quarta-feira, 19 de novembro de 2025

SEBO DO GERALDO

Por Pedro Salgueiro (*)

A frase marcante da autobiografia "De amor e trevas", do israelense Amós Oz, me remete sempre aos "sebos" de velhos livros: "Quando eu era pequeno, queria ser um livro quando crescesse. Não escritor de livros, livro mesmo. Gente se pode matar como formigas. Escritores também não são tão difíceis de matar.

Mas livros, mesmo se os destruirmos metodicamente, sempre há chance de sobrar algum, nem que seja apenas um exemplar, a continuar sua vida de prateleira, eterna, discreta e silenciosa em uma estante esquecida de alguma biblioteca remota". Sebos que frequentei pela vida inteira; pois os sebos, a despeito de parecerem "cemitérios de livros", ou "museus de livros", são na verdade "maternidade de livros", pois se não nascem nesses ambientes geralmente caóticos, renascem, voltam para a vida.

Já vi amigo escritor dar chilique por ter encontrado livro seu, devidamente autografado, na prateleira de um sebo, o que nunca entendi, porque fico numa felicidade sincera, pois sei que ali ele começará vida nova, eterna feito Sísifo, nesse vai-e-volta contínuo que as obras fazem entre as ditas livrarias e os sebos.

Para fortalecer meu argumento ao vaidoso amigo escrevinhador, sustento que finalmente o livro dele se tornou um "clássico", e que meu próximo lançamento se dará diretamente numa dessas "maternidades de livros", para encurtar o caminho que ele naturalmente fará.

Um desses templos sagrados dedicados aos livros, que frequento há mais de duas décadas, funciona numa casa verde forte na rua 24 de Maio, em pleno Centro de Fortaleza, numa área aparentemente inóspita às "coisas da cultura", de comércios variados, desde bares e restaurantes frequentados por trabalhadores da região a lojas de ventiladores, paradas de ônibus e consertos vários.

Quem entrava na porta larga era recebido pelo sorriso cativante do senhor Geraldo, que acompanhado pela sua fiel escudeira, a cunhada e funcionária Estela, deixava o freguês à vontade para se perder nos muitos corredores entulhados de livros, numa aparente desorganização que assusta; digo aparente porque quem ia (vai) conhecendo descobre que existe uma ótima organização no meio do caos: cada assunto na sua vereda, cada livro na sua estrada, nesse imenso sertão de livros.

Apesar da amizade longa com o proprietário, de já o considerar um amigo próximo, nunca troquei uma palavra sobre livros com ele, que seu Geraldo era de outra natureza, dos homens da vida e que adorava falar sobre a vida; queria vê-lo feliz perguntasse sobre como ele começou essa longa aventura com os livros, ele marejava os olhos contando que "comecei mesmo foi na pedra, os livros poucos e espalhados na calçada, era ali perto dos correios, depois da Praça do Ferreira", daí invariavelmente descambava a falar das coisas que passava na época, onde guardava os parcos exemplares, até conseguir comprar uma banca de revista, onde passou a funcionar.

Nesse tempo todo de rápidas e entrecortadas conversas atrapalhada por fregueses, fiquei sabendo não só dos livros e sua vigem longa da "pedra" até aquela loja grande abarrotada de revistas, discos e principalmente de livros, mas de detalhes de suas sofrida mas gostosa vida de negociante de papel.

Precisaria não de uma crônica, porém de um livro inteiro para falar dessa aventura quixotesca do seu Geraldo, vida simples apesar do êxito (sempre foi o mais lembrado para reportagens e entrevistas sobre o assunto dos jornais e TVs, vez em quando estudantes iam lá para ouvi-lo), tão simples que um dia como hoje, sexta-feira, ele estaria sentado em seu velho birô com uma gaveta cheia de moedas, distribuindo-as para uma fila de velhinhos que desde cedo rondavam sua calçada.

Quando eu chegava, nessa ocasião das sextas, invariavelmente perguntava: "Geraldo, tá bom de aumentar essa cota para 5 reais!", no que ele abria um sorriso largo e respondia: "Tá querendo me quebrar!?", e desatava a contar quando fez essa promessa das moedinhas da sexta-feira.

Não tive coragem de ir ao seu velório e enterro, nem de voltar ao velho sebo da 24 de Maio, mesmo sabendo que só tenho boas lembranças de lá, mesmo sabendo que sua viúva Albaniza, seu filho Janderson e sua cunhada Estela levarão adiante essa aventura sem fim de vender sonhos.

(*) Cronista e articulista de O Povo.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 17/10/25. Vida & Arte, p.2.

terça-feira, 18 de novembro de 2025

PAZ

Por Tales de Sá Cavalcante (*)

Muitas pessoas conseguem, em vida, prover benefícios a outrem. Raras são as que o fazem após a partida. Alfred Nobel está entre estas. Como industrial e inventor sueco, enriqueceu por meio da produção de armamentos e explosivos, inclusive a dinamite. Suas invenções causaram muitas mortes e, talvez por remorso, deixou, para a criação do Prêmio Nobel, quase toda sua fortuna de 31 milhões de coroas suecas - 94% de seu patrimônio.

São 5 prêmios anuais concedidos ao maior benfeitor da humanidade em Física, Química, Fisiologia ou Medicina, Literatura e Paz. Por sua atuação em prol da democracia na Venezuela, a líder da oposição à ditadura de Nicolás Maduro, María Corina Machado, venceu o Nobel da Paz de 2025. Como vive escondida, não sabemos se irá à entrega do prêmio - uma medalha de ouro, um diploma e cerca de R$ 6,6 milhões.

Não há conflito entre a sua luta ser pela democracia e o Nobel ser o da paz. Jørgen Frydnes, presidente do Comitê do Nobel da Paz, afirmou: "O prêmio é uma forma de jogar luz sobre o avanço do autoritarismo (...) nos últimos anos. Viver em um mundo em que há menos democracia e mais regimes autoritários significa que o mundo também está ficando menos seguro. Nós acreditamos que a democracia é uma precondição para a paz. Nossa decisão é baseada apenas no trabalho e no desejo de Alfred Nobel".

A laureada afirmou receber o prêmio em nome do seu povo, "que lutou por sua liberdade com admirável coragem, dignidade, inteligência e amor em 26 anos de violência e humilhação", e dedicou o prêmio aos compatriotas, que muito merecem, e também a Trump, talvez pelo seu estilo ameaçador, útil à queda de Maduro. Ressalte-se, no entanto, que o líder dos EUA está longe de merecer o Nobel da Paz, um prêmio que deve ser dado à índole e não ao interesse.

A ação de muitos diante do poder e da política levou o genial Millôr Fernandesa criar a citação que se segue: "Democracia é quando eu mando em você, ditadura é quando você manda em mim". María Corina Machado sabe a real diferença entre os dois regimes. Por isso, hoje, o Nobel lhe veio, e talvez, no futuro, nos venha a paz.

(*) Reitor do FB UNI e Dir. Superintendente da Org. Educ. Farias Brito. Presidente da Academia Cearense de Letras.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 16/10/25. Opinião, p.14.

