Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
As palavras ‘consumidor e cidadão’ tornaram-se
assemelhadas. Consumidor passou em muitos casos a ser sinônimo de cidadão. O
presidente Michel Temer, em evento do jornal Financial Times em Nova York,
afirmou que seu governo resgatou a confiança dos agentes, o que se deve
traduzir em melhora dos investimentos e do consumo. “O Brasil tem momento de mudanças, com enormes
oportunidades”, disse aos investidores dos Estados Unidos, ressaltando que “a
recessão ficou para trás”.
Entretanto é necessário pensar que consumo é
uma coisa, e consumismo é outra bem diversa. No consumo, o ato de comprar está
diretamente relacionado à necessidade ou à sobrevivência. Quando se trata de
consumismo, essa relação está rompida, ou seja, a pessoa não precisa daquilo
que está adquirindo. O consumismo está vinculado ao gasto em produtos sem
utilidade imediata, supérfluos.
A origem da tendência de compulsão pelo ato de
comprar faz parte da história da humanidade, e o capitalismo atual tem que
aumentar a produção de mercadorias, cada vez mais. O consumismo está ficando
muito polêmico, hoje em dia, pois suas consequências são graves para a
sociedade. Para o sistema atual, a produção não pode parar, já que parando não
sobrevive.
As pessoas que dão alto valor para riqueza,
status e bens materiais são mais depressivas, ansiosas e menos sociáveis do que
as que não se importam tanto com essas questões. Elas são menos interessadas
pelos problemas de sua coletividade.
Evitar os maus estímulos, como a publicidade
seria quase impossível na atualidade. Ela é um dos piores males, corrompe toda
qualidade e toda crítica. Instiga ao crime, com enganações. A publicidade e o
consumismo fazem da pessoa um objeto, e o pior, aquele que não pode comprar uma
mercadoria cai num quadro de ansiedade. O marketing impõe às pessoas uma
fantasia de que a felicidade é passível de ser alcançada, e ela pode ser obtida
por meio do consumo de artigos os mais variados.
O conceito de consumo dado pela ciência da
economia não se restringe ao ato de comprar alguma mercadoria ou bem, visando à
satisfação de determinada necessidade ou demanda. Consumir, contudo, não se
resume só a essa concepção, pois atualmente o que mais se desgasta é a imagem,
que poderá ser de algum artefato, um elemento quase sempre de fetiche – objeto a
que se atribui poder sobrenatural ou mágico e se presta ao culto. É a imagem no
outro extremo, como forma de encontrar o significado de sua própria razão de
existir.
O sujeito consome, mas também é consumido,
pois nessa busca pela completude não consegue satisfazer seu desejo
inconsciente, um desejo de desejo, de aplacar a falta em objetos ditos pela
publicidade como solucionadores dessa sensação nostálgica - uma condição médica
associada à depressão e à ansiedade.
Noto que o consumo hoje em dia tomou um
significado diferente do que possuía no passado. As pessoas de hoje estão
perdidas no universo da globalização; as referências tradicionais estão mortas:
à direita, à esquerda, às religiões - são conceitos dos mais desfocados.
E o sentimento geral das pessoas é o de ficar
desorientadas. Desorientação é uma geradora de ansiedades. Mas, justamente
através do consumo, as pessoas readquirem certo poder, porque comprando algo
sentem um alívio, muito embora momentâneo. Acredito que o consumo se tornou
algo tão importante porque, de certa maneira, elas podem exercer uma pequena autonomia
momentânea. Porém, justamente através do consumo, as pessoas readquirem certo
poder, mas não aplacam a necessidade de comprar. É como um tubarão que não pode
parar pois, se parar, morre asfixiado.
(*) Professor Titular da Pediatria
da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União
Brasileira de Escritores (UBE) e da Academia Brasileira de Escritores Médicos
(ABRAMES). Consultante
Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).
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