A justiça no
Brasil enfrenta um sério adversário: os juízes de primeira instância,
vulneráveis a pressões e assédios de toda sorte. O problema é mais grave quando
suas decisões solapam preceitos constitucionais, como, por exemplo, a liberdade
de expressão.
A edição
recente da revista Isto É saiu de circulação por ordem, vejam só, de uma juíza
da Vara da Família (é quem estava de plantão) porque trazia a informação de que
o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa havia citado o governador do
Ceará no seu depoimento.
A juíza impediu
que a revista, segundo ela, “veicule fatos desabonadores a Cid Gomes”. Isto É
não cometeu aquele “crime”, se o é, por si. A revista não acusou o governador
de nada! Apenas registrou uma informação: ele houvera sido citado no depoimento
do réu.
Citado,
qualquer cidadão pode ser a qualquer momento em algum depoimento em juízo. O
julgo de responsabilidade, porém, só principia com a apresentação de indícios.
Citados, vários outros governadores foram, inclusive o falecido Eduardo Campos,
de Pernambuco.
Eles integram
uma longa lista, oferecida pelo ex-diretor em regime de “delação premiada”,
como agentes públicos que teriam recebido, segundo a versão pessoal de um réu
confesso, favorecimento financeiro como partícipes de uma rede de tráfico de
influência. Ele diz.
Não só estes.
Figura de maior expressão, Lula também foi citado: segundo Paulo Roberto, eram
frequentes seus encontros com o ex-presidente para tratar do esquema e, até
agora, Lula não cogitou de se submeter ao desgaste, maior, de cercear a
liberdade de imprensa.
Importante
ainda destacar que, antes de publicar a matéria, Isto É quis ouvir o
governador, a quem dirigiu duas perguntas esclarecedoras: se ele confirmava as
relações com o réu e se o diretório partidário liderado por ele recebeu
recursos do esquema noticiado.
A juíza, uma
plantonista, acatou argumento de que as informações não deveriam ser
divulgadas, pois fornecidas em “segredo de justiça”, decisão contrária ao que
já fora firmado pelo próprio Supremo Tribunal Federal: segredo de justiça não
alcança a imprensa.
A reação de
Cid Gomes lhe trouxe quatro problemas que ele não tinha: o primeiro é que
cercear a liberdade de expressão é uma atitude simbolicamente estigmatizada numa
sociedade que guarda péssimas lembranças de duas décadas e meia sob um regime
de terror.
É de efeito
ainda mais incerto no curso de um período eleitoral, quando os adversários
estão mobilizados para provocar desgastes. E pior: seu candidato, do PT, fundado
e dirigido por vítimas da ditadura militar, herda um legado de tolerância que
deve ser observado.
Em segundo
lugar, Cid apenas conseguiu jogar ainda mais luzes sobre uma denúncia que
poderia relativizar, por exemplo, emitindo uma nota que descredenciasse o
apreço à verdade de seu acusador a partir de sua própria condição moralmente
desfavorável: é réu!
Três: Ao
tentar calar a denúncia de modo autoritário, incorreu na tola ilusão de que com
isso encerraria o caso, quando, de fato, deu a ele um potencial de
multiplicação ainda maior, argumento facilmente comprovado pela própria
existência deste artigo que escrevo.
Por fim,
colocou-se na prontidão rígida do pânico, mais próprio a quem teme ver
reveladas verdades inconvenientes do que àqueles que, inocentes de fato,
costumam reagir com a maior serenidade de quem se sente seguro de suas
salvaguardas de defesa.
Cid Gomes
iniciou seu mandato com um escândalo de ampla divulgação na imprensa nacional:
o voo de férias em jato particular ao lado da sogra, entre outros. E vai
terminar com outra notícia desabonadora na grande mídia: como um ditadorzinho
do semiárido.
(*) Jornalista e
escritor. Publicado In: Pauta Livre.
Pauta Livre
é cão
sem dono. Se gostou, passe adiante.
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