OS MÉDICOS MERECEM RESPEITO

Por Heitor Férrer (*)

Quando uma categoria conquista, após anos de luta sindical, a implantação de um Plano de Cargos, Carreiras e Salários (PCCS), o que se consagra não é um privilégio, mas o reconhecimento do Estado pelos serviços prestados por esses servidores. O PCCS é uma forma de valorização profissional, um instrumento de justiça que garante progressão e dignidade na função.

Assim, ocorreu em 2008, quando o Sindicato dos Médicos do Estado do Ceará travou uma batalha histórica e obteve, no governo Cid Gomes, um novo plano de cargos e carreiras, aprovado pela Assembleia Legislativa em novembro daquele ano. A lei, claríssima. Estabelece os critérios de ascensão profissional e prevê sua vigência imediata a partir da publicação.

Logo após a sua aprovação, o governador Cid cumpriu parcialmente o que determinava a lei, e deu os avanços apenas em 2009, 2010 e 2011. A partir daí, simplesmente o governador suspendeu os avanços nos anos seguintes. Jogou a lei no lixo! Ao deixar o cargo, os médicos já acumulavam prejuízos irreparáveis.

Com a chegada do governador Camilo Santana, esperava-se a correção dessa injustiça, mas, para frustração dos médicos, persistiu o descumprimento da lei durante todo o seu governo. Somente no segundo mandato, num esforço hercúleo do então secretário da Saúde, Dr. Cabeto, foi encaminhado à Assembleia projeto para descomprimir o plano de cargos de 2011 a 2019, quase 10 anos de atraso, sem o Estado pagar nada do retroativo da lei ignorada, permanecendo a dívida até hoje.

Em 2023, com a chegada do governador Elmano de Freitas, os médicos já tinham os seus avanços atrasados de 2019 a 2022. Mais quatro anos de prejuízo. Já com quase três anos de governo Elmano, permanecem o descaso, o desrespeito à lei, o deboche. Nenhum avanço foi concedido. Seis anos de perdas.

Essa postura configura não apenas um desrespeito com os servidores médicos, mas também uma afronta à Assembleia Legislativa, que aprovou o plano de cargos em reconhecimento, valorização e respeito a esses profissionais. Como aceitar que uma lei aprovada, publicada e vigente continue sendo descaradamente ignorada pelo governador?

Desde o início do atual governo, o Sindicato dos Médicos tenta negociar uma solução, mas tem sido a inércia e a má vontade a resposta do governo em cumprir o que é obrigação legal.

A lei existe para ser cumprida e o Estado tem o dever de dar o bom exemplo. Ignorá-la é ferir o princípio da legalidade e trair a confiança de quem dedica toda a sua vida a cuidar da saúde dos cearenses.

O governador não pode continuar sendo um "fora da lei", descumprindo legislação aprovada para fazer justiça e reconhecer o valor desses abnegados servidores. Os médicos merecem respeito...

(*) Médico e deputado estadual (Solidariedade).

Fonte: Publicado In: O Povo, de 17/10/2025. Opinião. p.19.

segunda-feira, 17 de novembro de 2025

Vida e morte engarrafada

Por Romeu Duarte Junior (*)

Está aberta a temporada de extermínio dos papudinhos e dos biriteiros. O papagaio de pirata imaginário que vive aboletado no meu ombro esquerdo, curioso que só, me pergunta qual a diferença entre os dois tipos de pinguços. Respondo-lhe que o papudinho é aquele que vive para beber enquanto o biriteiro bebe para viver por ter uma relação hedonista com a vida. Insistente, o bicho me pergunta a qual categoria pertenço. Mando-o caçar o que fazer. Trato o assunto na base do aniquilamento dos bebedores pelo fato de sempre ter havido bebida falsificada à farta, porém nunca ao ponto de levar a óbito aqueles chegados aos destilados. Algo assim deve ser considerado homicídio doloso, cometido por quem tem a intenção de matar. Seria raiva de quem molha o bico?

O clima anda meio complicado no ecossistema (argh!) dos bares fortalezenses. Dia desses, um vereador com um nome esquisito (e que não se perca por este) e daquele tipo que ninguém sabe como chegou à Câmara, resolveu anunciar a morte do Seu Raimundo do Queijo. Comoção geral na cidade. Meu celular quase pegou fogo de tanta chamada que recebeu. Equívoco desfeito, baixou o espírito galhofeiro do Bode Ioiô propondo a festa da ressurreição daquele que nunca morreu, agora monumento vivo. Pense num regabofe, uma real manifestação de carinho e apreço do povo de Fort City pelo nosso querido taberneiro. Uma penca de políticos esteve presente aproveitando o ensejo para tirar foto com o dono do pedaço, entre eles o tal edil, que, além de um duro carão, levou uma bela vaia...

Todavia, nem tudo por aqui é metanol misturado à água que passarinho não bebe. Há alguns dias, o Paraíba, proprietário do bar homônimo, inteirou cem janeiros com uma grande comemoração. Aquele que talvez seja o botequim-raiz mais antigo ainda em operação em Fortaleza (em disputa renhida com o Bar Vitória, no Centro) acha-se à Rua Dom Jerônimo, 256, no Benfica, artéria esta em cuja extremidade sul encontra-se o vetusto Solar dos Monte, lar do escritor e amigo Aírton Monte, o eterno ocupante deste espaço de crônica. Mas, voltando ao Paraíba, o cabra é invocado, faz o que quer e bem entende. A cachaça vem acompanhada de uma cumbuca com um supimpa feijão gordo. O cliente elogia a iguaria e pede mais. Não há força divina que faça o bodegueiro trazer o pedido.

Como já começa a nevar, as renas voam pelos ares e as crianças fazem bonecos de neve nas calçadas, é hora de nos prepararmos para as festividades de fim de ano. O Bar do Seu Nonato, na heráldica Gentilândia, completará 65 primaveras de contínua existência e resistência etílica neste dezembro. O estabelecimento é daqueles dotados de balcão feito para criar calo nos resilientes cotovelos dos frequentadores. A cultura lá é a da arenga mútua entre a turma do funil e o gentil (às vezes, nem tanto) gerente da taberna, com chistes impagáveis, tiradas espirituosas e piadas grossas, tudo o que caracteriza uma baiuca de escol. Por falar nisso, escrevendo no sábado, já me organizo para pousar no Bar do Vicente e na Embaixada. Sem essa de wine-bars, gastrobars e rooftops, caros meirelers.

(*) Arquiteto e professor da UFC. Sócio do Instituto do Ceará. Colunista de O Povo.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 13/10/25. Vida & Arte. p.2.

ECONOFÍSICA: um modelo para aplicação no desenvolvimento regional

Por Alexandre Sobreira Cialdini (*)

A Econofísica é um campo de pesquisa dinâmico que faz a interface entre a física e a economia, no qual técnicas analíticas e computacionais da física são empregadas para estudar as propriedades dos sistemas econômicos.

