Mais 'veaca' que as
éguas do Cauípe
Bom – e só presta
se for demorado – é conversar com o amigo Alberto Plutarcho. Aprender cearês
com ele, naturalmente. Enviou-me as expressões abaixo, já incorporadas ao
Dicionário da Fala Cearense que, se Deus quiser, um dia sai. Sai!
Caba veste as calça lá nas guritas! – A calça ‘sungada’,
lá em cima, pegando siri, pegando marreca.
Demorar um pedaço – Demorar um pouco. “O Ceará é um dos
poucos lugares do mundo em que espaço vira tempo”, afirma Alberto.
Esse caba perturba que parece piôi de frinfa (caneco,
fiofó) – Perturba mais que mosquito em impingem de doido.
Eu tô duma forma tal que do fiofó (caneco, frinfa) se
veem os dentes – Numa pindaíba medonha.
Mais ‘veaca’ que as éguas do Cuípe – Na referida
localidade da vizinha cidade praieira (terra de Babá), hoje comida pelo mar,
éguas se embrenhavam no carnaubal fechado de anos atrás e não havia vaqueiro
(ou ‘egueiro’) que as pegasse. Por isso velhacas (‘veacas’), as éguas do
Cauípe.
Não vou me demorar mais nenhum pingo – Tô de saída, e é
já, já! “Desde quando pingo tem a ver com hora, minuto, segundo?”, indaga o
amigo.
Bem se vê que é mentira!
Enviou-me a historinha que segue o escritor de humor
abundante Giovani Oliveira. Em uma apresentação da esquadrilha da fumaça em
Iguatu, um matuto pegado a laço, lá do sítio Cafundó, veio decretado assistir
ao espetáculo. Os aviões rasgavam os céus da cidade e o bicho brabo olhava
atento as acrobacias feitas pelos exímios aviadores. Em dado momento, um avião
vem de bico em direção ao solo e, súbito, o piloto faz manobra espetacular,
ganhando de novo altura, para delírio de todos.
Agora, dois aviões estão no ar prestes a se chocarem; de
repente, os pilotos, mostrando invejável destreza, habilidade e muita astúcia,
evitam a colisão fatal. A galera entusiasmada bate palmas. O matuto, com o
pescoço cansado de tanto olhar pra cima, abaixa a cabeça em sinal de negação e
comenta:
- Eita que mentira medonha!!!
Tricolor mortal
Lucinha,
torcedora doente do Fortaleza, dizia: “Se eu morrer, me enterrem com a camisa
do Tricolor de Aço!!!” Lucinha bateu a caçoleta. Quem a encarregada de
providenciar o enterro? A prima Jarina, Ceará até o fundo das calças. Viviam se
estapeando por causa dos times.
A torcedora do Vovô começou os preparativos da partida da
outra pela pesquisa de preços do esquife. Vendedor fala valores. Muito altos.
Pergunta se a morta “era pessoa querida”. Jarina responde “marrom! Era
alvinegra”. O moço despeja incréu:
- Leve o de R$ 45. Se se arrependerem, a gente troca
semana que entra...
A seguir, o local do enterro. No Cariri do Ceará, X; em
Fortaleza, 5X. De novo o impasse. Jarina, grana curta, ouve resignada a
sugestão do rapaz funéreo:
- Enterrem lá. Dois anos mais tarde, trazemos ela no
fundo duma rede...
Agora é o velório. Estamos na funerária. E o vexame das
torcidas desorganizadas até na morte. Na sala ao lado de Lucinha (com a camisa
do Tricolor), velavam um ricaço (vestido com a do Ceará) dois sujeitos bonitos,
atléticos. Jarina, de olho nos machos, não se contém e se joga no caixão do
morto, cantando despudorada:
- Com teus craques em campo a brilhar, Ceará minha glória
é lutar!
Fonte: O POVO, de 25/11/2017.
Coluna “Aos Vivos”, de Tarcísio Matos. p.8.
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