quinta-feira, 30 de abril de 2020

IDOSOS EM TEMPOS DE COVID-19


Por João Macêdo Coelho Filho (*)
A ocorrência de maior concentração de casos graves e óbitos por Covid-19 em longevos decorre de fatores biológicos, mas também da forma como o idoso e seus problemas são vistos e cuidados pela ciência e pela sociedade.
A maior parte dos idosos apresenta pelo menos uma doença crônica e/ou fragilidade, condições que limitam a reação do organismo frente à doença. Envelhecimento e fragilidade caracterizam-se pelo excesso de substâncias inflamatórias. A inflamação exacerbada é exatamente uma das características da evolução grave de Covid-19. Assim, para se reduzir efetivamente o impacto dessa doença em idosos, além da atenuação do processo inflamatório, seria também necessário intervir nos mecanismos biomoleculares específicos da fragilidade e do envelhecimento. Lamentavelmente, existem muitas lacunas no conhecimento dessas condições.
Uma rede de saúde com diferentes níveis de cuidados é especialmente importante para a atenção aos idosos. A maioria desse grupo etário, por não contar com serviços intermediários entre o hospital e sua residência, como hospital-dia e serviços domiciliários, acaba tendo as UPAs e os hospitais como pontos principais de contato com o sistema de saúde. Em consequência, temos a sobrecarga dessas unidades e o aumento do risco de contaminação pelo coronavírus.
Outra preocupação diz respeito aos mais de 1.000 idosos que no Ceará moram em Instituições de Longa Permanência (ILPIs). Há escasso investimento do poder público nesse setor, predominando as ILPIs filantrópicas. Possuem, em geral, estrutura física limitada, favorecendo o contato próximo entre os residentes, muitos frágeis e portadores de múltiplas doenças. Como as ILPIs são equipamentos da área social, não dispõem habitualmente de profissionais de saúde. Portanto, reúnem, infelizmente, todas as condições favoráveis à transmissão rápida e massiva do coronavírus, com risco de mortalidade em larga escala, caso medidas não sejam prontamente implementadas.
Precisaremos de muitas pesquisas sobre o Sars-CoV-2. Idosos são classicamente excluídos dos ensaios clínicos, por variadas razões. No caso da Covid-19, deixá-los fora das investigações seria especialmente problemático. Estaríamos, desse modo, deixando de conhecer o que ocorre com a doença e seus tratamentos naqueles que são exatamente os mais penalizados por essa pandemia.
(*) Médico geriatra e diretor da Faculdade de Medicina da UFC.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 15/04/2020. Opinião. p.15.

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