O rigor, a precisão e o prestígio da física sempre exerceram grande fascínio sobre nós, economistas. O físico Isaac Newton, por exemplo, criou o modelo gravitacional que influenciou o modelo de comércio gravitacional, o qual prevê naturalmente o comércio entre parceiros, utilizando uma interpretação metafórica da lei universal de Newton - aplicada a países, regiões ou empresas.

Esse modelo foi desenvolvido em 1962, quando o físico e economista Jan Tinbergen, vencedor do primeiro Prêmio Nobel de Economia em 1969, propôs um estudo econométrico sobre o padrão que prevaleceria nas relações entre países sem barreiras comerciais. Segundo ele, “os fluxos de comércio estão diretamente relacionados com a dimensão econômica dos países envolvidos e inversamente proporcional à distância entre eles”.

Tinbergen identificou os países mais afetados por medidas protecionistas, confrontando os resultados com o modelo gravitacional de Newton, segundo o qual “cada partícula do universo atrai todas as outras com uma força (F) diretamente proporcional (k) ao produto de suas massas (m1 e m2) e inversamente proporcional ao quadrado da distância (r).

A adaptação dessa lei ao comércio internacional sugere que o volume de trocas é diretamente proporcional ao Produto Interno Bruto (PIB) -- as “massas” dos países – e inversamente proporcional à distância entre eles. Assim, grandes economias tendem a comercializar mais entre si.

A distância, por sua vez, funciona como um obstáculo: quanto maior, menor tende a ser o comércio, já que custos de transporte e fatores logísticos influenciam negativamente os fluxos.

Nesse contexto, eu e o pesquisador Raimundo Costa (físico), em parceria com outros estudiosos, estamos desenvolvendo um modelo para analisar os efeitos do quadripé Transnordestina–Porto Seco--ZPE–Porto do Pecém, com base na organização dos Arranjos Produtivos Locais (APLs) em seis dimensões: a) territorial; b) diversidade de atividades e de atores econômicos, políticos e sociais; c) conhecimento tácito; d) inovação e aprendizado interativo; e) governança; e f) grau de enraizamento.

Os estudos preliminares estimam que esse complexo multimodal envolverá investimentos de R$ 1,75 bilhão em dez anos, com retorno de R$ 7,2 bilhões no mesmo período. Em apenas quatro anos, espera-se uma profunda transformação no PIB do Estado e da região, com efeitos diretos em 28 municípios.

O modelo gravitacional em desenvolvimento demonstra que os fluxos comerciais crescem quando os custos de transporte diminuem e quando há grandes economias interconectadas. Os portos secos atuam exatamente nesses dois aspectos, ampliando fluxos e fortalecendo a rede de comércio regional.

(*) Mestre em Economia e doutor em Administração Pública e Secretário de Finanças e Planejamento do Eusébio-Ceará.

Fonte: O Povo, de 16/10/25. Opinião. p.15.

domingo, 16 de novembro de 2025

Causo Médico: MÚLTIPLO USO DAS DST NA MEDICINA

Conta-se que, na Faculdade de Medicina da UFC, no limiar dos anos setenta do século XX, um acadêmico fez uma revisão bibliográfica sobre as chamadas “Doenças Sexualmente Transmissíveis” (DST), a fim de servir como tarefa para a Nota de Trabalho Individual (NTI) da Disciplina de Medicina Social, ministrada no segundo ano do curso, obtendo com ela um bom conceito nessa avaliação.

Contente com o resultado, e ciente da potencialidade do tema, comum a diferentes matérias, o aluno aproveitou a sua revisão, com a devida substituição da capa, para servir de NTI, de semestre a semestre, até ingressar no Internato, nas diversas disciplinas, como: Bioagentes Patogênicos, Iniciação ao Exame Clínico, Clínica Médica, Doenças Infecciosas, Dermatologia, Ginecologia, Urologia etc. Em alguns casos, no entanto, foi necessário fazer alguns cortes do trabalho original, ajustando-o ao escopo da disciplina da vez.

É bem verdade que o assunto tratado faz interfaces com diversos campos ou especialidades médicas, mas a esperteza nunca foi descoberta, porquanto, à época, as turmas já eram numerosas, repletas de alunos transferidos, o que demandava esforços tremendos da Coordenação do Curso, para oferecer matrículas e créditos suficientes a tantos discentes.

Além disso, não havia diálogo dos regentes das disciplinas vinculadas a distintos departamentos acadêmicos, e nenhum colega quis “entregar” o sabido.

Desconhece-se, hoje, se esse médico tenha também abraçado a Venereologia, como campo de atuação profissional.

Marcelo Gurgel Carlos da Silva

Da Sobrames/CE e da Academia Cearense de Médicos Escritores

Fonte: SILVA, Marcelo Gurgel Carlos da. Medicina, meu humor! Contando causos médicos. 2.ed. Fortaleza: Edição do Autor, 2022. 144p. p.65.

* Republicado In: AMC. Causo médico: múltiplo uso das DST na medicina. Revista AMC (Associação Médica Cearense). Fevereiro de 2024 - Edição n.30, p. 35-35 (online).

Mistérios históricos que não têm explicação (ainda) IV

6. As inscrições do Vale do Indo

As escritas do Indo (também conhecido como escrita Harappan) é um modelo de comunicação escrita desenvolvido pela Civilização do Vale do Indo - uma das primeiras civilizações urbanas da história humana.

Acredita-se que a civilização tenha florescido de cerca de 2600 a.C a 1900 a.C. No entanto, seu sistema de escrita permanece indecifrável. Os linguistas não podem concordar com o tipo de linguagem usada nas inscrições. Até agora, não parece ter nenhuma conexão com outros idiomas usados nas áreas vizinhas, bem como com a Índia e o Paquistão. Cerca de 400 sinais foram identificados nos registros, fazendo os pesquisadores acreditarem que grande parte dele foi escrito em materiais perecíveis, como folhas de palmeira ou bétula.

Mas ainda não sabemos nada conclusivo sobre o que dizem, e esta é a razão pela qual a Civilização do Vale do Indo continua sendo uma das civilizações antigas mais misteriosas.

7. Peste Dançante de 1518

Em 14 de julho de 1518, uma mulher chamada Frau Troffea saiu de sua casa na cidade francesa de Estrasburgo (então parte do Sacro Império Romano) e de repente começou a dançar. Uma grande multidão logo se reuniu ao redor dela, curiosa para ver o que estava acontecendo. A mulher parecia incapaz de parar e não tinha controle sobre suas ações.

Ela continuou dançando até desmaiar de exaustão, mas logo retomou a atividade frenética. Isso durou alguns dias e, surpreendentemente, mais de 30 outras pessoas começaram a dançar da mesma forma em toda a cidade em uma semana. No final do mês, quase 400 pessoas dançavam nas ruas da cidade e seguiam em frente mesmo com os pés sangrando. Vários deles morreram de seus esforços, e ninguém na cidade sabia como detê-los. O frenesi da dança começou a diminuir apenas no início de setembro.

Os líderes cívicos e religiosos declararam que as pessoas sofriam da 'mania da dança' ou 'praga da dança'. Por mais estranho que isso possa parecer para nós hoje, essa mania da dança não foi uma ocorrência única. Crônicas dos séculos 14 a 16 estão cheias de relatos alegando vários surtos semelhantes na Europa. Um surto de dança semelhante em 1374 se espalhou para várias cidades ao longo do rio Reno.

