Por Odorico Monteiro (*)
No último artigo que escrevi neste
espaço encerrei com a reflexão do virologista Richard Krause de que "as
epidemias são tão certas quanto a morte e os impostos", um alerta que se
impõe ao processo civilizatório. Já estamos vivendo a segunda pandemia do
século XXI. Esse cenário exige planejamento das nações que terão como certo o
enfrentamento das epidemias.
O novo coronavírus prova que a adoção de
medidas planejadas e imediatas colocam o tempo a favor dos governos e da
ciência, na busca de saídas para desacelerar o contágio e evitar a capacidade
que a doença tem de matar, o que em epidemiologia chamamos de letalidade.
Os sistemas de saúde precisam
identificar as fontes de contaminação e agir para contê-las, ao mesmo tempo
garantir a assistência e conduta adequadas para evitar os óbitos e a
contaminação da população bem como dos profissionais de saúde. No caso do
coronavírus, a Organização Mundial da Saúde (OMS) orienta o isolamento social e
a testagem de todos os que apresentem sintomas da doença, evitando a
subnotificação dos casos, protocolo não seguido pelo Ministério da Saúde.
No Brasil, a pandemia vem somar-se a um
cenário caótico de outras epidemias como: dengue, zika, chikungunya,
influenzas, violência, inclusive no trânsito, e o envelhecimento da população.
Isso demanda um maior desafio para a União que, na contramão de uma gestão
cuidadosa, adota uma postura tosca e inconsequente a partir do próprio
presidente da República. Uma desorganização e comando confusos que podem custar
muitas vidas.
O Sistema Único de Saúde (SUS) responde
pela linha de frente desta batalha com R$ 22,5 bilhões a menos, retirados pela
Emenda Constitucional 95. O desmonte congela recursos da saúde por vinte anos e
foi reforçado pela não-aplicação do Decreto 7.508/11, que organiza a gestão do
Sistema entre os entes da Federação. Para agravar a situação, o fim do Programa
Mais Médicos deixou oito mil equipes de Saúde da Família sem médicos.
O Ceará historicamente dá exemplo de
como agir em cenários de crise. Acompanhei o início da epidemia de aids, quando
interno de Medicina no Hospital São José, onde testemunhei os primeiros óbitos,
bem como as primeiras conquistas da ciência. Pacientes soropositivos em 1988
tiveram suas vidas salvas.
Como secretário de Saúde de Quixadá, em
1993, enfrentamos a epidemia de cólera e ainda assim conseguimos implementar a
Estratégia Saúde da Família, contribuindo para uma baixa letalidade no Estado.
Em 2008, quando secretário de Saúde de Fortaleza, combatemos uma epidemia de
dengue, registrando a menor letalidade do Brasil.
O governador Camilo Santana vem
transmitindo a credibilidade necessária para comandar essa pandemia, adotando
medidas de assistência e de controle da contaminação comunitária do vírus. Sua
capacidade de contornar situações difíceis, como a da segurança pública, o
respaldam para mitigar o caos gerado pela falta de coordenação nacional.
Ações enérgicas, coerentes, incisivas e
articuladas inspiram na sociedade um sentimento de confiança. Um comando único
contribui para que as orientações sejam seguidas e o contágio do novo
coronavírus controlado. Um governo não tem o direito de apostar no incerto.
Essa é a diferença essencial na gestão da vida e da morte.
(*) Médico, pesquisador da Fiocruz, professor da UFC e
vice-presidente do PSB-Ceará
Fonte: Publicado In: O Povo, de 26/3/2020. Opinião. p.14.
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