Rubens Alves Ilustração de O Povo |
Por Paulo Renato Abreu
Rubem Alves dedicou-se a estudar o humano,
principalmente por meio da educação e da religião. Pesquisadores debatem a
contribuição do intelectual para as ciências humanas
Rubem Alves dedicou 80 anos de vida a pensar o
homem em sua complexidade. O intelectual escreveu sobre educação, religião,
infância, velhice, morte e outras tantas questões. “Quem sabe que está vivendo
a despedida olha para a vida com olhos mais ternos”, ponderou no livro As cores
do crepúsculo: a estética do envelhecer. O escritor mineiro, que passou toda a
vida com “olhos ternos” ao humano, se despediu no último sábado, aos 80 anos,
em Campinas (SP), após falência múltipla de órgãos.
“Rubem Alves
foi um pensador bastante abrangente. Ele mostrou que não é um pecado estudar
muito, pensar muito.
O grande legado dele é o desafio de pensar por si
próprio”, afirma Rosendo Amorim, doutor em Sociologia e professor da
Universidade de Fortaleza (Unifor). Amorim destaca: Rubem foi um “frescor” aos
estudos das ciências humanas, pois desenvolveu seus estudos de modo “original e
ousado”.
Mestre em Teologia, doutor em Filosofia e
psicanalista, Rubem Alves devotou o tempo a refletir sobre a educação como
busca constante à valorização do pensamento amplo em detrimento da educação
“limitada” pela tecnologia. O intelectual se dizia contrário ao vestibular
tradicional, que, segundo ele, não incentivava os alunos à sabedoria.
“Antes de aprender fórmulas, ele defendeu que se
devia aprender a pensar sobre o meio em que se vive e a considerar a dimensão
poética da vida”, afirma Jacques Therrien, professor da Faculdade de Educação
da Universidade Federal do Ceará (UFC). Jacques destaca que, ao pensar sobre
educação, Rubem estava mais “preocupado com a formação de cidadãos, antes da
formação de trabalhadores, de técnicos”.
Professor emérito da Unicamp, o escritor defendeu
que a educação fosse um processo prazeroso para quem aprende. “Rubem pensou a
formação de um ser humano mais flexível, que está no mundo não apenas para
trabalhar e ganhar dinheiro, está para viver, para conviver”, pontua Jacques
Therrien.
“Ele defendeu uma educação por meio do saber e não
somente do conhecimento, defendeu ser importante o desenvolvimento de uma
sabedoria de vida”, complementa Rosendo Amorim.
Teólogo da libertação?
Entre as publicações de destaque do escritor, está
a obra Da esperança – Teologia da esperança humana, considerada marco
importante para os fundamentos da Teologia da Libertação, movimento que propõe
interpretação politizada sobre os ensinamentos cristãos. O escritor lançou
também outros livros que são marcantes para o movimento e para a religião, como
O Suspiro dos Oprimidos.
“Rubem Alves
corria por fora da teologia tradicional. Em O Suspiro dos Oprimidos, por
exemplo, ele interpreta a religião enquanto discurso articulado dos desejos dos
seres humanos”, destaca Carlos Tursi, doutor em Filosofia e Teologia. O
professor assinala que Rubem encarava a religião como a “voz dos que nada têm”.
“Para ele, a religião se nutria da ausência de plenitude e os pobres seriam os
mais religiosos, pois são os mais carentes de tudo”.
Para Carlo Tursi, o autor mineiro foi um “defensor
da religião e detrator da teologia”, pois, ao centrar-se no homem, tratou “Deus
como uma projeção do ser humano”. Rubem foi pastor da Igreja Presbiteriana,
mas, no final da vida, declarou-se ateu. “Apesar de ter acabado os dias como
descrente, foi um crente no que é belo, no que é verdadeiro.”
O corpo de Rubem Alves foi cremado no último
domingo, no interior de São Paulo. Suas cinzas foram depositadas embaixo de um
ipê amarelo.
PERFIL
Rubem Alves nasceu em 1933, na cidade de Boa
Esperança, Minas Gerais. Escritor, psicanalista, educador e teólogo, Rubem foi
autor de mais de 160 títulos e professor emérito da Universidade de Campinas
(Unicamp). Morto no último sábado, 19, o escritor foi velado na Câmara
Municipal de Campinas e teve o corpo cremado em Guarulhos (SP).
Fonte: O Povo, de 22/07/14. Cad.
Vida & Arte. p.1.
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