Mas qual foi a razão por trás da praga da dança? Os cientistas ainda estão intrigados com esse mistério meio milênio depois. Inicialmente, acreditava-se que as pessoas dançavam para atrair o favor divino. No século 20, os investigadores disseram que as pessoas da cidade podem ter consumido pão contaminado com a doença fúngica ergot, o que pode levar a convulsões. A teoria mais popular é que a cidade foi afetada por um distúrbio psicogênico em massa. No entanto, nenhuma evidência conclusiva do incidente bizarro foi encontrada.

Fonte: Disponível na home page “Tudoporemail”.

Mistérios históricos que não têm explicação (ainda) III

4. Onde está a Arca da Aliança?

A Arca da Aliança era um baú feito de ouro puro contendo as tábuas com os Dez Mandamentos. Acreditava-se que fosse mantida no Primeiro Templo - um edifício usado pelo povo judeu para adorar a Deus - em Jerusalém. A Arca é mencionada várias vezes na Bíblia, e o Livro do Êxodo diz que Deus havia instruído Moisés a construí-la durante sua estadia no Monte Sinai.

Em 587 a.C., um exército babilônico sob o comando do rei Nabucodonosor II atacou Jerusalém e destruiu o templo. O destino da Arca não é claro. Algumas fontes sugerem que ela pode ter sido levada de volta para a Babilônia ou escondida antes de Jerusalém ser atacada.

Curiosamente, a Igreja de Nossa Senhora Maria de Sião afirma que a Arca permanece em sua posse. Infelizmente, ninguém sabe ao certo o que aconteceu com ela.

5. As últimas palavras de Einstein

O genial físico alemão Albert Einstein, famoso por elaborar sua teoria da relatividade, faleceu em 18 de abril de 1955, aos 76 anos. A causa de sua morte foi a ruptura de um aneurisma da aorta abdominal. Einstein recusou o tratamento, dizendo: “Quero ir quando quiser. É insípido prolongar a vida artificialmente. Eu fiz minha parte, é hora de ir. Farei isso com elegância.”

No entanto, as últimas palavras do grande homem permanecerão para sempre desconhecidas porque foram ditas em seu alemão nativo a uma enfermeira que não entendia o idioma. A enfermeira disse que ouviu Einstein murmurando algo momentos antes de dar seu último suspiro, mas não sabia exatamente o que ele disse. Talvez fosse uma frase profunda, ou talvez ele estivesse dando seu último adeus ao mundo. Nunca saberemos, infelizmente.

Fonte: Disponível na home page “Tudoporemail”.

sábado, 15 de novembro de 2025

Mistérios históricos que não têm explicação (ainda) II

2. Para onde foi a colônia de Roanoke?

A ilha de Roanoke, situada na costa da atual Carolina do Norte, EUA, foi fundada em 1585 por um grupo de colonos da Inglaterra liderados por John White. White, que se tornou o governador do novo assentamento, partiu para a Inglaterra dois anos depois para obter mais suprimentos, deixando para trás sua esposa, filha, genro e neta. Acredita-se que a neta de White, Virginia Dare, seja a primeira criança filha de ingleses nascida nas Américas. Quando White voltou para a ilha em 1590, ficou chocado ao descobrir que toda a colônia havia desaparecido. Tudo o que ele encontrou foi uma única palavra esculpida em uma árvore - "CROATOAN". Etnólogos e antropólogos acreditam que a palavra pode ser uma amálgama de duas palavras algonquinas que significam "cidade da conversa" ou "cidade do conselho". Nos séculos seguintes, várias teorias tentaram explicar o desaparecimento da colônia de Roanoke. O mais popular sugere que as pessoas do assentamento se mudaram para uma ilha próxima. Outros dizem que fugiram. Mas ninguém sabe ao certo o que aconteceu com a colônia e, talvez, ninguém jamais saberá.

3. A verdadeira identidade de Jack, o Estripador

Quem foi Jack, o Estripador? Essa pergunta foi feita inúmeras vezes por mais de um século, mas ainda não sabemos a verdadeira identidade desse serial killer vitoriano. Em 1888, pelo menos cinco mulheres foram brutalmente assassinadas no East End de Londres, Inglaterra.

Cartas foram então enviadas à polícia, confessando os crimes e assinadas “Jack, o Estripador”. Se alguma delas foi escrita pelo verdadeiro assassino permanece uma questão de debate, mas Jack, o Estripador, se tornou um dos serial killers mais anônimos e ameaçadores da história.

O verdadeiro assassino nunca foi encontrado, e a maioria dos arquivos policiais relacionados à investigação foi destruída durante a Segunda Guerra Mundial. É quase certo agora que a verdadeira identidade do Estripador nunca será conhecida.

Fonte: Disponível na home page “Tudoporemail”.


Mistérios históricos que não têm explicação (ainda) I

Nosso mundo está cheio de curiosidades e mistérios que continuam nos intrigando. Existem alguns mistérios históricos, em particular, pelos quais os humanos são infinitamente fascinados. Por exemplo, ainda não sabemos a localização da tumba de Cleópatra, e o propósito de Stonehenge também permanece um mistério. Há muitos outros eventos históricos bizarros que não têm explicação, e as chances são de que nunca encontremos uma.

Aqui reunimos alguns Sete dos maiores quebra-cabeças não resolvidos da história. A falta de respostas torna esses enigmas ainda mais fascinantes.

1. O que aconteceu com Edgar Allan Poe?

Edgar Allan Poe foi um famoso escritor americano que morreu aos 40 anos em 1849 sob circunstâncias misteriosas. Poucos dias antes de sua morte, Poe foi visto deitado em uma sarjeta perto de uma taverna em Baltimore, Maryland, delirando e vestido com roupas surradas de segunda mão. Poe foi levado para um hospital onde não foi capaz de explicar o que aconteceu com ele enquanto ele ficava inconsciente nos próximos dias. Ele faleceu na manhã de 7 de outubro de 1849. J.E. Snodgrass, médico e amigo de Poe, o visitou no hospital, mas não conseguiu reconhecer o autor. Ele disse que Poe provavelmente morreu de complicações causadas pelo alcoolismo. Outras teorias sugerem que seu nível de açúcar no sangue estava muito baixo e alguns dizem que ele estava sob a influência de drogas. Curiosamente, porém, não há registros sobre a causa da morte de Poe.

Algumas pessoas chegaram a acreditar que o autor poderia ter sido vítima de um crime. Infelizmente, ninguém investigou o mistério da morte de Edgar Allan Poe, e é improvável que tenhamos uma resposta definitiva sobre o que exatamente causou o fim repentino do mestre do mistério.

Fonte: Disponível na home page “Tudoporemail”.

sexta-feira, 14 de novembro de 2025

ROBERTO MACÊDO: um cidadão completo

Por Ricardo Cavalcante (*)

Há pessoas que dignificam o tempo em que vivem. Roberto Macêdo foi uma delas. Um homem que uniu a lucidez do empreendedor à serenidade do cidadão, e que fez da vida um exercício constante de coerência entre o que acreditava e o que realizava.

