Tirando sabugo da boca de
jumento
Sabe
o que é isso, o estado modorrento do homem socialmente lascado, com
interferências diretas e robustas no tecido sutil do espírito? LISEIRA pra mais
de metro, dessas que pegam pelo telefone, chegando ao ponto de subtrair a
“espiga de milho sem os grãos” da boca de um irmão nosso da família dos
equídeos. É assim o estado de ânimo frequente de Joãozinho de Marilaque,
sujeito articulado, simpático, bem-intencionado, mas muito sem noção e devedor
de quase todo o bairro. Quase.
A
Zé de Lima ele ainda não pediu dinheiro emprestado. Então vamos à casa do
futuro “agiota amigo”. A indicação para ir pessoalmente lá foi de um compadre
de Joãozinho, aparentado do tal “Zé cheio da pila”, que deu um toque,
antecipadamente, preparando terreno: “Receba esse póbi cristão, gente fina, não
ofende um pinto. Só é liso”. Frente a frente com o ricaço, de poucas palavras,
mas alargado entendimento acerca da alma humana padecente de recursos...
-
É seu Zé de Lima, caba bom de quem ouvi falar maravilhas?
-
Diga!
-
Me deram seu contato, aqui estou.
-
Diiiiga!
-
Foi um familiar seu, cumpade meu, que contou da alma boa do colega abonado.
-
Diiiiiiiiga!
-
Curto e grosso: preciso de 1.000 reais emprestados! Rola?
Zé
de Lima, sabedor de quem se tratava e realmente compadecido e querendo ajudar
de alguma maneira, contrapropôs:
-
Vou lhe dar 200!
A
resposta de Joãozinho de Marilaque, muito sem noção:
-
Não, meu amigo! Posso perder 800 não!
Se prestar, serve!
Gutemberg
é “corretor particular de imóveis”. O escritório, um celular potente. Focado,
mas ainda analógico, pediu a um sobrinho bom de tecnologia dicas de como se dar
bem na modernidade, e assim facilitar-lhe os negócios. O menino, um danado.
-
Tio, o lance é IA – Inteligência Artificial!
-
Diabedez?
-
Um campo de estudo multidisciplinar super abrangente!
-
Vai me servir na venda de casas e apartamentos?
-
Serve pra tudo que é área do conhecimento! Quer ela pra ajudar nas suas vendas?
-
Se quero!?! Até um burro eu quero, se for inteligente!
Pelamô!
João
Gago terminantemente proibido pelo médico de tocar em álcool, por um ano,
lascado do fígado. Mas acabou cedendo ao convite insistente do padre Bira, que,
por fina força pediu a companhia dele pra tomarem umas bicadas no Bar do Ganso,
antes da missa das 19 horas. Para tanto, liberou João após 12 Pai Nossos e 12
Ave Marias rezados. Passava das 18h30 e o religioso já bem “bonitinho”, contando
piada, olhou pro relógio de algibeira e pediu mais uma rodada.
Com
o figueiredo pedindo penico, sem, no entanto, querer constranger o santo
sacerdote, o jeito foi Joãozinho telefonar pra mulher à busca de providência.
-
Socorro, venha me buscar ligeiro pra gente ir à missa, antes que padre Bira me
convide prum forró!
Fonte: O POVO, de 12/01/2024. Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.
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