Se quiser frescar, fresque,
mas... fresque não!!!
Isso
tem já uns 30 e poucos anos. À sombra do pé de jambo da casa da dona Simone,
mãe do saudoso Sardinha, estávamos eu, ele e o aprendiz de violão Zé Caetano. A
gente cantando, tocando, bebericando, bodejando potoca. Esperávamos, ansiosos,
o amigo Hugo Poeta, que viria "dicretado" da Barra do Ceará para
colocar letras em duas músicas compostas pelo genial multi-instrumentista.
-
Bora esperar ele, né, papai? Hugo se esconde longe! - anunciou Sardinha.
-
E vem de ônibus, demora! - reforcei.
-
Seguinte, Zé Caetano, nós vam'aqui no Barnabé pegar umas brahmosas...
-
Deixe comingau!
-
Hugo Poeta apartecendo, faça sala!
Saímos.
Caetano mexia no Di Giorgio que dava sopa quando passa na calçada, vindo justo
da Barra do Ceará, um ex-vizinho de Sardinha, o Enivaldo, que Zé não conhecia
mais magro. Puxa cadeira e se abanca. A música aproxima os dois, enturmados já.
Caetano crente tratar-se, este aqui, do Hugo Poeta tão aguardado. E assim vai
chamá-lo pelo resto do dia. Enivaldo, gaiato, aceita o equívoco pronunciativo.
De
volta com 12 geladas, vemos rolar "a confusão do nome", deixando tudo
acontecer sem bulirmos com o que estava quieto. E são já 17 horas, o povo do
jambo da dona Simone tá melado. O letrista aguardado não deu as caras. Zé
Caetano continua, animado, a chamar Enivaldo de Hugo Poeta. Hora de pegar o
beco. Como Zé estava de carro, Sardinha pede:
-
Caetano, dá uma carona ao... ao... Leve essa mercadoria aí pra casa!
-
Na hura! Na Barra, né, que tu mora?
-
Sim, perto do campo do Ferrim!
Enfim,
a confusão por desfazer. Quase ao descer do carro, nas despedidas, Enivaldo
busca esclarecer o equívoco de Zé Caetano em relação ao seu verdadeiro nome.
-
Querido José, me permita falar a verdade.
-
Tem a permissão, colega das letras!
-
Não sou o Hugo Poeta que você tanto chamou o tempo todo. Meu nome é Enivaldo!
Brabo
por ter sido feito de besta, Zé Caetano dá o troco.
-
Não seja por isso! Feche a porta que eu vou deixar o Hugo Poeta onde encontrei
o Poeta!
E
voltaram os dois pra Parquelândia.
"Só lembranças, só..."
Seu
Gerardo, aposentado há 40 anos, naquela fase de repetir o que o interlocutor
fala. Entabulando conversa com a querida filha Mariinha, contudo, mostra
disposição e privilegiada memória. A pauta: os amigos dele de mocidade. Lembra
de todos e de tudo deles: idades, onde moram, ocupações, esposas, times,
hobbies, fragilidades...
-
Pai, onde anda seu José, aquele bem extrovertido, que serviu com o senhor no
CPOR?
-
Alzheimer!
-
E o esnobe do Pedim?
-
Alzheimer!
-
Paloca?
-
Alzheimer!
-
Josué, o bonitão?
-
Alzheimer!
-
Mundico?
-
Alzheimer!
-
E o senhor, seu Gerardo?
-
Desse eu não me lembro!...
Fonte: O POVO, de 18/10/2024. Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.
Nenhum comentário:
Postar um comentário