Empresário exemplar, soube conduzir a J. Macêdo com a firmeza de quem entende o trabalho como vocação e a responsabilidade como virtude. Desde cedo, aprendeu com o pai, José Macêdo, que o sucesso verdadeiro nasce da honestidade no trato, da palavra cumprida e do compromisso com a comunidade. Fez da empresa uma extensão dos seus valores, transformando o fazer econômico em compromisso social. Para ele, produzir significava servir, e servir bem.

Na Fiec, sua marca foi a de um líder que moderniza sem alarde e transforma sem se impor. Deu à instituição agilidade e clareza de propósitos, implantando uma cultura de ética, transparência e respeito às pessoas. Com serenidade e método, mostrou que a autoridade verdadeira nasce da confiança e do exemplo.

Roberto Macêdo tinha uma elegância que vinha de dentro. Falava pouco, ouvia muito, decidia com ponderação. No trato pessoal, havia nele uma delicadeza natural, dessas que não se aprendem em bancos escolares ou livros. Era a expressão de uma humanidade rara, atenta, generosa.

No convívio familiar, encontrava seu refúgio e sua alegria. Ao lado de sua amada Tânia, construiu uma história de afeto e solidez. Com os filhos e netos, cultivou o amor que se estende, como herança invisível, para além do nome e das empresas.

Mais do que um grande empresário, Roberto foi um homem de consciência cívica, de valores inegociáveis e de fé nas pessoas. Viveu a cidadania em sua forma mais completa, como quem entende que servir à comunidade, respeitar o outro e agir com integridade são os mais altos deveres de um ser humano.

(*) Empresário. Presidente da FIEC.

Fonte: O Povo, de 13/11/25. Economia. Opinião. p.13.

FOLCLORE POLÍTICO: Porandubas 851

A coluna, hoje, é uma colcha de retalhos com situações vividas em minha vida profissional. Registro momentos hilários de tempos idos.

Franco Montoro

No universo político, que frequento desde os idos de 1980, são muitas as passagens interessantes. Pinço, aqui, uma historinha que envolve o saudoso ex-governador, ex-senador e paladino de nossa democracia, Franco Montoro.

E o Agrário?

Depois de deixar a esfera governativa e parlamentar, Franco Montoro passou a se dedicar ao Instituto Latino-Americano - ILAM. Na condição de presidente desta entidade, foi a um almoço que organizei com um pequeno grupo de professores da USP no restaurante do campus. O ex-governador, como se sabe, registrava passagens de dislexia, momentos em que confundia nomes, alhos com bugalhos, motivando risos em cerimônias. A conversa fluía bem, versando sobre os mais diferentes problemas do país. A certa altura, ele se surpreendeu ao saber que este escriba era potiguar e parente de queridos amigos dele e de dona Lucy Montoro. De repente, lá vem a pergunta:

- Gaudêncio, como está o Agrário?

- Agrário, Agrário? Não sei quem é, governador.

Passo a lupa na mente e lamento ignorar a identidade da figura. Mudamos de assunto. Mas o Agrário continuava a me coçar a cabeça. De repente, Eureka! Agrário? Não seria o Urbano? Indago:

- Governador, voltando ao Agrário, será que o senhor não confundiu o Agrário com o Urbano?

- Ah, sim, é claro, é claro. Desculpe. Como vai o Urbano?

Francisco Urbano era presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG. Um potiguar muito conhecido nos universos sindicalista e político. A dislexia havia intercambiado o espaço rural com a geografia urbana. Franco Montoro, exemplo de honradez, dignidade, seriedade, civismo, independência. Faz muita falta nesses tempos de lamaçal político.

Ramez Tebet - O besourão

A historinha me foi contada pelo ex-senador Ramez Tebet, saudoso amigo. Por ocasião da criação do Estado do MS, em 1979, a população de Campo Grande ficava assombrada com a caravana dos 17 grandes carrões pretos dos deputados estaduais que paravam diante da Assembleia Legislativa. Os carros ganharam logo o nome de "besourão" e, ao passarem pelas ruas, as pessoas logo faziam o sinal da cruz, na tentativa de afastar o medo daqueles carros que mais pareciam transporte de defunto.

Tebet na direção

Ninguém se atrevia a andar num carro daqueles. Até que um dia, ao comparecer ao velório de um correligionário, numa cidade do interior, dirigindo um desses carros, o então deputado Ramez Tebet teve que atender ao pedido da família do defunto. Queriam que o defunto fosse transportado naquele carro. Nessa hora, não dá para negar. E lá se vai o deputado carregando o caixão de defunto em seu "besourão". A história se espalhou por todo o Estado. Assim a fama negativa do carrão preto foi dissipada. O "besourão" passou a ser visto com outros olhos. A boa fama só veio, por incrível que pareça, depois de Ramez ter conduzido um defunto.

Roberto Campos

Roberto Campos era ministro do Planejamento do governo Castelo Branco. Chegando em Recife, deu uma entrevista coletiva na sede da Sudene, na avenida Dantas Barreto. Na época, os recursos que vinham para o Nordeste eram minguados. E distribuídos como migalhas aos Estados. Ainda foca (iniciante no jornalismo, como repórter do Jornal do Brasil), fui para a entrevista. Após abrangente explanação sobre os programas da administração Federal para o Nordeste, tive a ousadia de fazer a primeira pergunta:

- Ministro, o senhor não acha que a pulverização de verbas para a região nordestina não acaba sendo perniciosa? Não seria mais eficaz um programa com prioridades e aplicação de recursos?

Campos, ex-seminarista como eu, devolve a pergunta:

- O que o jovem entende por pulverização?

Embasbacado, sem esperar pela contra pergunta, tentei responder, lembrando a fragmentação de verbas; quase me engasguei. Campos era um mestre na arte de argumentar.

Tasso Jereissati

Cheguei em Fortaleza para ajudar na campanha de Tasso em 24 de junho de 1986, noite de São João. O candidato fora convidado pelo deputado estadual do MDB, Barros Pinho, para uma festa junina em um bairro popular da capital. Seria sua primeira experiência no meio do povo. Sua tarefa: presidir um júri para julgamento de fantasias juninas.

Um peixe fora d'água

Ficou completamente deslocado, um peixe fora d'água. Chega ao ambiente e sob conselho deste escriba, vai, de mesa em mesa, apresentando-se aos presentes. Começa a presidir o evento. Encabulado, não sabe o que fazer. Enrola-se. Grande dificuldade de comunicação. Um desastre. Só era conhecido no bairro de classe média alta, Aldeota. Tinha menos de 2% de intenção de voto. Depois do evento, angustiado, ele, Sérgio Machado, na época seu braço direito, e este escriba dirigem-se a um restaurante na praia para degustar uma lagosta. Sob o efeito de um uísque tranquilizante, Tasso desabafa: "desisto, amigos; se política for isso, assistir a batizado, casamento, velório, desfile infantil em festa junina, não contem comigo. Tô fora". Transtornado. Insatisfeito. No Hotel Esplanada, numa máquina Lettera 22, no dia seguinte, esbocei o planejamento de sua campanha. Fui à Brasília para a MPM produzir os canais de propaganda, a partir do briefing que fiz. Esperei pelo trabalho. Volto à Fortaleza para apresentar o material. O moderno contra o arcaico. O novo contra os coronéis. Tasso gostou da ideia, mas não dos layouts da MPM. A agência Propeg, de Fernando Barros e Rodrigo Menezes, instalada na Bahia, iria produzir a papelada da campanha. Geraldo Walter foi convidado a comandar. Tasso deu um banho nos três coronéis que comandavam a política cearense: Virgílio Távora, César Cals e Adauto Bezerra.

