Por Alexandre Sobreira Cialdini (*)
A Câmara dos
Deputados rejeitou, por 262 votos a 136, a taxação de grandes fortunas na
reforma tributária. A proposta previa uma alíquota de 0,5% para patrimônios
entre 10 milhões e 40 milhões de reais; 1% para aqueles entre 40 milhões e 80
milhões; e 1,5% para valores acima de 80 milhões. Apesar da rejeição, o tema
continuará em debate e já está incorporado na agenda e em pesquisas
internacionais sólidas (World Inequality Lab -Laboratório das Desigualdades
Mundiais - https://wid.world/wid-world/).
Os argumentos a
favor da tributação dos super-ricos são amplos e se baseiam em evidências
robustas e na teoria da progressividade fiscal. Nas últimas décadas, o aumento
da desigualdade econômica foi impulsionado pela concentração de renda e riqueza
no topo da distribuição. A construção de um sistema tributário progressivo que
contemple a taxação de grandes fortunas torna-se essencial.
No âmbito
internacional, o modelo proposto vem sendo desenhado pela equipe do ministro Fernando
Haddad, em parceria com os economistas Esther Duflo, vencedora do prêmio Nobel
de Economia, e Gabriel Zucman. Eles trabalham com um padrão mínimo de
tributação para indivíduos com patrimônio líquido ultraelevado.
Desde meados da
década de 2010, a cooperação fiscal entre países tem se fortalecido por meio do
compartilhamento de informações bancárias e financeiras. Em 2017, cerca de cem
países passaram a trocar, de forma automática, dados bancários conforme uma norma
comum de relatórios, alinhada às orientações da Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE). Em 2021, mais de 130 países concordaram com a
implementação de um imposto mínimo de 15% para grandes empresas multinacionais.
Embora essas políticas apresentem limitações, elas mostram que novas formas de
cooperação internacional, antes consideradas utópicas, podem surgir em um
período relativamente curto.
Com base nesses
avanços, é possível tornar mais eficaz a tributação dos indivíduos com
patrimônio extremamente elevado por meio da colaboração entre os países,
visando à criação de um sistema tributário internacional no qual as grandes
corporações pagariam uma alíquota de 15%. O plano também exigiria que os
multimilionários contribuíssem com, pelo menos, 2% de sua riqueza total todos
os anos. Os recursos arrecadados seriam direcionados a um fundo social, com o
objetivo de combater as mudanças climáticas, reduzir a pobreza e financiar
projetos ambientais.
De acordo com um
estudo da Tax Justice Network (Rede de Justiça Fiscal, em tradução livre - https://taxjustice.net/), o
Brasil poderia arrecadar R$ 270 bilhões se tributasse os super-ricos com uma
alíquota de 1,7% a 3,5%. A pesquisa é baseada no modelo do imposto sobre a
riqueza vigente na Espanha, aplicado aos 0,5% mais ricos. Em média, cada país
teria um incremento de 7% no orçamento com a taxação de grandes fortunas.
Outro
levantamento recente, realizado pelo economista Sérgio Gobetti, revelou que a
taxa média de tributação atinge o pico de 14,2% no estrato de renda em torno de
R$ 516 mil anuais, mas cai para 13,3% entre aqueles com rendimentos superiores a
R$ 1 milhão (grupo que representa os 0,2% mais ricos da sociedade brasileira).
Esses dados mostram que a progressividade deixa de existir no topo da pirâmide
e que nossa alíquota média é muito baixa quando comparada às economias
desenvolvidas e a outros países latino-americanos. ( https://encurtador.com.br/SxYeW).
Esther Duflo
enfatiza: "Taxar grandes empresas ou bilionários para ajudar os países
pobres a lidar com as mudanças climáticas tem mais de 80% de popularidade. Vai
além de direita ou esquerda. É senso comum".
(*) Mestre em
Economia e doutor em Administração Pública e Secretário de Finanças e
Planejamento do Eusébio-Ceará.
Fonte: O Povo, de 14/11/24. Opinião. p.19.
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