terça-feira, 14 de outubro de 2025

Emendas parlamentares versus políticas públicas

Por Sofia Lerche Vieira (*)

Questionamentos diversos pesam sobre as Emendas Parlamentares. Recentemente, o Ministro Flávio Dino determinou que a Polícia Federal investigasse R$ 694 milhões em irregularidades (Folha de São Paulo, 25 ago. 2025), relativas a 964 emendas sem plano de trabalho cadastrado identificadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). A notícia de que o governo federal reservou R$40,8 bi no Orçamento de 2026 para tal finalidade, por sua vez, inspira preocupações (Folha de São Paulo, 29 ago. 2025).

O impacto negativo desse instrumento que aumentou o poder do Legislativo sobre o Orçamento público ainda está por ser avaliado. Criadas em março de 2015 (Emenda Constitucional 86/2015), inauguraram um novo período na política brasileira. Desde então, o Legislativo passou a exercer controle sem precedentes sobre o Orçamento público do país. Na prática, o uso deste mecanismo ao longo da última década tem se configurado pela ausência de critérios técnicos, falta de transparência, clientelismo e corrupção.

Os desvios motivados pelas Emendas Parlamentares têm efeitos sobre o financiamento das políticas públicas. A alocação de recursos ao sabor de interesses pessoais compromete programas governamentais prioritários, e a sustentabilidade do Orçamento. O caso da educação é emblemático a esse respeito. Um exemplo é o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), uma das mais antigas e consolidadas ações do governo federal no suporte à qualidade dos sistemas de ensino. As expectativas são de que em 2026 o financiamento seja insuficiente para assegurar tal política, obrigando o governo federal a fazer escolhas entre áreas do conhecimento, níveis de ensino e modalidades.

Longe de atingir apenas a educação, as Emendas Parlamentares têm sequestrado recursos que por princípio deveriam ser direcionados a políticas públicas prioritárias. De tal maneira, sobrepõem interesses individuais a coletivos e desviam fatias do Orçamento de ações voltadas para assegurar direitos da população. Este é um debate urgente e necessário. Requer a participação do Estado, da sociedade civil e de suas instituições.

(*) Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Uece e consultora da FGV-RJ.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 8/09/25. Opinião. p.18.

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