sexta-feira, 2 de setembro de 2011

A PROPÓSITO DOS TRINTA ANOS DE LUTA ANTITABÁGICA NO BRASIL

Ana Margarida Furtado Arruda Rosemberg (*)
O vício de fumar cigarro (tabaco) expandiu-se no mundo a partir da I Guerra Mundial, entre os homens, e, a partir da II Guerra Mundial, entre as mulheres. Na década de 1960, os primeiros importantes trabalhos científicos desenvolvidos na Inglaterra e Estados Unidos evidenciaram graves malefícios do tabaco para a saúde dos fumantes e fumantes passivos. A partir de então, a atenção dos governantes, órgãos internacionais de saúde, instituições médicas e de educação, cada vez mais, foi voltada para o controle do tabagismo, pois as investigações experimentais, clínicas e epidemiológicas passaram a ser divulgadas através de milhares de publicações.
Até a década de 1970 as ações de combate ao tabagismo no Brasil foram incipientes, circunscritas e desencadeadas, em sua maioria, por médicos. Alguns pioneiros como: Mario Rigatto, do Rio Grande do Sul, José Rosemberg, de São Paulo, e Jaime Zlotnik, do Paraná, tornaram-se grandes líderes desta luta.
Em 1976, o Professor José Rosemberg publicou o livro “Tabagismo - Sério Problema de Saúde Pública” e realizou, no ano seguinte, a Primeira Semana Antitabagismo da PUC-SP. Como desdobramento da referida semana, o tema tabagismo foi incluido no currículo médico da Faculdade de Medicina daquela instituição. Também, em 1976, a Associação Médica do Rio Grande do Sul, através do Professor Mario Rigatto, instituiu o primeiro Programa Estadual de Combate ao Tabagismo do Brasil. Nos anos seguintes, as Sociedades Médicas criaram programas em diversos Estados da Federação e, somente, na década de 1990 os programas de combate ao fumo passaram para o âmbito dos governos estaduais.
Em janeiro de 1979, Antônio Carlos Campos Junqueira, Antonio Pedro Mirra, Almério de Souza Machado, Glacilda Telles Menezes Stewien, José Rosemberg, Luiz Carlos Calmon Teixeira, Mário Rigatto, Mozart Tavares de Lima, Roberto Bibas e Ruth Sandoval Marcondes lançaram a semente para a concretização de um Programa Nacional de Combate ao Fumo que foi oficializado, em 12 de agosto de 1979, pela Associação Médica Brasileira (Rosemberg, 1987. p.321).
Em março de 1979, sob a coordenação do Dr. José Silveira, da Bahia, o Instituto Brasileiro de Investigação Torácica – IBIT realizou um seminário sobre tabagismo que resultou na histórica “Carta de Salvador”. Documento de extrema importância, a carta alerta aos poderes públicos, às instituições médicas e à população sobre os malefícios do tabaco. Foram signatários da “Carta de Salvador” os seguintes doutores: Angelo Rizzo – Professor da Universidade Federal de Pernambuco, Antônio Carlos Peçanha Martins – Presidente da Associação Baiana de Medicina, Antônio Pedro Mirra – Diretor do Departamento de Cirurgia Torácica da Fundação Antonio Prudente de São Paulo, Edmundo Blundi – Professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Jaime Santos Neves – Professor de Pneumologia da Escola de Medicina do Espirito Santo, José Rosemberg – Professor Titular da Faculdade de Medicina da PUC-SP e Diretor Geral do Centro de Ciências Médicas e Biológicas da PUC-SP e José Silveira – Superintendente Técnico do IBIT (Rosemberg, 1987. p.320).
Em 29 de agosto de 1980, a Sociedade Médica do Paraná lançou a “Greve do Fumo”, sob a liderança do Dr. Jayme Zlotnik. Em homenagem ao evento, esta data passou a ser o “Dia Nacional de Combate ao Fumo”, comemorado em inúmeros municípios do Brasil com uma corrida rústica, cujo slogan, “Largue o Cigarro Correndo”, inspirou centenas de fumantes a abandonarem o vício (www.amb.org.br).
As comunidades religiosas participaram da luta, desde 1979, através da Igreja Adventista do Sétimo Dia, Igreja Presbiteriana Independente do Brasil, Igreja Católica e Centros Espíritas. O Rotary Club, Lions Club e Associação Cristã de Moços abraçaram, também, a causa.
Em 1984, foi criado o Comitê Coordenador do Controle do Tabagismo no Brasil tendo a frente o Professor Mário Rigatto, que foi o seu primeiro presidente. O Comitê esteve durante muitos anos sob a presidência do Professor Rosemberg e desdobrou-se em vários capítulos, em inúmeros Estados da Federação, e em sub-capítulos nos municípios. Atuando em parceria com os órgãos governamentais, o Comitê teve relevante atuação na luta contra o fumo.
