A reforma ortográfica acabou com o trema,
e só agora me dei conta de que nunca o tinha usado. Sempre o ignorei. Os
revisores, se quisessem, que acrescentassem os tremas onde cabiam. Por
vontade própria, nunca botei olhos de cobra em cima de nenhum "u". E
agora que o trema desapareceu oficialmente, fiquei com remorso. Como me
penitenciar? Peço só mais uma oportunidade para compensar meu descaso com o
trema usando-o num texto. Li que, com a reforma, o trema só continua a ser
usado legitimamente em nomes estrangeiro como Müller e Anaïs. Uma
história para Müller e Anaïs, portando. Atenção, revisor: mantenha todos os
tremas.
Uma
história com seqüência e conseqüência.
Talvez
uma história policial: a dupla Müller e Anaïs atrás de delinqüentes.
Ou uma
história de excessos eqüestres levando ao uso freqüente de ungüentos.
Ou uma
simples cena doméstica. Müller eAnaïs na cozinha do seu
apartamento, eqüidistantes de um pingüim em cima da
geladeira. Müller acaba de chegar da rua com um pacote.
- Anaïs,
esse pingüim...
-
Quequitem?
-
Eu não agüento esse pingüim, Anaïs.
-
Ele está aí há cinqüenta anos e só agora você nota?
- Cinqüenta
anos, Anaïs?
-
Está bem, cinco. Um qüinqüênio.
-
Um qüinqüênio?
-
Um qüinqüênio. E vai ficar aí outro qüinqüênio.
-
Não se usa mais pingüim em geladeira, Anaïs. É uma coisa do
passado. Como o trema.
-
Pois eu gosto e está acabado. O que você trouxe nesse pacote?
-
O que mais poderia ser? Lingüiças. As últimas com trema que tinham no
super.
Pronto.
Acho que estou redimido. Adeus, trema. E desculpe qualquer coisa." –
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