Alberto Silva

Alberto Silva dizia que a alma piauiense sofria de complexo de inferioridade. Na Sudene, em Recife, ouvi uma interpretação do então governador do MDB. Contou ele:

- Um interlocutor pergunta a outro - O senhor é de onde?

Resposta atravessada: sou do Piauí e daí? E já mostrava os punhos fechados para esmurrar o outro.

Michel Temer

Em 1986, fui convidado para fazer uma exposição sobre marketing político, com foco na eleição de deputados. O grupo que me convidou começava a organizar a campanha do professor renomado, ex-procurador do Estado de São Paulo, autor de livros consagrados de Direito Constitucional: Michel Temer. A palestra ocorreu em um prédio da av. Paulista, onde Michel tinha um escritório juntamente com outros afamados nomes da advocacia, como o prof. Celso Antônio Bandeira de Melo, o advogado especialista em Direito Eleitoral, Antônio Carlos Mendes. O grupo contava ainda com a participação do renomado professor de Direito, Ataliba Nogueira. Fiz a palestra para um grupo de 30 pessoas. Um participativo debate sobre os desafios a serem enfrentados pelo então candidato a deputado Federal. A partir da palestra, passei a prestar consultoria ao professor.

Bastidores

Michel Temer foi três vezes presidente da Câmara, credenciando-se como um dos mais respeitados articuladores da política e nome respeitado pelos pares. Como presidente da República, em pouco tempo, conseguiu implantar uma agenda avançada, desenvolvimentista. Dei conselhos, fui ouvido e ouvi muito. Há episódios que não posso deixar de lembrar.

Lula

Lula nunca foi próximo a Michel. Mantinham uma relação protocolar. Certa vez, os dois subiram ao palanque, em Natal/RN, para um comício de apoio à candidata Fátima Bezerra (PT) ao governo do Estado. Fátima não ganhou naquele ano, mas hoje é governadora em segundo mandato. Viajaram juntos de volta a São Paulo. Foi uma viagem, por assim dizer, de confraternização.

Papo amigável

O papo foi de aproximação, de expressões de respeito mútuo. Michel: "eu sei, presidente, que falam mal de mim para o senhor, sei que o senhor tem restrições a minha pessoa" ... patati-patatá ... Lula: "Michel, realmente temos pontos de vista diferentes sobre muita coisa, há pessoas que tentam nos afastar, mas vamos abrir um canal de comunicação para evitar nosso distanciamento"... patati-patatá. Lula se serviu de algumas doses de uísque. Michel, que não é de beber, conformando-se com uma ou outra taça de vinho, ou um licor, teve de acompanhar Lula na sequência das doses. Saíram os dois abraçados na chegada em Congonhas. Com a amizade uiscada. Os tempos mudam.

Bonecos de Olinda, prazer!

Certa feita, acompanhei Michel ao Recife para uma visita ao então governador de PE, Jarbas Vasconcelos. Fazia parte da liturgia do presidente do PMDB ouvir as lideranças do partido, ainda mais se tratando de Jarbas Vasconcelos, um perfil de honra, que realizou grande trabalho pelo partido, desde os tempos em que o presidiu. Chegamos já tardinha, com o sol se pondo. A casa do governador parecia um museu a céu aberto. Pela coleção de objetos, o artesanato pernambucano se fazia presente nos cômodos. Ficamos na sala de recepção, à entrada. Os raios do pôr do sol abriam claridade para uma sala contígua, onde em uma mesa de jantar, convivas pareciam se regalar com os acepipes. Fiquei curioso. Michel, muito educado, pediu licença de Jarbas, levantou-se e se dirigiu aos convivas, querendo cumprimentar cada um. Mão estendida para o primeiro, veio o susto. Eram bonecos de Olinda, em tamanho natural, sentados à mesa e diante de pratos e talheres. Não conseguimos conter o riso.

Freyre com y

O Americano Batista era um dos afamados colégios de Recife, dirigido por evangélicos batistas. Cursei no CAB os anos do Científico, onde fundei o Diretório Acadêmico, criei um jornal e fui o orador da turma na conclusão do curso. Escolhemos como paraninfo um ex-aluno do Colégio: Gilberto Freyre. Fomos entregar o convite a ele no solar de Apipucos, onde dona Madalena, sua esposa, nos ofereceu sucos e licores. O detalhe que alguns dos leitores devem ter notado é a grafia: Freyre com Y. Pois bem, eu havia grafado no convite Freire com I. Momento constrangedor. O professor viu que o nome dele estava com grafia errada e me devolveu o envelope com a observação:

- Meu filho, faça a correção. Meu Freyre é com Y. Meu pai, Alfredo, quando recebia correspondência com seu sobrenome errado, nem abria a carta. Devolvia. De modo que terei o prazer de recebê-los quando fizerem a correção.

Essa lição mexeu com minha cuca. Até hoje, confiro as grafias. Temo passar pelo puxão de orelhas do professor Gilberto Freyre com Y, que fez belíssima peça oratória no dia da formatura.

Fonte: Gaudêncio Torquato (GT Marketing Comunicação).

https://www.migalhas.com.br/coluna/porandubas-politicas/409122/porandubas-n-851


quinta-feira, 13 de novembro de 2025

Porque Roberto Macêdo fará falta, à família, ao O POVO e ao Ceará

Por Gualter George, diretor de Opinião do Grupo de Comunicação de O Povo (*)

O nosso espaço de Opinião notabiliza-se pela diversidade. Há nele representações de todos os gêneros, todas as raças, diversas categorias profissionais, segmentos sociais e econômicos diferentes, moradores de áreas nobres e periferias, enfim, cuidamos para que funcione como um retrato perfeito, quase completo, do que somos como sociedade.

O ofício cotidiano dos últimos cinco anos, quase, tempo que sou editor e depois diretor de Opinião do Grupo de Comunicação O POVO, impõe que eu tenha atenção especial com o que é publicado. Confesso que na condição anterior, de um leitor distanciado e que podia se dar ao luxo de escolher apenas o que me parecia interessante, nem sempre conseguia perceber a importância de algumas opiniões que passam pelo espaço diariamente.

Por exemplo, chegando à posição em que estou agora é que comecei a vislumbrar a força política dos textos que mensalmente publicávamos com assinatura de Roberto Macêdo, o articulista que acaba de nos deixar. Sem críticas àqueles que optam por caminhos contrários, passou a chamar minha particular atenção o fato de nunca haver um interesse próprio, pessoal ou econômico, abordado nas suas contribuições ao espaço.

