Por Heitor
Férrer (*)
Desde criança do interior, sempre sonhei
com o Brasil liderando o mundo. Tinha uma inveja danada quando via as manchetes
dos jornais falarem dos "norte-americanos" como a maior potência do
planeta. Inocentemente, sonhava em sermos chamados de os
"sul-americanos", como sinônimo de hegemonia aqui na América do Sul.
Já se vão mais de 50 anos. Para não ser de um todo pessimista, podemos bater no
peito e gritar que somos o 5º maior país em extensão territorial, a 6ª maior
população do globo, o 7º mercado consumidor da Terra e a 8ª maior economia. Em
ato continuo, baixamos a cabeça e humilhados nos calamos diante da vergonhosa
condição de termos mais de 16 milhões de pessoas nesse riquíssimo Brasil,
morando em favelas, 8% de nossa população, números do Censo 2022. Nesses
aglomerados, 16 milhões de nossos irmãos vivem comendo o pão que o diabo
amassou, sem ter acesso a saneamento básico, saúde, educação e segurança,
enfrentando dia e noite as perversas mazelas da pobreza, onde muitos jovens,
com um futuro pela frente, veem suas vidas interrompidas.
De 2010 a 2022, o Brasil registrou 6 mil
novas favelas e quase 5 milhões de pessoas a mais morando nelas. Andamos para
trás. Todo e qualquer trabalho em cima disso é apenas para resgatar prejuízos
sociais que foram negados ao longo de nossa construção, desde a colonização,
passado pelo império, república velha, república nova. A herança que nos foi
deixada por nossos construtores é uma tragédia nacional e continuamos a
vislumbrar uma herança não menos diferente para nossas futuras gerações. É
culpa dos atuais governantes? Não, mas está no colo deles o "legado"
e cabe a eles a solução.
Com esses dados do IBGE, tenho a petulância
de dizer que o Brasil tem o seu mais novo Estado, o 28º, o 4º mais populoso,
com 16 milhões de almas sofridas, vítimas da omissão do poder público, que
negou a esses o direito à cidadania e à dignidade da justiça social,
deixando-os a mercê da própria sorte, jogando-os no infortúnio da desventura.
Diante de tudo isso, ainda vejo reportagens
e entrevistas de pessoas na televisão falando da força das favelas, de sua
resistência, uma verdadeira enaltação à sua existência. Força tem a Quinta
Avenida, Wall Street, Copacabana, Avenida Paulista, Meireles, Aldeota e tantas
outras. Querer defender a existência de favelas como símbolo de força é não ter
a noção mínima das condições sub-humanas em que esses irmãos brasileiros vivem,
ou melhor, sobrevivem e nenhuma política pública desse país pode ser pensada sem
focar nessa perversa realidade.
(*) Médico
e ex-Deputado estadual (Solidariedade).
Fonte:
Publicado In: O Povo, de 15/11/2024.
Opinião. p.19.
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