Finalmente, em 1985, o Ministério da Saúde assumiu oficialmente a luta criando um Grupo Assessor para o Controle do Tabagismo no Brasil. Grupo eclético composto por diversos representantes da sociedade atuou junto ao governo para a criação da primeira lei federal de combate ao fumo. A referida Lei de nº 7.488 instituiu o dia 29 de agosto como o Dia Nacional de Combate ao Fumo.
Este grupo foi composto pelo senador Lourival Baptista, José Rosemberg, Mario Rigatto, Antonio Pedro Mirra, Edmundo Blundi, Geniberto Paiva Campos, Germano Gerhardt Filho, Guaracy da Silva Freitas, Jayme Santos Neves, Luiz Carlos Romero, Maria Goretti Pereira Fonseca, Paulo Roberto Guimarães Moreira, Pedro Calheiros Bonfim, Regina Celi Nogueira, Roberto Azambuja, Thomas Szego, Vera Luíza da Costa e Silva e Vitor Manuel Martinez www.inca.org.br/tabagismo).
Em 1991, a ação do MS foi transferida para o INSTITUO NACIONAL DE CÂNCER-INCA sob a coordenação da Dra. Vera Luiza da Costa e Silva. Divisor de águas na luta contra o tabaco no Brasil, o INCA instalou uma ampla rede de ações com abrangência nacional, concretizando, finalmente, a fase vitoriosa da luta.
Com a municipalização das ações de controle do tabagismo, o programa penetrou nas Empresas, Escolas e Unidades de Saúde em mais de 80% dos municípios brasileiros. Além dessas ações o INCA realizou, em parceria com as Secretarias Estaduais de Saúde e o Comitê Coordenador de Controle do Tabagismo no Brasil, vários Congressos Brasileiros sobre Tabagismo, sendo o primeiro no Rio de Janeiro em maio de 1994, sob a presidência de José Rosemberg. Em junho de 1996, foi realizado em Fortaleza-CE, o II Congresso Brasileiro sobre Tabagismo e o I Congresso Latino-Americano sobre Tabagismo sob à nossa presidência. O III Congresso aconteceu em Porto Alegre-RG, em abril de 2000. O IV Congresso, em Brasília-DF, e o V Congresso, em Belo Horizonte-MG. Além desses congressos inúmeros eventos científicos e esportivos foram realizados, em todo o Brasil, para comemorar o Dia Mundial sem Tabaco (31 de maio) e do dia Nacional de Combate ao Fumo (29 de agosto).
A inserção do tabagismo na sociedade brasileira, consequência de um processo histórico e social associado a capacidade da nicotina de causar dependência, teve graves consequências para a saúde pública da população. As representações do tabagismo no imaginário social, sempre tiveram associadas, por um lado, as propagandas enganosas das multinacionais fumageiras e, por outro, pelas campanhas de saúde pública desencadeadas pelas ONGs e órgãos de saúde e educação do governo. Enquanto as multinacionais fumageiras associavam o vicio de fumar à saúde, beleza, sucesso, status etc., os órgãos de saúde pública mostravam outra realidade associando-o a doença e a morte. Como consequência deste embate houve uma acentuada mudança das representações do tabagismo no imaginário social evidenciada pela queda significativa da prevalência de fumantes no Brasil.
Os inquéritos sobre a referida prevalência que foram realizados pela Organização Panamericana de Saúde, Ministério da Saúde, IBGE e INCA ao longo de várias décadas nos mostram estas mudanças. Em 1989, segundo pesquisa realizada pelo IBGE, 33% da população adulta brasileira fumava. De 2006 a 2009 o percentual de fumantes caiu de 16,2% para 15,5%, segundo inquérito realizado pelo INCA.
O resultado deste inquérito nos mostra que a semente lançada pelos desbravadores desta luta não foi perdida em solo estéril. Custou a medrar. Foi lento o seu crescimento, porém floriu e frutificou para o bem e alivio das vítimas do tabaco. Abriu-se, finalmente, a perspectiva auspiciosa de dias mais promissores e de triunfos sobre a grande pandemia.
(*) Pneumologista e historiadora. Redigido em Fortaleza, em 30 de junho de 2010.

Referências
www.inca.gov.br/tabagismo acesso: 30 de junho de 2010
ROSEMBERG, José. Tabagismo – sério problema de saúde pública. São Paulo: Almed, 1987, p. 321.

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