Por Carlos Roberto Martins
Rodrigues Sobrinho (Doutor Cabeto) (*)
Um dia, ao assistir a visita da Cardiologia
do Hospital Universitário, me veio uma sensação de que o tempo parou.
As enfermarias do Hospital resgatam uma
época quando ainda era estudante e caminhávamos em busca de aprendizado.
No entanto, atualmente existe de forma
clara, uma diferença, a ausência dos médicos à beira dos leitos!
Se por um lado acontece em respeito à
privacidade, creio que noutro prisma relaciona-se a mudança da atitude ao
cuidar.
Trata-se, evidentemente, de um hábito muito
antigo, que certamente nasceu a caudal do sofrimento humano. As descrições
originais de Hipócrates ao visitar um enfermo grave, em domicílio, são uma
demonstração de como respeitar a crise, o adoecimento: "cumprimente a
família ao adentrar na casa, peça permissão e dirija-se ao enfermo. Em
respeito, debruce -se sobre seu leito. Após examina-lo junte a família para
esclarecer as dúvidas".
Guardo na memória, a espera dos meus
mestres, entre eles, meu pai. Cumpriam um ritual, mas acima de tudo, percebia
em seus semblantes, ternura, compaixão e solidariedade ao sofrimento do
paciente.
A Medicina era mais lenta, com menos
tecnologia, mas nem por isso menos eficiente, já que confortava a alma do
enfermo.
Com o tempo vi nascer outra ciência, a
evolução da biologia molecular, da genética, da patologia clínica e dos
procedimentos diagnósticos e terapêuticos. Quase que ao mesmo tempo assumimos a
dependência dessas metodologias. Muito se avançou, mas também cresceram os
enganos, a iatrogenia. A insatisfação com o médico aumentou
desproporcionalmente.
Num mundo científico mais complexo e
com a insatisfação dos doentes precisamos fazer mais devagar.
Precisamos, sim, de regras de trabalho que
respeitem os princípios da atividade médica.
As decisões, atualmente, são mais difíceis.
Envolvem habilidades milenares como conhecimento técnico, pensamento crítico,
conhecimento humanístico, mas também domínio de línguas, liderança e trabalho
em grupo. Nada disso funciona sem empatia, responsabilidade e capacidade de
trabalho.
E o paciente é o paciente, com suas
angústias, seus medos, suas dúvidas e suas almas.
(*) Médico. Professor da UFC.
Ex-Secretário Estadual de Saúde do Ceará.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 2/11/2024. Opinião. p.19.
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