Por Carmelo Leão
(*)
Após 30 anos da Constituição Federal de 1988, os poderes
Executivo e Legislativo não conseguiram efetivar o direito à saúde previsto no
texto constitucional. A população convive com hospitais superlotados, filas
para exames, consultas com especialistas e falta de insumos básicos nas
unidades de saúde. Nessa situação, outro poder entrou em cena, e cada vez mais,
o acesso à saúde é definido através da imposição do Judiciário. Entretanto, a
imposição judicial é de natureza individual e não influi nas políticas públicas
de saúde, podendo até prejudicá-las, já que o orçamento é limitado e os recursos
para atender determinada decisão poderá faltar para uma outra atividade que já
havia sido planejada e orçada.
Mas o que um juiz pode fazer diante do caso concreto? Um
paciente diante da autoridade judicial com um laudo, atestando a necessidade de
realizar determinado procedimento médico gera a necessidade de uma decisão. E o
juiz, amparado pela Constituição Federal e pelo laudo do médico que indicou o
procedimento, defere a maioria dos pedidos. Na verdade, instâncias sociais
anteriores falharam e deixaram para o juiz a responsabilidade de decidir sobre
uma questão fundamental, que é o acesso à saúde. Nesse cenário, houve uma
explosão de decisões judiciais favoráveis aos requerentes e os gastos só do
Ministério da Saúde com judicialização aumentaram 1.000% de 2010 para 2016.
A tendência infelizmente é de piora, já que a mudança
demográfica em curso no Brasil pressionará ainda mais os gastos com saúde. O
déficit fiscal do País é enorme e os recursos para saúde não deverão aumentar,
sem falar na corrupção e má gestão. A solução a curto prazo passa por uma maior
aproximação entre o poder judiciário e as entidades médicas e sociedades de
especialidades para que as decisões dos juízes tenham amparo nas melhores
evidências científicas. A solução definitiva passa por uma reorganização do
sistema de saúde com um novo modelo de financiamento e uma reforma no SUS para
que ele possa suprir a maioria das necessidades de saúde da população.
(*) Presidente da Associação Médica Cearense – AMC
Fonte: Publicado In: O Povo, de 1/06/2018. Opinião.
p.20.
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