Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
Submetidos à mesma pesquisa sobre o
aumento da violência entre os jovens, os norte-americanos apontaram a
instabilidade familiar como a maior explicação para a criminalidade entre
crianças e adolescentes, enquanto os recifenses consideram a pobreza como a
principal causa do problema.
Tudo na vida é uma questão de ponto de vista. Veja que os resultados das
pesquisas de opinião pública diferem de uma região para outra do mesmo país e
ainda mais entre países diferentes.
Acautelo quanto às consequências da divulgação dessas pesquisas
apressadas que nos empurram pela goela abaixo como cientificamente verdadeiras.
Assistimos ao endeusamento da Biologia, genomas, como se fosse a época da
astrologia e os genes fossem como astros celestes que determinariam nossa vida
e nossos gostos e crenças.
O resultado dessas crenças passa pelas curas e milagres televisivos,
explodem nos movimentos fundamentalistas, culminando na vasta literatura de autoajuda
e no aparecimento de novos sofrimentos mentais. Acabaram-se as infecções; o que
agora está na moda é a depressão.
Alguém já andou dizendo por aí que existem três tipos de mentira: as
mentiras, as mentiras estatísticas e as mentiras deslavadas. A estatística é a
maior ciência inexata, dizem.
Submetidos à mesma pesquisa sobre o aumento da violência entre os jovens,
os norte-americanos apontaram a instabilidade familiar como a maior explicação
para a criminalidade entre crianças e adolescentes, enquanto os recifenses
consideram a pobreza como a principal causa do problema.
Os norte-americanos revelaram uma postura muito mais repressora ao
apontarem como a principal solução para a redução da violência a aplicação com
mais rigor do Código Penal entre os jovens infratores. Os recifenses preferiram
colocar a solução nas mãos do governo, sugerindo aumentar as dotações oficiais
destinadas à melhoria das condições de educação, oportunidades, recreação e
esportes para os adolescentes.
Considerando a mesma amostragem de 886 recifenses entrevistados
constatou-se que 38,94% deles apontavam a pobreza como a principal causa da
violência (o maior percentual). Mais de 72 % dos norte-americanos
apontaram como a principal causa a “a falta de supervisão e os maus-tratos dos
pais”.
Confirmou-se a predominância nos
países do Terceiro Mundo, como o Brasil, de um discurso há muito superado em
países do Primeiro Mundo, como os Estados Unidos, relacionando a pobreza à
violência. As forças políticas e sociais brasileiras, formadoras da opinião
pública, também estão com um discurso ultrapassado.
Quando interrogados sobre as soluções, os recifenses tiveram opiniões
mais parecidas, independentemente de classe social. Sugeriram o aumento das
verbas para políticas sociais como forma de frear a violência entre os jovens.
Pelo menos 79% dos norte-americanos (californianos) entrevistados
consideraram a aplicação com mais rigor do Código Penal como a melhor solução.
Confirmou-se a predominância nos países do Terceiro Mundo, como o Brasil,
de um discurso há muito superado em países do Primeiro Mundo, como os Estados
Unidos, relacionando a pobreza à violência. As forças políticas e sociais
brasileiras, formadoras da opinião pública, também estão com um discurso
ultrapassado.
Se a má distribuição da riqueza fosse a principal causa da violência,
nos países ricos e desenvolvidos do Primeiro Mundo não haveria índices tão
altos de criminalidade. Esse discurso também predominava nos Estados Unidos
antes dos anos 60. A partir da década de 60, com a pressão e os movimentos
sociais em defesa das minorias, os norte-americanos começaram a rever suas
posições.
A violência entre os jovens é um problema psicossocial (que concerne
simultaneamente à psicologia individual e à vida social) ou, dito de outra
forma, a Psicologia Social é o ramo da psicologia que estuda como as pessoas
pensam, influenciam e se relacionam umas com as outras. Surgiu no século XX
como área de atuação que visa estabelecer uma ponte entre a psicologia e as
ciências sociais (sociologia, antropologia, geografia, história, ciência
política).
Sua formação acompanhou os movimentos ideológicos e os conflitos do seu
tempo: as grandes guerras, a ascensão do nazifascismo, a luta do capitalismo
contra o socialismo, levando também a uma reavaliação das relações familiares,
criando mecanismos para sua proteção e integridade. A deficiência ou ausência
de tais mecanismos são julgadas hoje como a principal causa do aumento da
violência entre os jovens.
(*) Professor Titular da Pediatria
da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União
Brasileira de Escritores (UBE), da Academia Brasileira de Escritores Médicos
(ABRAMES) e da
Academia Recifense de Letras. Consultante Honorário da Universidade de Oxford
(Grã-Bretanha).
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