terça-feira, 25 de abril de 2017

SABER COMER


Pedro Henrique Saraiva Leão (*)
Os americanos dizem, e minha mãe repetia: “an apple a day keeps the doctor away”: uma maçã por dia mantém o médico a distância. No artigo anterior, abordamos alguns aspectos da ciência da alimentação, complexo ramo da biomedicina já com foros de cátedra. Impôs-nos, contudo, nosso espaço a restrição de itens relevantes comentados abaixo. Tratados antigos valorizam sobremaneira os “frutos da terra”, entre eles hortaliças e verduras: alface, espinafre, couve, salsa, couve-flor, brócolis, aspargo, palmito, repolho, agrião; item favas, ervilhas, grãos, lentilhas, feijões, arroz. Seu consumo é exaltado por vegetarianos, herbívoros, veganos, ou fitófagos (do grego “phyton” = planta). Cientificamente sobra-lhes razão.
Na Faculdade de Medicina da UFC, nossos alunos estranhavam quando aconselhávamos “comer mato”, i. e., vegetais (25g/dia), pelo seu alto teor em fibras. Estas são imprescindíveis à saúde, segundo constatado por Burkitt, ao estudar africanos primitivos. Aliados a carnes brancas (peixes, aves), constituem a chamada “dieta mediterrânea” (ou “pitagórica”!), há muito praticada. Achados paleontológicos (do homem pré-histórico: do grego “palaiós”= antigo) encontraram restos de 55 tipos de plantas comestíveis, em Israel, 780 mil atrás (“Folha de S. Paulo”, 21/1/2017). A falta delas predispõe ao câncer colo-retal, à diverticulite, ao AVC (fineza ler nosso artigo aqui, de 14/XII/1991).
As vitaminas quedaram ignoradas até 1912, quando o químico polonês Casimir Funk, estudando o farelo do arroz, detectou um nutriente não mineral, ao qual denominou “tiamina”, inaugurando o conceito de “vitaminas”, esta sendo a primeira (B1). Sabe-se serem as mesmas componentes normais dos alimentos, até encontradas ali em quantidades adequadas. Não obstante, em 2002, o respeitável “Journal of the American Medical Association” afirmou que a alimentação apenas não consegue prover a maioria das vitaminas nas concentrações recomendadas. Entre as ditas “essenciais”, situam-se a vitamina C (1932) (2g/dia), os 12 tipos do reconhecido Complexo B, além das referidas como A, D, E. Consumidas – hoje obsessivamente – com determinados minerais rotulados nutritivos (cálcio, magnésio, potássio, Zn, iodo, sódio, ferro, selênio) agem como suplementos dietéticos.
Destarte forneceriam nutrição sem comida e bem-estar sem remédio. Tais produtos, também em tabletes ou barras energéticas, foram batizados em 1989 como “nutricêuticos” pelo dr. Stephen De Felice. Atualmente (dados de 2011) os americanos gastam U$ 28 bilhões/ano em vitaminas, juntamente com ômega-3 (dos peixes), pro-bióticos (bactérias salutares) e antioxidantes, principalmente para glória da indústria farmacêutica. Curiosamente, em 1956, nosso patrício A. da Silva Melo assegurava já estar perto o dia quando o culto exagerado de vitaminas se transformaria na “mais ridícula e grosseira das pantomimas”. Há algum tempo lemos que um certo sr. John Cloud (nos EUA), após exames rotineiros de sangue, submeteu-se a um regime nutricêutico. Por cinco meses, ingeriu 3.000 desses produtos mistos (22 pílulas/dia).
Os resultados registrados foram irrelevantes, tendo ocorrido apenas aumento da vitamina D, e do HDL, o colesterol “bom”. Curiosamente, a profecia do cientista brasileiro acima mencionada ratificaria a conclusão a que chegara, em 1940, o dr. Ernst Boas, famoso cardiologista da Universidade de Columbia: o negócio das vitaminas é “a mais execrável fraude já perpetrada contra o povo” (“The damnedest racket ever perpetrated upon the people”). E agora, José? É óbvio concluir que o mais importante é se alimentar corretamente, sabendo o que comer.
(*) Professor Emérito da UFC. Titular das Academias Cearense de Letras, de Medicina e de Médicos Escritores.
Fonte: O Povo, 22/03/2017. Opinião, p.14.

Um comentário:

Paulo Gurgel disse...

An apple a day keeps the doctor away. But if the doctor is cute forget the fruit.

 

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