domingo, 25 de novembro de 2012

ASCENSÃO NO HORTO DO “PADIM CIÇO”

A realização de espetáculos da Paixão de Cristo ganha corpo em muitas cidades do Nordeste, servindo, na maior parte das vezes, para alavancar o fervor religioso do povo, e, em algumas vezes, para aportar, também, dividendos financeiros, via turismo religioso, a exemplo da cidade cenográfica de Nova Jerusalém, no agreste pernambucano, que produz um megashow tido e havido como a maior produção artística, dessa temática cristã, feita ao ar livre no mundo, e que reúne, anualmente, centenas de milhares de turistas.
Juazeiro do Norte, município da região do Cariri cearense, tem sua economia fortemente atrelada ao turismo religioso, centrado na figura carismática do Padre Cícero, com marcada sazonalidade em função de certas datas festivas (procissão das candeias, morte do Pe. Cícero, finados etc.).
Para ampliar o leque de opções, atraindo igualmente turistas no período da Semana Santa, a Prefeitura de Juazeiro do Norte decidiu patrocinar a encenação pública da Paixão. Para isso, oportunamente, o local de realização escolhido foi o Horto, cujo íngreme percurso é pontuado pelas quatorze estações da Via Sacra e culmina na colossal estátua do “Padim Ciço”, a dominar todo o Vale do Cariri.
O término da encenação dá-se com a Ascensão de Cristo, tendo por palco natural o pico da colina urbana, junto à reportada estátua, possibilitando uma fácil visão a todos os espectadores.
Em um desses espetáculos, acontecido nos anos dois mil, o guindaste escamoteado, que fazia a subida do Cristo, por alguma razão, deu um sopapo, passou a ranger, e a subida perdeu então a suavidade, substituída por tremores, ameaçando ficar fora de controle. Nessa hora, o “Cristo” temendo pelo pior, ante a ameaça de despencar no precipício de mais de duzentos metros, do lado inacessível do acidente geográfico, agarra-se, firmemente, à engenhoca, e proclama desesperado:
– Valei-me, meu Padim Ciço! Eu não sou o Cristo, não! Sou só um ator.
Marcelo Gurgel Carlos da Silva
Da Sobrames/CE e da ABRAMES
* Publicado In: SOBRAMES – CEARÁ. Murmúrios literários. Fortaleza: Sobrames-CE/Expressão, 2012. 296p. p.229.

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