Por Pe. Eugênio
Pacelli SJ
(*)
Novembro chega como um véu de silêncio
sobre a cidade barulhenta. Para a Igreja Católica, é o mês em que a fé nos
educa a olhar, ao mesmo tempo, para o alto e para dentro. Logo nos primeiros
dias, celebramos o Dia de Todos os Santos (1º) e a Comemoração dos Fiéis
Defuntos, o Dia de Finados (2). São datas irmãs: uma aponta para a meta — a
santidade —, a outra recorda, com ternura, os que caminham para ela e já
atravessaram o umbral da morte.
Historicamente, a festa de Todos os
Santos amadureceu a partir da memória dos mártires, venerados nas catacumbas,
até ser estendida a toda a Igreja no século IX, sob o pontificado de Gregório
IV. Já o Dia de Finados consolidou-se no século XI, com os monges de Cluny,
como exercício de caridade espiritual pelos que se purificam na esperança.
Desde então, novembro tornou-se uma escola de comunhão: entre a Igreja
triunfante, a peregrina e a que aguarda a visão plena de Deus.
Filosoficamente, a morte interroga o
sentido da vida. A experiência cristã não a romantiza, mas a transfigura: “Eu sou a ressurreição
e a vida; quem crê em mim, ainda que morra, viverá” (Jo 11,25). Por
isso, velas acesas, flores e a oração pelos mortos não são ritos de resignação,
e sim gestos de confiança; proclamam que o amor não é devorado pelo tempo. A
saudade, iluminada pela esperança, aprende a dizer “até o encontro”.
Novembro também abre a porta do Advento,
quando a Igreja reaprende a esperar. Preparar o Natal não é decorar vitrines,
mas dilatar o coração: reconciliar-se, cuidar dos que sofrem, retomar a oração,
simplificar a agenda para que Deus encontre lugar. Entre a memória dos que
partiram e a expectativa do Deus que vem, descobre-se um caminho único: viver o
presente com responsabilidade de eternidade.
Que este mês devolva à cidade o seu
silêncio fecundo e às famílias a mansidão das lembranças. Ao lembrarmos nossos
mortos, aprendamos a ser mais vivos: atentos, agradecidos, generosos. E, ao
acender as luzes do presépio, reconheçamos no Menino que chega a mesma promessa
que sustentou nossos santos e consolou nossos lutos: o amor vence a morte, e a
vida, em Deus, não se encerra — floresce.
(*) Sacerdote
jesuíta e mestre em Teologia. Escritor. Diretor do Mosteiro dos Jesuítas de
Baturité e do Polo Santo Inácio. Fundador do Movimento Amare.
Fonte: O Povo, de 15/11/2025.
Opinião. p.20.

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