Por Valdélio Muniz (*)
A escolha do cardeal americano Robert
Prevost, eleito no recente conclave, pelo nome Papa Leão XIV trouxe alusão que,
um dia depois, ele mesmo confirmou: a inspiração em Leão XIII (italiano
Gioacchino Vincenzo Raffaele Luigi 1810-1903), o papa que moldou a doutrina
social da igreja. O que isso tem a ver com o Direito do Trabalho?
Façamos uma breve digressão à história
do próprio trabalho. Das eras primitivas em que a caça e a pesca eram
necessidade de subsistência, passou-se também ao uso da força de trabalho
humana e animal (tração) em benefício de terceiros. Transitou-se da escravidão
(de povos colonizados, tidos como propriedades de seus colonizadores e que, por
não serem vistos como sujeitos, não tinham direitos) à versão mais amena
chamada servidão (com direito à proteção política e militar dos servos e o
dever destes de dividir com seu senhor uma parte de tudo que produzissem nas
terras que lhe foram confiadas).
Por muito tempo, trabalho era visto
também como forma de obter expiação (purificação) dos pecados e liberdade.
Tanto que, no portão do campo de concentração de Auschwitz, se estampou, em
alemão: Arbeit macht frei (o trabalho liberta). As corporações de ofício
(espécie de embriões dos sindicatos surgidas no século XII) chegaram a ser
proibidas, pois encaradas como forma de conspiração dos trabalhadores.
A Revolução Francesa (1789) trouxe, no
ideal de liberdade, aparato teórico à defesa do respeito à autonomia da vontade
no contrato, inclusive de trabalho (desconsiderada a clara situação de
desigualdade e dependência entre os contratantes), que se somou à filosofia do
laissez-faire (em francês, deixe acontecer), para apregoar o distanciamento do
Estado das relações econômicas.
A primeira Revolução Industrial
(1760-1860) trouxe a expansão das fábricas e o surgimento da classe
trabalhadora (proletariado), submetida a jornadas de até 17 horas diárias
(incluindo idosos, crianças e mulheres). E, em 1891, o Papa Leão XIII editou a
histórica encíclica Rerum Novarum (do latim, Coisas Novas), alertando para a
situação de penúria dos operários e para a necessidade de intervenção estatal
nas relações de trabalho.
A encíclica tornou-se documento
essencial para a construção do Direito do Trabalho, a partir de regras como
limitação de jornada diária, direito a repouso semanal remunerado, salário
mínimo etc,, o que se difundiu com mais força após a criação da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), em 1919, com o surgimento de diversos aparatos
legais protetivos ao trabalhador em todo o mundo.
Que esta inspiração ajude o Papa Leão
XIV a lançar luzes sobre os impactos que as atuais revoluções tecnológicas têm
trazido ao mundo do trabalho, como ele mesmo também já demonstrou preocupação.
(*) Jornalista,
professor universitário e analista judiciário.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 23/04/25.
Opinião. p.25.
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