Remenda o pano que ainda dura um ano
Hollywood Júnior se dizia
tão desassombrado que pedi a Deus ocasião de prová-lo. E assim meio que sem
querer ficamos sabendo que o caba não era aquilo tudo. Afinal, com morte não se
brinca. O colega se pabulava tanto de não temer a morte que cheguei a
invejá-lo. Dizia a quem interessar pudesse:
- Morrer? Tenho medo é da
vida! Alma? Dou é cotoco, ainda mijo nos pés dela!
Estávamos na casa dele
para um almoço quando, enfim, tivemos a constatação de que tudo não passava de
conversa mole. Terminando de aprontar o feijão, a mulher Girle (Girle vem de
“girl”, moça em inglês) deu um toque fraterno:
- Holly, meu bem, o feijão
tá uma delícia, mas muito gorduroso. Vê se não exagera...
- Como é que? Tá me
desconhecendo, criatura?
- Amor, é teu
colesterol...
- E eu sou lá homem de
negar uma cuia de feijão com toicim e farinha!!! Tá doida!?!
- Mas amor, entenda...
Eu devia comer um quilo
de gordura por dia!!! já disse e repito: tenho medo de morrer não!!!
- Largue de onda e me
traga o feijão aqui! Capriche no tutano, bacon, linguiça...
- É que o médico
recomendou que, pra tu viver mais 40 anos...
- ... eu devia comer um
quilo de gordura por dia!!! Já disse e repito: tenho medo de morrer não!!!
Até há pouco meticulosa
nas palavras, Girle desce então do salto e manda ver, olhando pro alto e
falando sério, pedindo com máximo fervor:
- Deus, meu Deus, ‘são’
meio dia e doze minutos... E eu te peço: leva esse fulerage agora!!!
- O que, Girle?
- Quero que tu morra
nextante, infeliz das costa oca!
Visivelmente destreinado
com o pedido da mulher ao Pai Celestial, Hollywood Júnior sente a força
daquelas palavras. E a mulher insiste:
- Deus meu Deus! Leva essa
pustema daqui! Morre, Holly! Por que é que tu não bate a caçuleta, macho?
Temeroso do peso daquelas
palavras, disparadas com a fé removedora de montanhas, o homem dá pra trás e
descobrimos tudo...
- Girle, eu até que
gostaria de morrer agora. Ocorre que eu preciso dar um pulinho na casa de mãe,
pegar o carnê dela do INPS e pagar duas letra vencidas...
Sui generis, altamente mental
De tudo já vi nessa vida,
em matéria de doidice. O Etelvino, por exemplo, pediu que a mulher lhe botasse
chifre só pra voltar a beber cinzano. O João Mondrongo passou 34 dias sem comer
com o objetivo único criar teia de aranha no caneco. Besourão é crente que o
Ferrim é o melhor time do mundo. Zilá Mêi Pão inventou de pedir demissão do
emprego no sentido de experimentar um mês devendo na bodega do seu Valmir
Carrapateira.
Mas essa do Crocodilo,
confesso, nunca tinha “ouvisto falar”: roubou 200 reais dele mesmo e foi dar
parte da polícia. Lá chegando, teceu comentários sobre as características da
personalidade desequilibrada do ladrão, que o sujeito era “perigoso elemento”,
que queria que o larápio apodrecesse no xilindró”. E se pegasse ele no meio da
rua, dava-lhe uma mão de peia tão grande que nem a alma escapava. Que fez, por
fim? Traçou o retrato falado do marginal.
Resultado: está preso há
um mês. Pior: não quer advogado...
Fonte: O POVO, de 29/6/2018.
Coluna “Aos Vivos”, de Tarcísio Matos. p.2.
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