terça-feira, 17 de dezembro de 2024

A tributação dos super-ricos: por que é importante para o Brasil

Por Alexandre Sobreira Cialdini (*)

A Câmara dos Deputados rejeitou, por 262 votos a 136, a taxação de grandes fortunas na reforma tributária. A proposta previa uma alíquota de 0,5% para patrimônios entre 10 milhões e 40 milhões de reais; 1% para aqueles entre 40 milhões e 80 milhões; e 1,5% para valores acima de 80 milhões. Apesar da rejeição, o tema continuará em debate e já está incorporado na agenda e em pesquisas internacionais sólidas (World Inequality Lab -Laboratório das Desigualdades Mundiais - https://wid.world/wid-world/).

Os argumentos a favor da tributação dos super-ricos são amplos e se baseiam em evidências robustas e na teoria da progressividade fiscal. Nas últimas décadas, o aumento da desigualdade econômica foi impulsionado pela concentração de renda e riqueza no topo da distribuição. A construção de um sistema tributário progressivo que contemple a taxação de grandes fortunas torna-se essencial.

No âmbito internacional, o modelo proposto vem sendo desenhado pela equipe do ministro Fernando Haddad, em parceria com os economistas Esther Duflo, vencedora do prêmio Nobel de Economia, e Gabriel Zucman. Eles trabalham com um padrão mínimo de tributação para indivíduos com patrimônio líquido ultraelevado. 

Desde meados da década de 2010, a cooperação fiscal entre países tem se fortalecido por meio do compartilhamento de informações bancárias e financeiras. Em 2017, cerca de cem países passaram a trocar, de forma automática, dados bancários conforme uma norma comum de relatórios, alinhada às orientações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Em 2021, mais de 130 países concordaram com a implementação de um imposto mínimo de 15% para grandes empresas multinacionais. Embora essas políticas apresentem limitações, elas mostram que novas formas de cooperação internacional, antes consideradas utópicas, podem surgir em um período relativamente curto.

Com base nesses avanços, é possível tornar mais eficaz a tributação dos indivíduos com patrimônio extremamente elevado por meio da colaboração entre os países, visando à criação de um sistema tributário internacional no qual as grandes corporações pagariam uma alíquota de 15%. O plano também exigiria que os multimilionários contribuíssem com, pelo menos, 2% de sua riqueza total todos os anos. Os recursos arrecadados seriam direcionados a um fundo social, com o objetivo de combater as mudanças climáticas, reduzir a pobreza e financiar projetos ambientais.

De acordo com um estudo da Tax Justice Network (Rede de Justiça Fiscal, em tradução livre - https://taxjustice.net/), o Brasil poderia arrecadar R$ 270 bilhões se tributasse os super-ricos com uma alíquota de 1,7% a 3,5%. A pesquisa é baseada no modelo do imposto sobre a riqueza vigente na Espanha, aplicado aos 0,5% mais ricos. Em média, cada país teria um incremento de 7% no orçamento com a taxação de grandes fortunas.

Outro levantamento recente, realizado pelo economista Sérgio Gobetti, revelou que a taxa média de tributação atinge o pico de 14,2% no estrato de renda em torno de R$ 516 mil anuais, mas cai para 13,3% entre aqueles com rendimentos superiores a R$ 1 milhão (grupo que representa os 0,2% mais ricos da sociedade brasileira). Esses dados mostram que a progressividade deixa de existir no topo da pirâmide e que nossa alíquota média é muito baixa quando comparada às economias desenvolvidas e a outros países latino-americanos. ( https://encurtador.com.br/SxYeW).

Esther Duflo enfatiza: "Taxar grandes empresas ou bilionários para ajudar os países pobres a lidar com as mudanças climáticas tem mais de 80% de popularidade. Vai além de direita ou esquerda. É senso comum".

(*) Mestre em Economia e doutor em Administração Pública e Secretário de Finanças e Planejamento do Eusébio-Ceará.

Fonte: O Povo, de 14/11/24. Opinião. p.19.

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