Era sempre um tema de interesse coletivo que ele trazia à discussão, claro que a partir de suas convicções próprias. O fato de ser um empresário de grande peso e de comandar uma das mais poderosas entidades classistas do Ceará - a Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec) -, durante boa parte do tempo em que contribuiu com seus textos, quase que não tinha influência nas suas escolhas de temas ou nas linhas de abordagem. E a ressalva do "quase que" é um preciosismo cuidadoso da minha parte, porque a rigor pode-se afirmar que o sentido coletivo, na definição mais exata do termo, prevaleceu em todos os casos.

Parece até deselegante de minha parte com outros colaboradores das páginas que tivemos e que morreram ao longo desse meu percurso na Opinião, mas, no caso do Roberto Macêdo, de fato, sinto como uma espécie de obrigação fazer esse reconhecimento aberto de sua importância para o propósito que temos de animar o debate público numa perspectiva que coloque o objetivo comum acima do interesse pessoal, corporativo ou o que valha.

No caso dele, com alma limpa, posso dizer que havia tranquilidade absoluta da nossa parte quanto à ideia conceitual que nos motiva a incentivar as colaborações externas. É uma perda para o Ceará em todos os aspectos, certamente que para a família de maneira especial, mas, no nosso caso, nos vemos obrigados a, honrando sua memória, seguir na trilha da busca pela priorização do "nós". Pode-se dizer que perdemos mais do que apenas um articulista, abre-se um vácuo de preenchimento difícil nas páginas opinativas do O POVO.

Fonte: O Povo, de 12/11/25. Opinião. p.23.

O economista e a inteligência artificial

Por Lauro Chaves Neto (*)

Historicamente, a relação entre economia e tecnologia foi pontuada por transformações capazes de redefinir modelos produtivos e estruturas sociais. Atualmente, a inteligência artificial (IA) ocupa um papel central, impondo ao economista novos desafios.

A IA não é apenas uma ferramenta de automação, mas um catalisador de mudanças que afeta mercados de trabalho, padrões de consumo, políticas públicas, como se pensa o desenvolvimento econômico, os ganhos de produtividade, a redução das desigualdades e a eliminação da pobreza extrema.

O economista, tradicionalmente, analisou fenômenos a partir de dados escassos, agora, encontra-se diante de bases de dados massivas, algoritmos preditivos e modelos capazes de gerar cenários complexos em tempo real. Essa abundância de informação não deve substituir o julgamento humano, e sim o fortalecer.

As ferramentas de machine learning permitem prever tendências de mercado com maior precisão, analisar comportamento de consumidores e simular cenários econômicos. O economista deixa de ser apenas um analista e passa a ser um estrategista, interpretando os resultados gerados por sistemas inteligentes e tomando decisões mais embasadas.

A ética no uso de dados, o viés algorítmico e a transparência nos modelos são questões críticas. O economista moderno precisa dominar tanto a teoria econômica, como também fundamentos de ciência de dados, programação e estatística avançada.

Outro ponto central é a formulação de políticas públicas. A IA permite modelos mais precisos para avaliar resultados e prever crises. Contudo, se mal utilizada, pode ampliar vieses, reforçar concentrações de poder e reduzir a transparência. O economista, então, deve atuar como mediador entre inovação tecnológica e justiça social.

Em síntese, a inteligência artificial não elimina o papel do economista. Pelo contrário, o torna ainda mais necessário. Cabe ao profissional unir capacidade analítica e visão humanista, garantindo que a tecnologia esteja a serviço do desenvolvimento sustentável. O futuro da economia, mediado pela IA, será não apenas quantitativo, mas essencialmente humano.

(*) Consultor, professor doutor da Uece e conselheiro do Conselho Federal de Economia.

Fonte: O Povo, de 13/10/25. Opinião. p.18.

quarta-feira, 12 de novembro de 2025

ROBERTO MACÊDO: o empresário que fez da sensibilidade sua maior força

Por Carmem Pompeu, jornalista de O Povo (*)

À frente do Conselho de Administração da holding do Grupo J. Macêdo, fundado em 1939 por seu pai, o industrial José Dias de Macedo, Roberto construiu uma trajetória empresarial sólida e reconhecida nacionalmente

O empresário Roberto Proença de Macedo morreu ontem aos 81 anos. Engenheiro mecânico, empresário e líder classista de destaque, ele deixa um legado marcado pelo empreendedorismo, pela visão inovadora e pelo compromisso com o desenvolvimento industrial e social do Ceará.

Nascido em Fortaleza, em 1944, Roberto Macêdo formou-se em Engenharia Mecânica pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Casado com Tânia Rocha Lima de Macêdo, era pai de quatro filhos, avô de dez netos e bisavô de três bisnetos. 

Ao lado do irmão, Amarílio Macêdo, deu continuidade à empresa fundada pelo pai, José Dias de Macêdo, em 1939, consolidando-a como uma das mais emblemáticas do mercado brasileiro, detentora de marcas como Dona Benta, Petybon, Sol e Hidracor.

O velório ocorreu na funerária Ternura, em Fortaleza, onde estavam presentes familiares, amigos e boa parte do empresariado cearense. “Era um grande coração, grande idealista. Uma pessoa de profunda sensibilidade humana. Era gostoso gostar dele”, descreve Amarílio Macêdo.

Luciana Dummar, presidente institucional e publisher do Grupo de Comunicação O POVO, lembra dele como um amigo de verdade, de uma presença amorosa, um homem correto como poucos e amigo dos amigos.

Encontrar o Roberto era sempre motivo de um sorriso largo e um coração preenchido. Eu me despeço dele com tristeza, mas com a certeza de que o encontro dele com meu pai (Demócrito Rocha Dummar, presidente do O POVO de 1985 a 2008) vai ser motivo de uma grande festa, porque o Roberto foi um dos melhores amigos desta família e desta Casa", afirma.

Fiec realiza homenagem ao seu ex-presidente

Como presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), cargo que exerceu por dois mandatos, entre 2006 e 2014, foi protagonista de uma gestão voltada à ampliação da representatividade industrial, ao fortalecimento das entidades de classe e à integração do setor produtivo com a inovação e o conhecimento.

Na tarde de ontem, gestores e colaboradores do Sistema Fiec reuniram-se no hall da Casa da Indústria para prestar homenagem ao ex-presidente da Federação.

Em nota, a entidade destacou que Roberto Macêdo ajudou a escrever um capítulo decisivo da economia cearense, consolidando um dos maiores grupos empresariais do Nordeste e contribuindo, de forma permanente, para o fortalecimento do trabalho, da produção e da prosperidade.

Para mim, sua partida é especialmente dolorosa. Roberto foi mais que um líder: foi um amigo-irmão, um conselheiro constante, uma presença segura”, afirmou o presidente da Fiec, Ricardo Cavalcante.

