Médico-Psicoterapeuta
“O gentio é logo
admirado, logo desprezado”.
Ele era o tipo
característico do intelectual judeu marginal. Nasceu em um lar onde não havia
tradição, fosse judia ou alemã. Passou a juventude em um ambiente completamente
amorfo e instável. Em Dusseldorf, onde nasceu, apesar de não haver impedimento
para frequentar educandários públicos, o fato de ser judeu não deixava de ser
um obstáculo extraoficial.
O poeta Heine, na
adolescência, sofreu crises de desassossegos, inquietações, medos, e o
denominado “nervosismo judaico”. Oriundo de uma família rica e destinado ao
Comércio, optou por estudar Direito. A seguir, por vocação, decidiu aprender
Literatura Romântica, visando alcançar certas posições vetadas aos judeus. E,
pensando que a religião luterana era o passaporte para a cultura germânica,
converteu-se àquele credo.
Ainda jovem, e a
despeito de já ser famoso pelos poemas e livros de viagens, Heine tentou firmar
sua situação material, em várias cidades alemãs. Em 1831, desgostoso com o
quadro de antissemitismo presente na Alemanha, resolveu migrar para Paris, onde
julgava encontrar um ambiente mais liberal e menos hostil. Na Cidade Luz,
encontrou uma boa acolhida nos meios literários, e passou a viver
confortavelmente, como correspondente de importantes periódicos de língua
alemã.
Não obstante o sucesso,
aos poucos, sua vida em Paris foi se tornando obscura, em decorrência de
conflitos políticos, de dificuldades financeiras frequentes e por conta da
relação com uma mulher inculta. Tudo isto culminou com uma paralisia que o
levou à morte.
O extrato poético do
autor está contido no Livro das Canções, com baladas amorosas, quadros
satíricos e suas grandiosas evocações marítimas. Essa obra teve um grande
sucesso, com treze edições, durante a vida de Heine, tornando-o um intelectual
de muita popularidade.
Seu poema O Navio
Negreiro, de 1853/1854, do original alemão Das Sklavenschiff, retratou a
condição dos prisioneiros de um navio de escravos africanos, aportado no Rio de
Janeiro. Tal poema serviu de base à inspiração de Castro Alves. Heine foi
admirado por diversos escritores brasileiros, entre os quais Machado de Assis,
Gonçalves Dias, Raul Pompéia, Alphonsus de Guimaraens, Fagundes Varela e Manuel
Bandeira.
O poeta judeu alemão
influenciou, de forma marcante, o sergipano Tobias Barreto (1839-1889),
expoente da denominada “Escola do Recife”, Movimento que teve, entre seus
objetivos culturais, o de deslocar o Brasil da exclusividade à cultura
francesa, rumo à cultura alemã. Por causa de suas ideias, Tobias Barreto
polemizou com várias personalidades, a exemplo de Joaquim Nabuco, (Visconde)
Alfredo de Taunay e José de Alencar. Sofreu um alijamento social e morreu na
miséria.
Gostaria de lembrar,
por fim, que, ao participar da cultura do grupo dominante, um indivíduo, quando
rejeitado, pode se tornar um marginal extremado. Quanto mais intensa e profunda
for sua ligação com o grupo dominante, maior também será a severidade do choque
psíquico, por meio da rejeição.
(*) Professor Titular da Pediatria
da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União
Brasileira de Escritores (UBE) e da Academia Brasileira de Escritores Médicos
(ABRAMES). Consultante
Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Foi um dos primeiros
neonatologistas brasileiros.
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