Por Carlos Roberto Martins
Rodrigues Sobrinho (Doutor Cabeto) (*)
A memória de um dos presidentes mais tolos
do Brasil, Eurico Gaspar Dutra, foi recheada de fatos inusitados. Dizem que era
conhecido por ser um militar dedicado e despreparado. Contam de sua
incapacidade de expressão e, também, por uma dificuldade, trocava o
"s" pelo "x". Era, assim, proibido por seus apoiadores de
realizar qualquer discurso, sendo lembrado como o "catedrático do
silêncio". Pena que o exemplo não é levado em conta nos dias atuais!
Contam-se, também, em sua autoria, inúmeras
passagens jocosas. Entre elas, uma das mais inusitadas, relaciona-se ao seu
secretário particular que assumiu a responsabilidade de um "pum"
durante a inauguração de um grande hospital. E por tal ato de respeito e
fidelidade, disse: "Presidente, desculpe-me, comi algo que me fez
mal". Foi, por isso, recompensado com a propriedade de um cartório.
Lembrando dessa passagem dos bastidores da
nossa história, fui invadido por uma indagação. Afinal quantas bufas e quantos
cartórios fizeram a nossa incrível história da República?
A passagem é para muitos de nós já bem
antiga, mas os hábitos são bem atuais. Os bastidores da República, dos
governos, querem sejam em âmbito federal, estadual ou municipal, continuam
repletos de "bufas" premiadas. Nem sempre tão simplórias como a
protagonizada pelo "prexidente", mas sim recheadas de jantares,
favorecimentos ilícitos e pela promiscuidade da relação entre o público e o
privado. Nem é mais preciso o constrangimento de assumir a autoria de um
desleixo da natureza. Há quem, espontaneamente, assuma a responsabilidade de
atos mais graves. Pois, costumam dizer nos bastidores, "alguém tem que
fazer o jogo sujo".
A premiação pode acontecer das mais
diversas formas, desde um cargo de conselheiro numa estatal à redução da carga
fiscal, ou mesmo sob os protestos dos órgãos de controle e de uma legislação
existente, inúmeras vantagens em licitações públicas.
Afinal, a frase atribuída a Luís XIV em
sessão do parlamento francês durante a monarquia absolutista- "Je suis la
Loi, Je suis l'Etat; l'Etat c'est moi", relaciona-se a ao direito divino,
ao poder absoluto.
O interessante é que passados quase quatro
séculos, após inúmeras tragédias, a frase possa ser colocada na fala de muitos
dos nossos governantes. Infelizmente, "O Estado sou eu" nunca foi tão
atual.
Resta-nos, oportunamente, esclarecer quem
são os autores das bufas e quem as premiam. Quem, de fato, se beneficia.
Pois bem, cabe pensar sobre o que uma bufa
constrangedora pode promover.
Enfim, "déjà vu"? culturais
(*) Médico. Professor da UFC.
Ex-Secretário Estadual de Saúde do Ceará.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 17/05/2025. Opinião. p.19.
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