Pedro Henrique Saraiva Leão (*)
"No trem da vida, convém sermos preparados para nossa última estação, com carinho, a assistência (ainda) devida, e os confortantes cuidados"
Os provérbios (aforismos, parêmias, brocardos), os chamados ditados ou ditos populares sempre habitaram a mente dos povos, curiosamente quase com as mesmas palavras, como citou nosso grande folclorista Leonardo Mota em sua magistral “Paremiologia comparada”. Algumas pessoas acreditam serem esses dizeres a voz de Deus (“Vox populi Vox Dei”).
Bastante conhecido ficou aquele cunhado pelo famoso Macbeth, personagem de Shakespeare, na peça teatral homônima (Ato 3, cena 3): “O que não tem remédio remediado está”. Contudo não entendemos bem assim, pois se não há remédios para a doença, existem sedativos para a dor; quando a moléstia é incurável, vários são os lenitivos para o sofrimento.
Aliás, no século XVII Abraham Cowley definiu a vida como doença incurável. Não obstante, os substantivos “medicus”, “medicina”, e “remedium” originaram-se do verbo latino “mederi”: cuidar.
Este verbo é importantíssimo nas doenças terminais.
Certamente, no trem da vida, convém sermos preparados para nossa última estação, com carinho, a assistência (ainda) devida, e os confortantes cuidados.
Os ingleses iniciaram tal prática cristã no Hospital São Cristovão, em 1967. A partir de 1969, a médica Elizabeth Kübler-Ross passou a estudar a ”Tanatologia” (do grego “thanatos”: morte), termo criado por ela.
Publicou mesmo dois livros fundamentais: “Perguntas e respostas sobre a morte e o morrer” (Editora Macmillan, 1974), e “Morte, o estágio final do crescimento” (Editora Prentíce Hall, 1995). No Brasil, a dra. Maria Goreti Maciel criou em São Paulo enfermaria nisto especializada (2002).
E no Ceará, há mais de 10 anos ensina-se essa disciplina no curso de Enfermagem da Universidade Estadual do Ceará (Uece). O assunto foi amplamente aqui abordado em junho de 2007 no artigo “O direito de morrer”; maio de 2009, no texto “Ame e deixe morrer”, e em outubro de 2010, “Memento mori”.
Destarte, estamos novamente a discorrer acerca da “eutanásia” (do grego “eu” = bom; normal, e “Thanatos” = morte) passiva, a morte boa, sem dor ou padecimento, sem a “humilhação da decadência”, como já determinado pelo Conselho Federal de Medicina (novembro de 2007), e votada em São Paulo (março de 2009). Ano passado, esta polêmica foi bem abordada pelo professor Diaulas Ribeiros (Editora São Camilo).
Referimo-nos portanto aos cuidados paliativos, do latim “palliare”: disfarçar, atenuar, amenizar. Assim, “Cuidados paliativos” é um curso de pós-graduação iniciado pela Unimed Fortaleza, em 25 de novembro último. Destinado a médicos e outros profissionais da Saúde, ministrado quinzenalmente, logo teve as 40 vagas ofertadas preenchidas. É essa cooperativa cuidando de nossa vida e nos paliando a finitude.
Realmente, cabe à Medicina cuidar também da nossa morte, pois “morremos quotidianamente”, como asseverou São Paulo.
Afinal, a missão do médico é curar algumas vezes, aliviar com frequência, mas confortar sempre.
(*) Médico e presidente da Academia Cearense de Letras
Fonte: O Povo, Opinião, de 15/01/2012.
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