quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

TEMPO & ETERNIDADE


Pedro Henrique Saraiva Leão (*)
Há muito repito ser a Academia Cearense de Letras a mais antiga do Brasil, pois antecipou-se em três anos à sua congênere brasileira. Como todas entidades semelhantes, sobrevive não mercê do poder público (geralmente indiferente), mas graças às benesses do setor privado, por meio de seus eventuais mecenas. Essa denominação homenageou, na Roma Imperial, Caius Mecenas (68 a.C. – 8 a.C.), notabilizado como patrono dos artistas, literatos, da cultura enfim. Com idêntica sensibilidade, tivemos no Ceará, nos idos de 1957, um clarividente deputado estadual, o advogado Perilo Teixeira, autor do projeto de Lei 3586 (06/12 daquele ano), beneficiando a Academia Cearense de Letras e o Instituto Histórico Geográfico e Antropológico do Ceará.
Quase seguramente por falta de ressonância eleitoral, o projeto foi logo arquivado. A ideia de uma sede própria para a ACL fora sonhada e cerebrada por Justiniano de Serpa, presidente do Estado em 1926, mas também arquivada pelo seu falecimento no ano seguinte. O aludido sonho quedou postergado (permaneceu adiado) por mais de meio século (53 anos) quando, em 13/XI/1989, o governador Tasso Jereissati doou o Palácio da Luz (Rua do Rosário, 1) à Academia Cearense de Letras como sua sede definitiva (Lei 11637/1989).
Vale ressaltado que Tasso Jereissati, nosso benfeitor mor, e sócio honorário, hoje novamente senador, é bisneto de José Carlos da Costa Ribeiro Jr., um dos fundadores da ACL. A ele foi outorgada, em 2010, a Medalha Cláudio Martins, criada por mim àquela época. Quando tive a honra de presidir esta Casa (2009-2012), fomos aquinhoados, vez primeira (Governo Cid Gomes), da Lei 14905 (24/4/2011), consoante publicação do D.O. de 24/10/2011. Aludido provimento obrigava o Estado a custear a manutenção anual desta entidade.
Contudo, “forças (nem tanto) ocultas” restringiram (limitaram) a duração dessa Lei para um ano apenas. “Hélas!” Malgrado o costumeiro arrecife de vicissitudes (alternâncias, percalços) inerentes a atividades desta natureza, no Brasil, a Academia Cearense de Letras vem, altaneira, singrando nossos verdes mares. Qual o clássico de Felini “E la nave va”. Na locução que proferi saudando-a por seus 118 anos (In Revista da Academia Cearense de Letras, vol. 117, no 73, 2012) – afirmei ser de mister “rappeler” (lembrar), à maneira dos franceses, algo discordando do escritor português (Prêmio Camões de Literatura, 1992) Vergílio Ferreira, para quem o esquecimento é o destino da vida. Assim, em novembro de 2012, com precedência, ali homenageamos, reconhecidamente o então chanceler da Unifor, Airton Queiroz, conferindo-lhe a Medalha Barão de Studart.
No dia 16 de agosto pretérito, a ACL comemorou seu 123º aniversário de fundação. O elóquio (locução, discurso) oficial omitiu esses dois fatos históricos, agora aqui lembrados, em respeito àquela distinta plateia. Aliás, “o memorialista conta o que quer; o historiador conta o que sabe”, conforme feliz observação do notável cearense Juarez Távora.
Reconhecemos, contudo, serem traiçoeiras as nominatas, e não aconselhável traí-las, destarte evitando desinteirar a verdade. Naquela noite soleníssima, tentou-se matar algum tempo, mas feriu-se a eternidade. Pois.
(*) Professor Emérito da UFC. Titular das Academias Cearense de Letras, de Medicina e de Médicos Escritores.
Fonte: O Povo, 11/10/2017. Opinião, p.10.

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