Por Patrícia Soares de Sá Cavalcante (*)
Uma reta é a menor distância entre dois
pontos, mas eu prefiro as curvas. Elas são lindas! "Quem sabe, por acaso,
numa delas eu me lembre do meu mundo?"
Voltava de Icapuí em direção a Fortaleza. O
sol estava se pondo, o céu em tons de laranja, com aquela cor deslumbrante do
entardecer. Fui surpreendida por uma revoada.
Lá estavam eles, num voo coordenado, em
perfeita sincronia. Um verdadeiro balé no alto do céu. Sozinha no carro,
ouvindo Amy Winehouse, senti uma alegria tão genuína que, naquele momento, não
desejava dar carona a ninguém. A visão dos pássaros foi efêmera, mas a sensação
daquele voo permaneceu comigo durante todo o percurso. Fortaleza era o meu
destino; a estrada, apesar das curvas, levaria-me de volta à minha cidade.
Comecei a pensar nas curvas como uma metáfora dos caminhos possíveis: múltiplos
e sinuosos, como os cursos dos rios que, mesmo tortuosos, sempre encontram seu
mar. E ali, ao volante, divagando em meus pensamentos, senti-me livre como um
pássaro.
Lembrei-me de que uma revoada é um voo de
retorno: os pássaros regressam ao lugar de onde partiram, como se houvesse uma
memória registrada no céu. Quando eu era pequena, ao voltarmos da praia do
Pacheco, meu avô Hugo se curvava com a delicadeza de quem sabia conversar com
uma criança e, sorrindo, dizia: "De volta à Padre Antônio Tomás." Eu
não fazia a menor ideia do que aquilo significava, não entendia que era o nome
da avenida em que moravam, mas compreendia que ele estava feliz por voltar para
casa.
Os percursos possíveis são inúmeros. No
entanto, eu prefiro as curvas dos caminhos - onde corro o risco de me perder,
mas ganho a chance extraordinária de me encontrar - às retas. De que vale um
trajeto mais rápido, se não me permite enxergar quem eu sou? Que possamos
aproveitar cada passo da jornada, independentemente do destino, e que sempre
tenhamos um porto seguro ao qual retornar, se desejarmos.
E, afinal, qual é o nosso destino? Não
sabemos. O futuro de cada um de nós é incerto, por vezes, imprevisível. Mas,
como diz Guimarães Rosa: "O que tem de ser tem muita força, tem uma força
enorme."
(*) Médica
psiquiatra.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 20/05/2025. Opinião. p.18.