Por João Macêdo Coelho Filho (*)
A ocorrência de maior concentração de
casos graves e óbitos por Covid-19 em longevos decorre de fatores biológicos,
mas também da forma como o idoso e seus problemas são vistos e cuidados pela
ciência e pela sociedade.
A maior parte dos idosos apresenta pelo
menos uma doença crônica e/ou fragilidade, condições que limitam a reação do
organismo frente à doença. Envelhecimento e fragilidade caracterizam-se pelo
excesso de substâncias inflamatórias. A inflamação exacerbada é exatamente uma
das características da evolução grave de Covid-19. Assim, para se reduzir
efetivamente o impacto dessa doença em idosos, além da atenuação do processo
inflamatório, seria também necessário intervir nos mecanismos biomoleculares
específicos da fragilidade e do envelhecimento. Lamentavelmente, existem muitas
lacunas no conhecimento dessas condições.
Uma rede de saúde com diferentes níveis
de cuidados é especialmente importante para a atenção aos idosos. A maioria
desse grupo etário, por não contar com serviços intermediários entre o hospital
e sua residência, como hospital-dia e serviços domiciliários, acaba tendo as
UPAs e os hospitais como pontos principais de contato com o sistema de saúde.
Em consequência, temos a sobrecarga dessas unidades e o aumento do risco de
contaminação pelo coronavírus.
Outra preocupação diz respeito aos mais
de 1.000 idosos que no Ceará moram em Instituições de Longa Permanência
(ILPIs). Há escasso investimento do poder público nesse setor, predominando as
ILPIs filantrópicas. Possuem, em geral, estrutura física limitada, favorecendo
o contato próximo entre os residentes, muitos frágeis e portadores de múltiplas
doenças. Como as ILPIs são equipamentos da área social, não dispõem
habitualmente de profissionais de saúde. Portanto, reúnem, infelizmente, todas
as condições favoráveis à transmissão rápida e massiva do coronavírus, com
risco de mortalidade em larga escala, caso medidas não sejam prontamente
implementadas.
Precisaremos de muitas pesquisas sobre o
Sars-CoV-2. Idosos são classicamente excluídos dos ensaios clínicos, por
variadas razões. No caso da Covid-19, deixá-los fora das investigações seria
especialmente problemático. Estaríamos, desse modo, deixando de conhecer o que
ocorre com a doença e seus tratamentos naqueles que são exatamente os mais
penalizados por essa pandemia.
(*) Médico geriatra e diretor da Faculdade de Medicina da UFC.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 15/04/2020. Opinião.
p.15.
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