INSULTO À GUARDA
Paulo Barreto – “Revista da Academia Brasileira de Letras”, n° 8, abril de 1912.
Na sua vida de notívago e de boêmio, teve Guimarães Passos, por mais de uma vez, de ser interpelado pelos policiais rondantes. Uma noite, caminhava ele sem destino, quando um guarda o deteve.
- Que queres, vérmina humana? - interpelou o poeta, descendo da nuvem onde rimava o seu sonho.
- Aonde vai assim? - insistiu o policial.
- “Urbi et orbi!” - informou o Guima, num gesto largo.
- Como?
- “Urbi et orbi!”
- “Têje” preso, é que é. Não pode “insurtá” a guarda! - protestou o rondante.
E levou-o para a delegacia.
AMADOR BUENO
Frei Gaspar da Madre de Deus – “Memórias para a História da Capitania de São Vicente”, pág. 243.
Levantado Portugal contra o jugo espanhol, resolveram as capitanias do Brasil acompanhar a primitiva metrópole, aclamando rei ao duque de Bragança, com o titulo de D. João IV. Os paulistas de origem espanhola acharam, porém, que a ocasião era excelente para se emanciparem da tutela européia, e em 1642, saíram a aclamar, como seu rei, a Amador Bueno da Ribeira, homem de condição nobre, nascido na colônia e de grande prestígio entre os naturais.
Procurado para ser investido de poderes reais, Amador Bueno, coração leal e sem ambições de mando, correu a refugiar-se no convento dos Beneditinos. E quando surgiu, no segundo dia, diante do povo que o buscava, foi para gritar, desembainhando a espada:
- Viva D. João IV, nosso Rei e Senhor, pelo qual darei a vida!
A sua recusa do trono salvou esse ponto do império colonial português, e, com isso, a unidade do Brasil.
A MORTE DE UM JUIZ
Adelmar Tavares – “Revista da Academia Brasileira de Letras”, n° 58, de 1926.
Após uma nervosa carreira de político, feita à custa dos seus recursos de jurista habilíssimo, chegara João Luiz Alves, em 1925, ao posto de ministro do Supremo Tribunal Federal. No dia da sua posse, aí, foram palavras suas, iniciando um discurso:
- Fecho um livro da minha vida pública, e abro outro.
E concluíra:
- Que Deus, o Supremo Juiz, me ampare e inspire!
Adoecendo logo, seguiu para Paris, onde falecia pouco depois. E ao morrer, foram estas as suas últimas palavras:
- Chamem o contínuo... Despachei todos os feitos ...
“TECUM DOMINUS”
Moreira de Azevedo – “Mosaico Brasileiro”, pág. 42.
José Inácio da Costa, apelidado o Capacho, era poeta, ator e major do regimento dos pardos, nos tempos coloniais. Havendo-se mudado as vozes das manobras militares, o major Capacho, ainda pouco prático, trovejou, em exercício:
- Armas ao ombro!
- Não é armas ao ombro, sr. oficial, - retorquiu-lhe o ajudante, - é “ombro armas!”
Apresentando-se o major dois dias depois ao serviço, ao entrar no paço deu um espirro.
- “Dominus tecum” - disse-lhe um soldado.
- Não diga “dominus tecum”, mas “tecum dominus”! - observou o major.
E solene:
- Não sabe que, agora, tudo está mudado?
Fonte: Humberto de Campos. O Brasil Anedótico (1927).
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