quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

O CHOFER É A BELEZA DO MUNDO


Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
Etimologicamente, a palavra “chofer” teve origem do francês chauffeur, que significa “operador de máquinas a vapor”. O termo deriva do latim calefare, que quer dizer “aquecer as mãos esfregando-as”. O chauffeur era o trabalhador responsável por operar as máquinas a vapor sendo o encarregado do bom funcionamento das caldeiras. A palavra tratava especificamente das caldeiras (chauffage, em francês), das antigas locomotivas. Era conhecido no Brasil como foguista.
Com o surgir dos primeiros automóveis passou-se a designar as pessoas que conduziam os carros, propelidos inicialmente a vapor e em português afrancesado criou-se o termo chofer. Atualmente, o chofer é a denominação dos motoristas particulares, transportando os seus chefes ou clientes.
Caminhão é veículo automotivo com quatro ou mais rodas para transporte de cargas e os motoristas que dirigem esses veículos, transportando gêneros alimentícios, medicamentos e gases (oxigênio) para os hospitais, etc., são denominados caminhoneiros. Hoje, é indiscutível a importância dos caminhoneiros, que transportam a produção brasileira para os mais recônditos locais do Brasil e para o exterior. 
A maioria das classes trabalhadoras é sindicalizada e conta com o direito inalienável à greve. Como somente 30% dos caminhoneiros são autônomos, a maioria deles é composta por funcionários de firmas transportadoras, o que indica que, na recente greve geral, possa ter havido lock out (uma manifestação de força do empregador no sentido de levar os empregados a aceitar determinação dos donos das empresas— paralisação por ordem dos patrões). Conduta criminosa. Sem falar na infiltração de arruaceiros de todos os naipes.
Passado a fase aguda da greve dos caminhoneiros, creio tenha sido ela uma faceta do povo brasileiro. Relembro: catarse (do grego "kátharsis") é uma palavra utilizada em diversos contextos, assim como tragédia, que significa "purificação", "evacuação" ou "purgação" pelo escancaro da corrupção crônica dos nossos políticos e empresários. 
Esta greve foi só uma catarse de uma fração do povo brasileiro que se manifestou.
Respeito muito a classe dos caminhoneiros que enfrentam as nossas estradas esburacadas e inseguras e ninguém entra em greve por diletantismo.   
A crise nos faz pensar em soluções positivas e não lamentar os erros.
Que vai adiantar prantear que na década de 1960 deu-se a preferência ao transporte por via rodoviária em detrimento das ferrovias e da navegação de cabotagem. Ficar exclusivamente dependente do transporte rodoviário choca a segurança nacional e o povo brasileiro.
As ferrovias deveriam ser um problema de Estado e não de Governo. Não é tão simples assim, recuperar a malha ferroviária nacional, haja vista que estamos com a Transnordestina, iniciada em 2006, parada.
Além do mais, a greve revelou que não existem trilhas para a democracia e para o diálogo, e que nenhuma solução autoritária ou violenta tornará mais bem-sucedida um país ao qual não faltam recursos materiais e psicossociais.
Lembro que crise (do grego krisis) significa: conjuntura socioeconômica problemática, desequilíbrio entre bens de produção e de consumo, normalmente definida pelo aumento dos preços, pelo excesso de desemprego, de falências. Cada crise econômica deve ser transformada em amadurecimento. Essa greve dos caminhoneiros, penso, trará o ensinamento que devemos pensar que o transporte rodoviário não poderá continuar a ser o único ou o mais importante. No Nordeste temos uma canção popular que começa assim: O chofer é a beleza do Mundo...
Existe até um filme com este título e tem mais, música e letra são de Jackson do Pandeiro (1906-1982), cantor e compositor da canção intitulada Xodó do Motorista cuja letra segue abaixo:
Não há quem resista/ Ser motorista sem ter um amor/ Me falte gasolina/Mais não me falte uma menina/ Que eu morro de dor. Eu vou pra todo canto desse meu Brasil/ Ninguém nunca viu eu viajar sozinho/ Eu só viajo no quentinho da minha cabina/ O cheiro de uma menina encurta o meu caminho/ Eu só viajo agarradinho/Ainda hoje eu vou, eu vou falar com ela/ Lá na cancela tenho outra em vista/ Só sei andar com o meu xodó do lado/ Não sou culpado de ser motorista...
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE) e da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES). Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).

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