terça-feira, 19 de agosto de 2025

A VIDA É A ARTE DO ENCONTRO

Por Patrícia Soares de Sá Cavalcante (*)

Observar a comunicação entre um bebê e sua mãe nos primeiros meses de vida é algo profundamente comovente. Lembro-me, emocionada, da minha experiência como mãe de primeira viagem da Marina. Na maior parte das vezes, eu sabia exatamente o que ela queria. Tínhamos uma cumplicidade expressa pelo olhar, pelo sorriso e pelas brincadeiras.

Embora ela falasse apenas algumas palavras - algo natural para a sua idade -, parecia que já estávamos conversando. Quando eu chegava do trabalho, ela provavelmente ouvia o barulho do elevador e, antes mesmo de eu entrar em casa, eu a escutava dizer: "Mamãe!". Ao abrir a porta, dava-lhe um beijo e dizia: "A mamãe estava com saudades".

Certo dia, não consegui chegar a tempo para colocá-la para dormir - uma rotina que mantínhamos quase diariamente. Na minha ausência, ela, com apenas um ano e nove meses, verbalizou, ainda sem conseguir formar frases: "mamãe... saudade".

Segundo Lacan, sem ausência não há palavra, e a palavra, sobretudo quando compreendida, favorece os encontros. Nosso primeiro grande encontro costuma ser com a mãe, ou com quem exerceu uma função de cuidado e amparo. Alguém que nos ajudou a desenvolver a linguagem e a traduzir nossos sentimentos, mesmo diante das imperfeições - que, aliás, são inevitáveis e essenciais para o amadurecimento.

Mesmo depois de adquirirmos a linguagem verbal, mantemos uma comunicação não verbal que diz muito. Às vezes, uma imagem ou um olhar valem mais que mil palavras. Porém, comunicar-se não é uma tarefa simples: há o que é dito, o que o outro entende e o que fica nas entrelinhas, além das mensagens inconscientes que podem permear qualquer diálogo.

O suprassumo da comunicação ocorre quando conseguimos estabelecer uma compreensão mútua, seja no falar ou no silenciar. Há algo mais acolhedor do que quando alguém percebe o nosso tom de voz, a expressão do nosso olhar, o nosso sorriso ou compreende o que o nosso silêncio revela? Quando isso acontece, a angústia do que não foi possível dizer em palavras se esvai.

É como receber o melhor dos abraços. Mas isso é coisa rara. Como dizia Vinicius, "A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida".

(*) Médica psiquiatra.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 15/07/2025. Opinião. p.16.


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