Por Roberto da Justa Pires Neto (*)
Precisamos
falar sobre tuberculose, doença invisibilizada e que tem aumentado em número de
casos e óbitos no Ceará.
Doença
milenar, foi um flagelo em todos os continentes até o início do século XX. Era
chamada de Peste Branca, para diferenciar de outra pandemia, a Peste
Negra (peste bubônica).
Com o advento
de vacinas e medicamentos, a doença pode ser controlada e curada em
mais de 95% dos casos. Nos países desenvolvidos está controlada.
A doença é
umas das 10 principais causas de morte no mundo. A maioria dos casos hoje está
concentrada em 30 países, quase todos subdesenvolvidos e/ou detentores de extrema desigualdade social e econômica, o Brasil
sendo um destes.
No Ceará, são
mais de 3.600 casos e mais de 200 óbitos por ano, a maioria em Fortaleza. Diagnóstico tardio, baixa taxa de cura (50%) e serviços de saúde desestruturados e com
pouca capacidade de acompanhamento dos pacientes são reveladores do cenário
epidemiológico em nosso estado. Muitos pacientes são abandonados pelos serviços
de saúde e acabam interrompendo o tratamento, que está disponível gratuitamente
no SUS.
A tuberculose
é doença denunciadora das desigualdades em nossa sociedade. Pobreza, más condições
de moradia, fome, desnutrição são determinantes da doença. Homens pobres,
pretos/pardos são os mais acometidos. Estigma, preconceito, racismo arrastam
muitos para a condição de rua e dependência de álcool e drogas. Quase 10%
também são portadores do HIV.
A
invisibilidade dessas pessoas é revelada na escassez de leitos hospitalares, no
amontoado de doentes relegados sem dignidade aos corredores frios das emergências públicas, no abandono pelos serviços de saúde, na
ausência de uma rede social de apoio institucional e efetiva, na falta de
acolhimento e respeito.
A OMS em 2015
estabeleceu como meta a erradicação da tuberculose do mundo até 2030. Até lá,
todos os países deverão ter redução em mais de 90% dos caso e óbitos por
tuberculose. O que observamos em nosso estado é o contrário. Nos últimos anos
observamos aumento do número de casos e óbitos.
A sociedade
está cega. Não enxerga a Peste Branca. É uma cegueira branca, como a de Saramago, reveladora da incapacidade da humanidade reconhecer suas necessidades.
Quando passar, o mundo cego terá dado lugar ao mundo bárbaro.
(*)
Médico infectologista e
professor da Faculdade de Medicina da UFC.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 3/11/2023. Opinião. p.19.
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