operários qualificados; não são uma nova classe média, como queriam Marcelo Neri e a presidente Dilma. Eles formam uma “nova classe trabalhadora” empregados no setor de serviço com baixa remuneração, 95% deles com rendimento de um até 1,5 salário mínimo, como auxiliares de escritórios, balconistas, auxiliares de enfermagens, operadores de “call center”, diaristas domésticos e trabalhos semelhantes que batalham para manter-se acima da linha de pobreza. Jessé Souza afirma que eles se singularizam “pela ausência dos pressupostos para o exercício de atividade produtiva útil no contexto do “capitalismo do conhecimento”. E Ruy Braga vê-los como uma nova classe trabalhadora (o precariado): “uma massa formada por trabalhadores desqualificados e semiqualificados que entram e saem rapidamente do mercado de trabalho”.  
Não surpreende que a atual crise trabalhista (2014-2018) fez minguar a “nova classe trabalhadora” e reconduz milhões de pessoas ao estado de extrema miséria ou de pobreza, com sérios danos para todos nós.
(*) Sociólogo e professor titular da Universidade Federal do Ceará (UFC).
Publicado In: O Povo, Opinião, de 2/7/18. p.217.

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