Durante sua gestão na Fiec, Roberto Macedo defendeu a valorização dos talentos locais, o associativismo e o diálogo permanente entre indústria, governo e sociedade, acreditando que a competitividade e o desenvolvimento sustentável dependem da união em torno de agendas positivas.

Para mim, sua partida é especialmente dolorosa. Roberto foi mais que um líder; foi um amigo irmão, um conselheiro constante, uma presença segura”, afirmou o presidente da Fiec, Ricardo Cavalcante.

Além de ser um grande empresário com larga visão social, ele também era um ambientalista. Estivemos em várias sagas ambientais juntos. Ele que foi sempre um defensor da Associação Caatinga, inúmeras vezes contribuiu com a Prefeitura e com o Estado nas políticas ambientais”, destacou Artur Bruno, superintendente do Instituto de Pesquisa e Planejamento de Fortaleza.

Homenagens também foram feitas na Assembleia Legislativa do Ceará e no Senado Federal. "Perdemos um dos maiores empreendedores do Ceará, o doutor Roberto Proença de Macedo, do Grupo J. Macedo. Visionário, ético e comprometido com a responsabilidade social e ambiental, Dr. Roberto gerou milhares de empregos e contribuiu enormemente para o desenvolvimento do estado e do país", afirmou o senador Eduardo Girão (Novo-CE).

Ele lembra que, recentemente, Roberto Macêdo foi homenageado no Congresso Nacional pelos 85 anos do Grupo J. Macedo, sendo reconhecido pelo legado construído à frente de uma das maiores empresas do Brasil. " Em nome do Senado Federal, apresentei um voto de pesar, prontamente aprovado pelo Senado, manifestando solidariedade à família, amigos e colaboradores."

As lições deixadas no ambiente empresarial

O grupo J. Macêdo publicou nota de pesar pelo falecimento do empresário e destacando a trajetória dele como líder empresarial de destaque no Ceará e no país, tendo ocupado a presidência da Fiec por diversos mandatos e a vice-presidência da CNI.

"Sua trajetória permanece marcada pela generosidade, integridade, fé e sensibilidade nas relações humanas. Roberto Macêdo inspira todos nós a seguirmos firmes na construção de um futuro guiado pelos valores que sempre nortearam sua vida e o propósito da família Macêdo", informou a empresa.

O presidente da M. Dias Branco, Ivens Dias Branco Jr., também manifestou pesar. "Roberto Macêdo foi uma das mais destacadas referências da indústria nacional, tendo contribuído de forma decisiva para o fortalecimento do setor produtivo brasileiro. Sua liderança, visão empreendedora e compromisso com o desenvolvimento do país e da Região Nordeste constituem um legado exemplar para as futuras gerações e serão sempre reconhecidos pela indústria brasileira", afirmou.

Legado social e ambiental

Para além da atuação empresarial e institucional, o industrial dedicou parte significativa de sua vida ao empreendedorismo social e à preservação ambiental. Foi fundador e conselheiro da Associação Caatinga, entidade de referência na conservação do bioma e na promoção da convivência sustentável com o Semiárido.

Ele deixa uma história que vai servir a gerações, porque foi um homem que viveu para sua família, para uma empresa familiar de destaque nacional, referência no país hoje, mas que não descuidou de ser um homem que cuida da causa ambiental”, destacou Carlos Matos, ex-secretário da agricultura do Ceará.

Roberto Macêdo também atuou como conselheiro honorário da The Nature Conservancy (TNC), organização internacional voltada à proteção da natureza, e conselheiro colaborador da Fazenda da Esperança, instituição dedicada à recuperação de pessoas em situação de dependência química.

Eu estudei com ele no Jesuíta de Baturité e fui vice-presidente do grupo (J. Macedo). Acima de tudo, era um homem bom. Um homem que está sempre em paz com todos ao seu redor. Ele construiu, além do império de trabalho na empresa dele, um império de relacionamento. Uma pessoa fantástica”, declarou Lima Matos, ex-secretário da Fazenda do Ceará.

Fonte: O Povo, de 12/11/25. Economia. p.11.

VELHICE: desgraça? Não, ventura

Por Márcia Alcântara Holanda (*)

Quando Rita leu o título deste artigo — como quase sempre faz — entrou na cozinha falando, sem sequer dar bom dia:

— Ainda bem que você largou o romantismo com que trata a velhice! Fale das desgraças que se abatem sobre os velhos, especialmente os do século XX e XXII.

Respondi:

— Não romantizo, Rita. Mostro o descompasso do corpo velho com as exigências do viver, e como é possível ajustar caminhos, vontade e esforço para sentir a vida plena, mesmo com as grandes limitações que os velhos detêm.

Rita riu, duvidando. Continuei:

— Encontrei respaldo para tocar nas desgraças dos velhos no podcast da historiadora Mary Del Priore, comentando seu livro Uma história da velhice no Brasil. Nele, Clarice Lispector aparece referenciada com a brutal lucidez que sempre teve.

Em Feliz Aniversário (conto de 1960), Clarice mostra Dona Anita, de 89 anos, cercada de filhos e netos que celebram sua data sem afeto, sufocando-a entre compaixão e descaso. A desgraça é social: o abandono, a perda de sentido, o corpo que não se impõe e a palavra que não ecoa.

Rita andava pela sala:

— Dona Anita parece ser de classe média alta. E os velhos pobres?

— Clarice também os retratou — respondi — em Viagem a Petrópolis. A octogenária Dona Margarida, rejeitada e sem renda, vai de casa em casa, sustentada por favores. Invisível, sem lugar no mundo.

Essa exclusão extrema é retomada, de modo fantástico, no filme O Último Azul. Nele, os idosos são obrigados à aposentadoria aos 78 anos e deportados para um exílio forçado, onde se tornam invisíveis e inviáveis — expulsos do direito de sonhar ou trabalhar.

Rita sentou-se, pensativa:

— E pior: cresce o pânico diante da velhice. Às vezes vira ódio contra tudo o que lembra envelhecer. Os séculos XX e XXI desembocaram em buscas frenéticas pelo rejuvenescimento, hoje sem limites — das cirurgias plásticas a procedimentos arriscados e extremos, como mostra o filme A Substância (2024).

Assenti. O preconceito está embutido nas exigências de beleza e produtividade. A OMS aponta que um em cada dois idosos sofre discriminação etária.

Rita, provocadora, insistiu:

— E ainda vai romantizar essa velhice?

Sorri:

— Vou continuar afirmando, com Sartre, que a liberdade está sempre disponível. E com Nietzsche, que em A Gaia Ciência nos convida a dizer "sim" à vida, mesmo nas dores. O ser livre transforma o sofrimento em criação: jardina, escreve, dança, reinventa-se.

Rita ficou em silêncio. Conclui

— A velhice não é desgraça quando a consciência desperta para a liberdade que se alcançou, mesmo diante de limites e da finitude. O corpo pode fraquejar, mas o espírito aprende a dançar — leve, mesmo sobre o fio que limita o chão do abismo.

(*) Médica pneumologista; coordenadora do Pulmocenter; membro honorável da Academia Cearense de Medicina.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 12/10/2025. Ciência & Saúde. p.20.

 

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