quarta-feira, 8 de dezembro de 2021

BOLSONARO PROMOVE A DESTRUIÇÃO DO ENEM

Por Tales de Sá Cavalcante (*)

Você, leitor — independentemente de sua ideologia política —, defenderia que uma prova escolar deva ter a "cara" de um governo, qualquer que seja ele? Penso que um bolsonarista fanático responderia com um sorrisinho supostamente maroto: "Sim, desde que esse governo seja do mito". Aqueles que até hoje apoiaram o presidente Bolsonaro, mas avaliam seriamente a possibilidade de debandarem para a candidatura do ex-juiz Sergio Moro, diriam: "Não deve ter a cara do governo, mas é preciso tomar cuidados com perguntas que abordam a 'ideologia de gênero'".

Agora, pessoas minimamente instruídas afirmariam que os especialistas do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) devem ter autonomia para produzir as provas do Enem, como fazem desde a década de 1990, com bastante sucesso.

Pois, até onde se sabe, até hoje nenhum estudante virou jacaré, não "nasceu barba" em qualquer aluna e tampouco algum jovem começou a "falar fino" por fazer o exame. Bolsonaro disse esses absurdos em relação a quem tomasse a vacina da Pfizer, mas ele tem mesmo temor em relação ao Enem.

Quando o presidente disse que o exame estava "começando a ficar com a cara do governo", o sinal é de que a prova seria "conservadora", sem questões relacionados à sexualidade, que — em sua visão distorcida — teriam poder de desencaminhar os estudantes dos "bons costumes" (que, aliás, falta a Bolsonaro, em vista das piadas concupiscentes que vive a fazer, inclusive com a própria mulher, mãe da filha dele). O ministro da Educação nega que tenha havido interferência nas provas, mas quem acredita em áulicos?

Se o presidente fosse menos obsessivo com a orientação sexual alheia e mais preocupado com a educação, certamente o Enem não chegaria na encruzilhada a que chegou, a ponto de deixar em risco a continuidade da prova. O pedido de afastamento de mais de 30 profissionais do Inep às vésperas do exame é o atestado definitivo da falência do Ministério da Educação na era Bolsonaro.

No próximo domingo, quatro milhões de estudantes farão a prova do Enem, menos da metade dos que concorreram em 2016, por exemplo. Assim segue célere o único projeto de sucesso no governo Bolsonaro: a política de terra arrasada.

(*) Reitor do FB UNI e Dir. Superintendente da Org. Educ. Farias Brito. Membro da Academia Cearense de Letras.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 18/11/21. Opinião, p.14.

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